|
||||
Noah, o carpinteiro humilde, e Allie, a loirinha rica, tiveram um namorico de verão. Tudo acabou quando a mãe de Allie disse que Noah não era do nível da família. Anos depois da briga, o menino pobre amadurece e a menina afortunada aguarda o dia do seu casamento com um filho da alta sociedade. Nunca mais se veriam se o destino não os reunisse no mesmo cenário que um dia os assistiu amando...
A trama pode parecer ultrapassada, mas Diário de uma paixão (The Notebook, 2004) não tem medo de optar pelo mais trivial água-com-açúcar. Pelo contrário. Por trás de uma aparentemente simplória história de amor, há a defesa metalinguística de um gênero que caiu em desuso nos atuais dias de cinismo. Até a época retratada pelo diretor Nick Cassavetes, os anos 1940 da guerra e do sonho americano, remete aos tempos áureos do melodrama.
Noah e Allie, vividos em 1946 por Ryan Gosling e Rachel McAdams, são interpretados cinquenta anos depois por James Garner e Gena Rowlands, mãe do diretor. Ela está internada numa casa de repouso, com Mal de Alzheimer. Ele a acompanha com o caderno do título, do qual tira diariamente a mesma história dos dois jovens apaixonados, Noah e Allie. O velho se esforça, assim, para manter na memória doente dela a lembrança do amor.
Não há problema em revelar aqui a verdade dos personagens - situação um tanto evidente, que o roteiro tenta manter em ineficaz suspense. O que importa, sim, é entender que a luta de Noah em preservar o passado diz menos respeito a Allie e muito mais ao próprio gênero engolido pela História. Saber que o filme se destina a simplesmente homenagear o melodrama torna tudo mais prazeroso. O incômodo da trama rasa dá lugar à nostalgia da roda gigante, dos amassos no cinema, dos passeios de barco e dos amores incondicionais.
Isso basta para induzir, com eficácia, o choro da audiência. Mas há o outro lado. E se o filme não tem medo de ousar, que aceite a crítica da sua pretensão. Essa museologia ingênua, tipo "como era bom naqueles tempos...", anda de mãos dadas com o fetiche e a paródia. É como a banda Darkness que vampiriza o Heavy Metal farofa ou os grupos do "Novo Rock" que se vestem como os seus pais hippies: tudo não passa de risível e anacrônico fetichismo. Sem reinventar antigas fórmulas, sem introduzir algo novo, não há como fazê-las funcionar com autenticidade.
E se você cair na gargalhada diante do bigodudo pai de Allie, da revoada digitalizada de pássaros, dos negros dançando em volta da fogueira sulista, ou do Noah perplexo com a guerra, não se sinta um herético insensível. A culpa não é sua.
Havia meios de fazer com que Diário de uma paixão fosse um filme melhor. Se Cassavetes tivesse interrompido a narrativa no momento em que a velha Allie perde a memória e surta, seria o final perfeito: instigante, anticlimático, consciente da sua falibilidade, dos limites da sua viagem revivalista. Mas o diretor se deixou enganar pelo sentimentalismo, justamente quando estava bem no olho do furacão temporal.
Ano: 2003
País: EUA
Classificação: LIVRE
Duração: 123 min
Direção: Nick Cassavetes
Roteiro: Nicholas Sparks, Jan Sardi, Jeremy Leven
Elenco: Gena Rowlands, James Garner, Ryan Gosling, Rachel McAdams