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Festival de Berlim | Touch Me Not, da Romênia, e Wes Anderson são premiados

Wes Anderson leva o prêmio de melhor direção no encerramento do festival alemão

24.02.2018, às 16H41.
Atualizada em 27.02.2018, ÀS 17H02

Deu Romênia na cabeça no encerramento do 68º Festival de Berlim: o longa-metragem Touch Me Not, dirigido por Adina Pintilie, conquistou o Urso de Ouro de 2018, votado por um júri comandado pelo cineasta alemão Tom Tykwer. Investigação narrativa sobre corpo e desejo, misturando documentário, ficção, artes visuais e psicanálise, o filme acompanha a busca de uma mulher que não consegue ser tocada por formas de superar suas limitações sexuais e afetivas. O longa ainda conquistou o Prêmio de Melhor Filme de Estreia, dado por um júri paralelo.

Divulgação

“Tudo o que a gente quis com tantas camadas de percepção foi abrir diálogos sobre o corpo, sobre a condição humana”, disse Pintilie, cuja vitória foi inesperada, dada toda a torcida generalizada por Gus Van Sant (e seu Don’t Worry, He Won’t Get Far On Foot) e Erik Poppe (U-July 22).

Num ano onde muito se reclamou sobre a baixa potência estética dos filmes em concurso, pouco afeitos ao desenho de renovar as cartilhas narrativas de gênero, o Grande Prêmio do Júri (uma estatueta em formato de urso, toda prateada) ficou com Mug, de Malgorzata Szumowska (Polônia), que mostra a construção de uma estátua de Cristo Redentor numa cidadezinha pobre onde um dos operários da construção dessa estátua fica deformado na obra. “Estou muito feliz por ser uma mulher diretora premiada”, disse Szumowska.

Já a estatueta de melhor direção ficou com o americano Wes Anderson pela animação Ilha de Cachorros, que abriu o evento, no dia 15, retratando um Japão distópico. “Jamais imaginei que um dia trabalharia como ator e voltaria para casa com um Urso”, disse Bill Murray, um dos dubladores do filme, que recebeu o prêmio em nome de Anderson, ausente da festa.

Foi surpresa (boa) a escolha do melhor ator: apostava-se pesado em Joaquin Phoenix (por Don’t Worry, he Won’t Get Far On Foot), mas ganhou Anthony Bajon, pelo drama truffautiano La Prière, filmado pelo astro francês Cédric Kahn, com foco na discussão sobre um grupo jovem católico.

Na seleção do prêmio de Melhor Documentário, o vencedor foi The Waldheim Waltz, de Ruth Beckermann, da Áustria. Mas, nessa categoria dedicada ao Real, Luiz Bolognesi conquistou uma menção honrosa por Ex-Pajé, um retrato da etnocídio indígena na Amazônia. “Quando se destrói um pajé, desmancha-se o epicentro de uma cultura indígena, pois eles são os doutores da Sorbonne da floresta. Há uma ancestralidade de 4 mil anos à prova, ameaçada de destruição”, disse Bolognesi.

Coproduzido pela carioca Julia Murat, Las Herederas, drama paraguaio sobre um casal sexagenário de lésbicas do estreante Marcelo Martinessi, conquistou o prêmio de melhor atriz (para Ana Brun) e ainda o Troféu Alfred Bauer. Este troféu é concedido a filmes que apontam novos caminhos para a linguagem audiovisual, pelas vias da experimentação. Sua trama fala sobre uma moradora de Asunción (Brun) que se reinventa após a prisão de sua companheira. Ele ainda ficou com o Prêmio da Crítica, dado pela Federação Internacional de Imprensa Cinematográfica (Fipresci). “Marcelo tem uma delicadeza no olhar que me impressiona”, disse Julia Murat ao Omelete. “Ele se atém aos pequenos detalhes e tem a capacidade de fazer uma crítica política a partir de uma história pessoal”.

Roteiro mais inusitado deste Festival de Berlim, Museo, concorrente mexicano, foi premiado pela potência de sua dramaturgia. O filme estrelado por Gael García Bernal recria um roubo de obras de arte ameríndias em 1985.

