Cafarnaum

Créditos da imagem: Sony Pictures Classics/Reprodução

Filmes

Crítica

Cafarnaum

Principal filme "de consciência" da temporada joga tudo no registro realista

17.01.2019, às 16H50.

Posicionado estrategicamente na fronteira entre o cinema de boas intenções e o cinema de exploração da pobreza, o drama libanês Cafarnaum chega ao circuito brasileiro muito mais escudado por ter sido recomendado publicamente por Oprah Winfrey do que por ter ganho o Prêmio do Júri do Festival de Cannes. Se o segundo dá para a diretora Nadine Labaki um aval "de arte", é Oprah que valida Cafarnaum como discurso humanista.

E é central para o filme que ele seja visto assim. Só uma crença num objetivo elevado, que ao fim da sessão faria bem ao espírito e às consciências, justifica a narrativa monocórdica de Labaki, que coloca o espectador como testemunha íntima de um julgamento de valores. Na trama, acompanhamos os motivos que fizeram o menino Zain (Zain Al Rafeea), condenado por esfaquear uma pessoa, a processar seus pais por colocá-lo no mundo. Os eventos que endureceram Zain para a vida se sucedem na tela num crescendo angustiante, até o desfecho moralizante sobre controle de natalidade.

Há um flerte perigoso com higienismo nessa mensagem e também na forma como o filme expõe seus personagens aos maiores testes num cortiço e pelas ruas de Beirute, onde refugiados sírios e africanos tentam sobreviver sob o Estado libanês. Labaki se refugia no realismo, filmando a quente com câmera na mão em locações e com elenco não profissional, para lastrear Cafarnaum a uma certa verdade documental. O trunfo da diretora é o protagonista Al Rafeea, menino sírio de 12 anos que, na época da filmagem, já vivia por oito anos como refugiado em Beirute. O olhar penetrante de Zain contém aquilo que Labaki ambiciona transmitir com seu filme: uma urgência de viver e a fúria e melancolia de não poder fazê-lo com dignidade.

O que Cafarnaum tem de melhor está contido nesses registros de rostos e reações. É um cinema de fisionomias, de uma universalidade na mistura de biotipos, todos unidos e igualados por um sistema impessoal que terraplana as individualidades. O que há de charmoso e minimamente otimista em Cafarnaum é a forma como o menino Zain recorre à criativade para conseguir dinheiro; no filme, esse elogio da malandragem (que ademais parece um elemento essencial nesse tipo de filme humanista sobre precariedade e párias sociais, de Cidade de Deus a Quem quer ser um Milionário?) devolve a Zain a individualidade suficiente para que ele chegue com algum sopro de vida ao fim do filme.

Mas, de novo, que fim é esse? O impacto do registro realista só mantém sua força até certo ponto, e para permanecer vivo com o espectador Cafarnaum parece depender mais de uma consciência culposa ou paternalista do lado de fora da tela, do que dos seus próprios méritos.

Nota do Crítico
Regular
Cafarnaum
Capharnaüm
Cafarnaum
Capharnaüm

Ano: 2018

País: Líbano

Classificação: 16 anos

Duração: 121 min

Direção: Nadine Labaki

Elenco: Zain Al Rafeea, Yordanos Shiferaw, Boluwatife Treasure Bankole

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