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Corridas Clandestinas | Crítica

O filme inteiro parece um irresistível balé kitsch: acelera, empina, grita, anda com a roda dianteira

17.07.2003, às 00H00.
Atualizada em 07.11.2016, ÀS 06H00

O jovem Kid (Derek Luke) sonha em debutar nos rachas de moto e, um dia, ser imbatível como o rei das corridas, Smoke (Laurence Fishburne). Mas quando o pai de Kid, Slick Will (Eriq La Salle), mecânico e braço direito de Smoke, morre atingido por uma moto desgovernada, o sonho se torna uma obrigação. E Kid, que nunca gostou da antiga submissão do pai em relação ao campeão, decide formar um grupo de corredores, os Biker Boyz, para tentar fazer o Smoke comer poeira.

Fiapo de roteiro à parte, eis a grande questão: existe algo em Corridas Clandestinas (Biker boyz, 2003), de Reggie Rock Bythewood, que realmente vale a pena ser visto?

Bom... depende. No departamento dos efeitos especiais, as motos perdem fragorosamente para os carrões da franquia Velozes e Furiosos. Já no quesito "futilidade gratuita", a coisa se equilibra: tanto as lições de moral de Corridas quanto a justificativa policialesca de Velozes são de embrulhar o estômago. Mas o filme de Bythewood leva vantagem num ponto todo especial: o humor involuntário.

Afinal, fica bem difícil segurar o riso quando o dublê de cantor Kid Rock surge na tela com colar de espinho, estilo sadomasô. Ou quando Laurence "Morpheus" Fishburne, de calça de couro e camiseta lilás, tenta esconder a barriguinha saliente estufando o peito. Ou quando o protagonista Derek Luke, tido como a grande revelação de Voltando a viver, faz bico e cara de mau com os seus olhos ligeiramente vesgos.

Entenda que isso não é implicância com um ou outro ator. O filme inteiro parece um irresistível balé kitsch: acelera, empina, grita, anda com a roda dianteira, traseira para cima, pára, prende o pedal, desce da moto, exibe a jaqueta. Surgem latinos de cabelo mal lavado, brancos com cara de modelo fashion-deslocado. E chegam os asiáticos bronzeados com os seus possantes quadriciclos. Tudo como se fosse uma equipe multirracial de nado sincronizado. Ou uma mistura engraçada de Grease com o cult oitentista Warriors - Os Selvagens da Noite.

Não é apenas a coreografia e o figurino que expõem o filme ao ridículo. A condução frouxa do diretor também constrange. Várias seqüências não têm "timing", cortes acontecem bruscamente e trechos importantes são encurtados. Aposto com você: Ao final da cena da ponte, quando chega a polícia e não acontece sequer uma perseguiçãozinha, o espectador se perguntará se o projecionista esqueceu-se de rodar um dos rolos do filme.

Cena de Velho Oeste

Mas calma lá. Se Corridas se resumisse ao trash, seria altamente recomendado! Acontece que logo a diversão dá lugar àquelas lições de moral citadas lá em cima. Assim, o filme mostra que, além de hilário, pode ser insuportavelmente sexista, machista e adepto da reacionária doutrina dos cowboys.

E não se trata meramente da crítica aos rachas politicamente incorretos ou ao retrato das morenaças de biquíni que ocupam a tela apenas para lavar as motos e consolar os corredores. O machismo vai mais fundo. Por exemplo, o papelão vivido por Anita (Vanessa Bell Calloway), a mãe de Kid. Por ter alguns segredos e contas a prestar, não lhe é permitido reclamar ao ver o enterro do marido, nem da devoção do filho rebelde pelas mesmas corridas mortíferas.

O que conta aqui, afinal, não é a competição descompromissada, mas a máxima do homem-que-supera-desafios, como mostra o racha final - duelo ocorrido num vasto rancho, com direito a crianças loiras, cavalos e poeira. Ah, e ao meio-dia! Tipicamente norte-americana, a cena remete aos desbravadores do Velho Oeste, a quem bastava um único disparo para vencer na vida e conquistar o respeito do mundo. A imagem fálica da espingarda Winchester aqui é transformada no guidom do acelerador ou no cilindro de nitro. Neste outro mundo de Marlboro, a fumaça vem dos cavalos-de-pau. E as pessoas ao redor do piloto não deixam de vibrar ao aspirá-la.

Em resumo, ria à vontade do aspecto kitsch do filme. Mas abra o olho diante da idéia de supremacia legítima que tentam lhe vender. Não poderia ser mais falsa a frase "homens se diferem de garotos pelas lições que aprendem", repetida a esmo por Kid. Não há neste filme tosco qualquer lição digna de lembrança.

Nota do Crítico
Ruim
Corridas Clandestinas
Biker Boyz
Corridas Clandestinas
Biker Boyz

Ano: 2003

País: EUA

Classificação: LIVRE

Duração: 90 min

Direção: Reggie Rock Bythewood

Elenco: Laurence Fishburne, Derek Luke, Orlando Jones, Djimon Hounsou, Lisa Bonet, Salli Richardson-Whitfield, Vanessa Bell Calloway

Onde assistir:
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