Dizem que brasileiro não tem memória. Geralmente, a frase é colocada em um contexto que quer demonstrar que nós não respeitamos a nossa história, não lembramos dos nossos heróis. Dentro do cinema nacional, porém, a sentença pode assumir uma conotação um pouco diferente. Sentados na sala escura, parece mesmo que o brasileiro não tem memória. Só assim para entender por que tantos filmes nacionais falam do mesmo assunto. Se não é o Nordeste, são as favelas ou então os anos de chumbo da Ditadura Militar.
É respeitando este trinômio que vem ao público Batismo de Sangue (2006), longa-metragem dirigido e produzido pelo Helvécio Ratton (Menino Maluquinho). Até faz sentido o cineasta mineiro investir no tema, afinal ele participou da luta armada contra a ditadura e teve que se refugiar no Chile durante a década de 1970. Mas depois de ver tão recentemente 1972, O ano em que meus pais saíram de férias e Zuzu Angel fica a pergunta: não está na hora de dar um tempo?
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A história começa em São Paulo, no fim da década de 1960. O seu diferencial é que os protagonistas são um grupo de frades dominicanos que resolve ajudar na luta clandestina contra a ditadura militar que caçava e calava insatisfeitos por meio de emprisionamentos, torturas e até morte. Impulsionados pelos ideais cristãos que defendem uma igualdade entre as pessoas, eles acabaram apoiando o grupo guerrilheiro Aliança Libertadora Nacional, do líder Carlos Marighella.
Um a um eles vão sendo presos e levados para salas onde sofrem os mais diversos tipos de tortura por parte dos agentes do DOPS, comandado pelo delegado Sérgio Paranhos Fleury, o Papa. Os momentos que passam por ali marcam muito mais do que o corpo daqueles que sofreram com o abuso da força. Frei Tito, mesmo depois de ser libertado (na troca pelo embaixador da Suíça) e enviado para o exílio na França, não consegue se esconder das suas memórias. A única saída que acha é o suicídio, que abre e encerra o filme.
Do impecável ao pecado
Toda a ambientação de figurino, cenário e locações está excelente, ótimo trabalho de pesquisa e produção. Difícil falar mal também da fotografia de Lauro Escorel, que consegue pintar os quadros com as aquarelas que melhor exprimem cada momento da história. Mas quando o assunto é o elenco fica defender Ratton. Principalmente em relação à escolha de Cássio Gabus Mendes, que tem a ingrata missão de reviver Fleury, uma das figuras mais odiosas daqueles anos. O ator, mais conhecido pelos seus papéis cômicos, até tenta criar o sujeito filho da puta, mas não consegue ir além da caricatura. E o mesmo vale para todos os seus subordinados... Um pecado perto das atuações contidas de Caio Blat e Daniel de Oliveira, respectivamente como Frei Tito e Frei Betto.
Como fruto dos ano 70, frustrado por ter no currículo apenas os parcos dias dos "caras-pintadas" como movimento "revolucionário" mais marcante, espero apenas que daqui a algum tempo não seja obrigado a ficar assistindo a inúmeros filmes sobre adolescentes bradando pelo impeachment de Fernando Collor de Mello. Reconheço a importância daqueles dias na história do país, e até por isso não quero que a próxima geração se intoxique com o tema, banalizando-o.
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