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Pantera Negra | Como o filme vai ser o manifesto definitivo por diversidade nos filmes de heróis

Passamos um dia no set do longa de Ryan Coogler em Atlanta

25.01.2018, às 10H41.
Atualizada em 06.01.2019, ÀS 12H47

Criado em julho de 1966, nas páginas da HQ Fantastic Four #52, Pantera Negra, o primeiro super-herói negro dos quadrinhos, é a matéria-prima para um projeto de US$ 120 milhões que a Marvel começou a filmar em janeiro de 2017 em Atlanta, nos EUA. As câmeras se concentram nos estúdios da Screen Gems, uma subsidiária de grandes corporações cinematográficas como a Sony, hoje a serviço da Disney. O Omelete foi convidado a visitar o set desta produção e acompanhar um dia filmagens no coração da Geórgia, para entender como funciona uma adaptação de gibis encarada como um gesto de inclusão racial. A direção é de Ryan Coogler, um cineasta californiano de 30 anos conhecido por Creed: Nascido para Lutar (2015), que trouxe para todos os cargos de gerência do longa-metragem profissionais afro-americanos.   

Sob a condução de Nate Moore, produtor-executivo da Marvel, o Omelete pôde acompanhar uma cena sendo filmada: um diálogo entre o rei africano T'Challa, o alter ego do Pantera, vivido por Chadwick Boseman, a espiã Nakia (Lupita Nyong’o) e a guerreira Okoye (Danai Gurira). Tivemos acesso a essas atrizes e ao ator ao fim do dia, que começou com uma exposição dos croquis da direção de arte. Com design espacial e de objetos concebido por Hannah Beachler, a cenografia do longa tenta reproduzir a mesma caracterização usada nos quadrinhos para o reino de Wakanda, nação africana fictícia, dona do mais sofisticado parque tecnológico da Terra, graças as riquezas advindas de um metal raro, o vibranium, que só existe lá.

Ocupando um dos sete galpões da Screen Gems (do mesmo tamanho de um estúdio de TV brasileira, com 200 m2), a produção de Pantera Negra concentrou todos os croquis de Hannah numa só sala de reuniões, espalhando pelas paredes cartazes de 30 cm x 30 cm. Cada um deles traz uma das artes de referência para cada um dos cenários principais: um cassino em Seul, uma floresta verde em Wakanda, um monte sagrado com estátuas de felinos, dois laboratórios e muitos chassis de naves e motos voadoras. 75% das filmagens se concentram nesse estúdio de Atlanta, com locações na África do Sul e na Coreia do Sul.

Tivemos ainda acesso à gerente de figurinos, Ruth E. Carter, famosa por sua ligação com projetos de discussão racial como os filmes Amistad (1997) e Selma – A Luta Pela Igualdade (2014) e a minissérie Raízes (2016). Ela explicou que o projeto todo teve como pilar o vestuário das tribos africanas do Norte do continente, sobretudo togas de guerra e batas religiosas. As máscaras tribais foram a fonte de referência para os elmos das tropas de guerra de T'Challa e para o manto do herói. Usa-se uma liga de carbono com tecido para a criação dos uniformes, de modo a garantir maior elasticidade.

Após a apresentação das equipes técnicas, houve duas horas de perguntas e respostas com o elenco. Mas antes, o produtor do longa, ao conversar informalmente conosco, levantou uma questão a ser discutida: “Por que todo negro precisa ter a cara do Denzel Washington ou da Oprah Winphrey?”.

Essa discussão foi acirrada por Nate Moore ao dizer que, na Disney, um projeto como aquele jamais poderia contar com um astro como, por exemplo, Will Smith, pois toda sua visibilidade tiraria o foco do personagem e da discussão racial a ele inerente. Era preciso um bom ator como Boseman– que vivera o Pantera em Capitão América: Guerra Civil, de 2016 – mas que não tivesse uma condição de astro. A escolha de um ator de muito prestígio, como o citado Will, desfocaria a atenção do público da essência industrial da Disney: vender a Marvel e seus heróis. Citou-se lá o caso de Robert Downey Jr. que, ao ser escolhido para viver o Homem de Ferro, andava numa fase de pouca popularidade, o que fazia dele uma escolha perfeita para encarnar o playboy Tony Stark. No caso da escolha de Mark Rufallo – um ator três vezes indicado ao Oscar - para viver Bruce Banner, o Hulk, a Disney argumentou que, os filmes pelos quais ele fora nomeado a uma estatueta em Hollywood não eram projetos comerciais e tampouco dialogavam com o público central dos filmes de heróis mascarados. Existe uma preocupação no estúdio que o personagem prevaleça para além de quem possa ser seu intérprete.

Já os astros Boseman e Nyong’o foram unânimes em apontar a importância estratégica de Pantera Negra como um ponto de venda simbólico para as comunidades negras dos EUA, que não têm heróis afro-americanos de fantasia populares o suficiente aos quais possam se referenciar. Ambos citaram Eddie Murphy e seu Um Príncipe em Nova York (1988) como um marco e lembraram de Blade, O Caçador de Vampiros (1998) como um pilar do heroísmo negro, na figura de Wesley Snipes. A série Luke Cage foi uma conquista, mas ainda muito realista. A discussão central é de que existe um contingente consumidor de milhões e milhões de clientes (espectadores) em potencial afoitos por uma dramaturgia de maior diversidade, sobretudo no terreno das tramas fantásticas. E que só um diretor e roteirista ligado intrinsecamente a esses contingentes –  Coogler – poderia resolver essa questão.

Pantera Negra estreia em 15 de fevereiro. Acompanhe o Omelete para ler as entrevistas e matérias do set que serão publicadas nas próximas semanas. 

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