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A certa altura de Anjos da Vida - Mais Bravos que o Mar (The Guardian, 2006), um instrutor na escola da Guarda Costeira dos EUA diz a um aluno que o trabalho da equipe durante a passagem do Furacão Katrina por Nova Orleans foi exemplar. Bem, na vida real não foi. A lerdeza governamental em acionar o socorro e transferir as vítimas não minimizou a tragédia. Mas estamos no terreno da ficção, dá-se um desconto. Mesmo porque a inoperância foi de Washington, não da Guarda Costeira. Em outro momento, Ben Randall (Kevin Costner) dá conselhos professorais ao novato Jake Fischer (Ashton Kutcher) em um bar frequentado pelos inimigos dos salva-vidas, os marinheiros. Eles se acham superiores porque agem em combate. Ninguém liga para a Guarda Costeira, só quando precisa dela, diz Randall. Está montado aí, nessas duas passagens, o tom do filme.
Luto e auto-afirmação se misturam no drama dirigido por Andrew Davis (O fugitivo, Efeito colateral), que tenta fazer justiça a uma instituição desacreditada, puxada ao fundo pela má reputação generalizada da esfera pública durante o governo W. Bush. Quando todos aportam, os salva-vidas da Guarda Costeira são os abnegados que avançam tempestades adentro. Sacrifício é a palavra-chave, não importa sob qual bandeira. Patacoada patriótica? Sim, mas ainda assim o filme tem um ponto de vista a defender.
E defende daquele jeito lacrimoso que todo mundo conhece. Há o atormentado e sábio mestre e há o pupilo errante e indomável. Randall é uma lenda entre os salva-vidas que sofreu um acidente terrível, no qual perdeu o melhor amigo. Para se recompor, é convocado a dar aulas na escola. Jake acabou de chegar - fama de nadador, recordes escolares, botando banca. Randall enxerga no garoto um talento, mas também uma pessoa que não conseguiria dar a vida por outra. O conflito está armado, e durante o período de árduo treinamento é a idéia de sacrifício que Randall tentará incutir em Jake. Se passar duas horas e vinte com Kevin Costner e Ashton Kutcher não é o seu ideal de diversão, certamente não é o meu. Mas vale dizer que Anjos da Vida não é uma tortura, ainda que também não seja um deleite. Atentar para o subtexto político pode ser um passatempo interessante. Principalmente no que diz respeito aos ideais, erguidos acima da mundanidade dos personagens. Época de reafirmação é assim mesmo - colocam-se os símbolos adiante das pessoas de carne, osso e defeitos. E é a postura clássica das lições de moral: declame a frase de efeito, levante-se da cadeira e saia em silêncio pela esquerda. Nada mais ligado ao desprendimento da Guarda Costeira do que essa altivez. O final do filme pode parecer gratuito, mal construído até, mas não deixa de fazer sentido.
Ano: 2006
País: EUA
Classificação: 12 anos
Duração: 136 min