Embora Café Society mantenha o espírito leve e o clima solar dos filmes de desencontros amorosos recentes de Woody Allen, Magia ao Luar e O Homem Irracional, o longa estrelado por Jesse Eisenberg e Kristen Stewart traça para si uma insuspeita aspiração de ser síntese de uma época, o que o aproxima de registros históricos melancólicos de Allen como A Era do Rádio, A Rosa Púrpura do Cairo e Tiros da Broadway.
Não por acaso, são filmes que têm a arte ao centro, seja o cinema ou o jazz, e é a partir do viés cultural que o diretor faz suas crônicas de costumes. O longa conta a história de James (Eisenberg), um jovem judeu que se muda para Los Angeles nos anos 1930, com a esperança de trabalhar no estúdio de cinema onde seu tio (Steve Carell) manda prender e soltar. Lá, James toma contato com as maravilhas da alta-socidade e se apaixona por Vonnie (Stewart), sem suspeitar que ela é amante do seu tio (e patrão).
Tem um pouco de O Grande Gatsby nessa história de encanto e desencanto que Allen decide contar, com a modesta e sincera trajetória amorosa de James e Vonnie acondicionada dentro de um relato maior: a virada do século e o fim da Belle Époque no caso de Gatsby, a formação do ideal do sonho americano no caso de Café Society. Embora ambas as histórias se destaquem pela melancolia, Allen não deixa de pontuar seu filme com o seu típico humor autodepreciativo, à moda Philip Roth, enquanto mostra as formas muito diversas que o american way assume nos dois extremos do país, em Los Angeles e na Nova York natal de Allen.
Se Café Society se revela um filme mais ambicioso do que aparenta de início, isso se deve não apenas ao material, mas principalmente à fotografia de Vittorio Storaro. O mestre italiano, conhecido por Apocalypse Now e por ditar o tom dos principais filmes de Bernardo Bertolucci, mantém uma identidade visual com os outros longas recentes de Allen - a maneira como filtra a luz solar estabelece familiaridade com a fotografia de Darius Khondji - mas adiciona um tom barroco (Kristen Stewart é praticamente beatificada nos close-ups de Storaro) e uma elegância de movimentos de câmera que Allen, conhecido pela rapidez com que filma, raramente se permite.
O resultado é, ao mesmo tempo, discreto e deslumbrante. Allen faz mais um dos seus longas sobre pequenas relações problemáticas ("uma vida sem se examinar é uma vida que não vale a pena ser vivida") mas alça esses personagens a emblemas de seu tempo, corpos que emanam luz própria, como os ídolos da Velha Hollywood que eram intangíveis, embora todos repetissem seus nomes à exaustão.
Ano: 2016
País: EUA
Classificação: 12 anos
Duração: 100 min
Direção: Woody Allen
Roteiro: Woody Allen
Elenco: Kristen Stewart, Blake Lively, Jesse Eisenberg, Anna Camp, Corey Stoll, Steve Carell, Parker Posey