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Transit | Filme alemão sobre refugiados vira sensação na Berlinale

Mais aclamado cineasta alemão dos últimos 20 anos, Christian Petzold conquista seus conterrâneos

17.02.2018, às 16H05.

Cada diálogo trocado em Transit, filme alemão aplaudido calorosamente na manhã deste sábado na Berlinale, soa como se fizesse referência à Segunda Guerra Mundial e ao jugo nazista sobre a Europa. Temos como protagonista um dissidente da política germânica, Georg (o ótimo Franz Rogowski), que deseja entrar na França antes do país ser ocupado, e, de lá, partir para o México. Em suas mãos, cai um manuscrito de um autor morto, que faz com ele seja confundido com um escritor. Porém, todos os locais por onde Georg passa não guardam referências visuais dos tempos do Holocausto: estamos na Marselha de hoje, com roupas e armas atuais, retratando refugiados do Oriente Médio como os que hoje se amontoam em grandes centros urbanos das metrópoles europeias. O objetivo do diretor – no caso, Christian Petzold, aclamado como o maior cineasta da Alemanha entre os realizadores revelados nos últimos 20 anos, graças a sucessos como Bárbara, de 2012, e Phoenix, de 2014 – é mostrar que a opressão dos tempos hitleristas, mesmo com outras motivações, não é diferente da violência sob a qual os imigrantes ilegais vivem em território berlinense.

Christian Schulz/imdb/reprodução

“A ideia aqui é misturar o manuscrito encontrado por Georg com os dois tempos históricos da trama: um encenado; o outro, retratado. E existe uma narração literária que dá ritmo à narrativa. No cinema autoral, palavra vira melodia. Basta ver as cenas de um clássico como Jules et Jim, de Truffaut, para sentir a força das palavras”, disse Petzold ao Omelete, após ser aplaudido pela ala alemã da imprensa, para a qual ele é, desde já, o favorito ao Urso de Ouro de 2018, seguido de pertinho por Las Herederas, do Paraguai.

Apesar de desacelerar o filme de um modo prejudicial ao dinamismo exigido por esse jogo entre passado e presente proposto no roteiro, Petzold ganhou a plateia pela força de seus enquadramentos, retratando cidades como Marselha, por exemplo, com um exotismo que descaracteriza a bela paisagem do local. As sequências de perseguição aos refugiados compensam a perda de ritmo das cenas de diálogo com doses fartas de adrenalina e de denúncia social. Transit se impõe na tela como uma investigação de linguagem sobre a perenidade do Mal na forma da exclusão.

“Quando eu inicio um filme, confio à minha montadora habitual, Bettina Böhler, a tarefa de me dar a linha narrativa que eu devo seguir”, disse Petzold. “Filmo com uma ideia de personagens e com algumas inquietações. Mas é Bettina quem encontra o tom, na ilha de edição”.    

Antes de Transit, a Berlinale tomou um sonífero em forma de cinema russo com o drama de pretensões cômicas Dovlatov, exibido em competição, arrancando um coro de bocejos. Dirigido por Alexei German Jr., com base em fatos reais, o filme é centrado no panorama político e literário da União Soviética dos anos 1970, a partir da obra do escritor Sergei Dovlátov (1941-1990), autor de Parque Cultural (1983) e A Mala (1986). O foco do longa são os contratempos encarados por Sergei (vivido por Milan Maric) em seus esforços para se firmar na Literatura.

“Este é um filme de recursos financeiros muito limitados para construir um período histórico de uma nação cuja realidade se conhece pouco, virando folclore pela questão socialista”, disse German Jr. 

Esta tarde, a Berlinale receberá sua atração com mais peso de blockbuster: a fábula chinesa Monster Hunt 2, que promete mobilizar toda a mídia asiática presente na cidade. Só em sua China natal, o primeiro Monster Hunt, de 2015, faturou US$ 385 milhões, jogando muita superprodução da Marvel pra escanteio. Por isso, a segunda aventura da franquia dirigida por Raman Hui, sobre o monstrinho Wuba, vai ganhar projeção de gala num dos maiores festivais de cinema do mundo, narrando os esforços da criatura para escapar de um senhor das trevas que quer sua cabeça. Mas um ex-presidiário (vivido pelo lendário ator Tony Leung, de Amor à Flor da Pele) vai ajudá-lo em sua cruzada.

À noite, a cidade promove uma projeção de gala do thriller anglo-russo Profile, dirigido por Timur Bekmambetov, realizador do Cazaquistão importado por Hollywood há dez anos para rodar Procurado (2008). Neste novo trabalho, de orçamento minúsculo se comparado a quanto gastou em solo hollywoodiano para refilmar Ben-Hur (2016), o cineasta brinca com a linguagem das redes sociais a partir dos esforços de uma repórter para devassar os bastidores de um grupo extremista religioso de sírios e paquistaneses usando um perfil falso no Facebook.

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