Louvado pela crítica europeia desde sua primeira exibição por terras alemãs, no dia 17, a dramédia Dovlatov, do diretor Alexey German Jr., rendeu à diretora de arte Elena Okopnaya o Prêmio de Contribuição Artística, contemplando cenários e figurinos. O longa ganhou também a láurea do Júri de Leitores do Berliner Morgenpost. Numa fronteira tênue entre a desilusão e a ironia, o filme é centrado no panorama político e literário da União Soviética dos anos 1970, a partir da obra do escritor Sergei Dovlátov (1941-1990), autor de Parque Cultural (1983) e A Mala (1986). “Existe uma URSS folclórica que confunde o entendimento histórico do que aquela nação comunista foi”, disse German Jr.

Entre os curtas-metragens, o prêmio principal ficou com The Man Behind The Wall, de Ines Moldavsky, de Israel. O Urso de Prata simbolizando o Prêmio do Júri de curtas ficou com o africano Imfura, de Samuel Ishimwe, sobre a realidade de Ruanda. A animação dinamarquesa Solar Walk, de Reka Bucsi, levou o Prêmio Audi de Curtas.

Além da menção honrosa a Ex-Pajé, não faltaram prêmios para o Brasil, que somava 12 produções com cineastas nacionais em diferentes seleções da Berlinale. A consagração nacional começou na sexta, pelo Troféu Teddy, engajada láurea LGBTQ que consagrou o documentário Bixa Travesti, de Claudia Priscilla e Kiko Goifman (feito a partir de performances da cantora trans Linn da Quebrada) e a ficção gaúcha Tinta Bruta, de Filipe Matzembacher e Marcio Reolon. Este último conquistou ainda o Prêmio CICAE, dado pela associação europeia de cineclubes para esta introspectiva aventura afetiva de um performer de chats da internet chamado Rapaz Neon. Já o diretor cearense Karim Aïnouz incluiu em sua estante de láureas o Prêmio da Anistia Internacional pelo documentário Aeroporto Central (Zentralflughafen THF), sobre refugiados. “Berlim tem algo em comum com o Brasil e toda a América Latina: por ser uma cidade em eterna reconstrução, desde a II Guerra, este lugar está sempre buscando sua identidade... como a gente”, diz Ainouz.

Registro dos julgamentos e conspirações do Congresso Nacional que resultaram no Impeachment de Dilma Rousseff, O Processo, de Maria Augusta Ramos, ficou em terceiro lugar no disputado pódio da votação de júri popular da mostra Panorama. O primeiro lugar ficou com o thriller Profile, de Timur Bekmambetov (do hit Procurado), sobre uma jornalista que inventa um perfil falso nas redes sociais a fim de investigar jihadistas.

E vale lembrar que, mesmo fora de concurso, 7 Dias em Entebbe, de José Padilha, passou feito um furacão por Berlim, consolidando-se como um polêmico retrato da guerra Israel x Palestina. Encerrada a Berlinale. 68, o cinema autoral agora aguarda notícias de Cannes, cuja 71º edição vai de 8 a 19 de maio, na França, tendo a australiana Cate Blanchett no comando do júri.

Lista de vencedores

  • Urso de Ouro: Touch Me Not, de Adina Pintilie (Romênia)
  • Grande Prêmio do Júri: Mug, de Malgorzata Szumowska (Polônia)
  • Documentário: The Waldheim Waltz, de Ruth Beckermann (Áustria); com menção honrosa para Ex-Pajé, de Luiz Bolognesi (Brasil)
  • Direção: Wes Anderson (Ilha de Cachorros)
  • Atriz: Ana Brun (Las Herederas)
  • Ator: Anthony Bajon (La Prière)
  • Roteiro: Manuel Alcalá e Alonso Ruizpalacios, por Museo (México)
  • Contribuição Artística: Elena Okopnaya, pela direção de arte e o figurino de Dovlatov (Rússia)
  • Troféu Alfred Bauer (dado a pesquisas de linguagem): Las Herederas, de Marcelo Martinessi (Paraguai)
  • Filme de Estreia: Touch Me Not, de Adina Pintilie (com menção honrosa para An Elephant Sitting Still, de Hu Bo, da China)
  • Curta-metragem: The Men Behind The Walls, de Ines Moldavsky (Israel)
  • Prêmio da Crítica: Las Herederas, de Marcelo Martinessi (Paraguai)
  • Júri Ecumênico: In The Aisles, de Thomas Stuber (com menção para U-July 22)

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