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O despertador toca.... Toca de novo... E mais uma vez... Coberto até o focinho, Garfield percebe que só uma dieta o fará desentalar da sua cama quadrada.
Sentado na poltrona do seu dono Jon, o gato zapeia no controle da TV... E zapeia de novo... E mais uma vez... Aborrecido, Garfield então pede aos céus que chegue logo a terça-feira.
Curtindo a preguiça matinal, o gato vê o rato Louis se aproximar... Louis tem medo... Louis passa correndo... O rato se salva... Garfield chega à conclusão que lasanhas são muito mais apetitosas.
Na cozinha, o cachorro Odie arfa... E baba... E arfa... Garfield agradece por ter nascido gato, um ser infinitamente superior.
Esse ritmo manso, que imita bem a rotina de qualquer gato mimado, é a marca da tira criada por Jim Davis em 1978. Agora, veja bem. Dar vida cinematográfica a cartuns já é difícil. Esticar uma história de três quadros a uma trama de longa metragem, então, bem mais complicado. Mas transformar uma HQ minimalista - que cativa rápido justamente pela repetição das mesmas situações, em que quase nada acontece além dessa caricatura da soberba felina - em uma aventura elaborada, parece missão suicida.
Neste caso, a transposição fica impossível sem desrespeitar o original, sem introduzir novos conceitos. Os fãs mais apegados terão muitos motivos para reclamar. Mas vamos lá. Que soltem um bicho dançarino, rebolante como nunca, embalado por Black Eyed Peas e James Brown, com inéditos movimentos labiais, metido em grandes missões e árduos dilemas. Se Jim Davis dá o seu aval para Garfield - O Filme (Garfield, 2004), quem sou eu para questionar?
Papinha
Na película dirigida por Peter Hewitt, o gato ganha vida por computador. Isso lhe dá movimentos impensados para a gorda bola de pêlos dos quadrinhos, mas a sua proverbial moleza, o seu cinismo e o seu ar de superioridade seguem intactos. Não adianta Jon (Breckin Meyer) reclamar: Garfield (voz de Bill Murray no original) é o dono da casa. A coisa muda quando os dois entram no consultório de Liz (Jennifer Love Hewitt) e o rapaz, desde sempre apaixonado pela veterinária, é convencido a adotar um filhote, o cão Odie. Ao ver o seu domínio ameaçado, o gato se indispõe. Mas quando uma das suas brincadeiras coloca Odie em perigo, Garfield vira herói e decide atravessar a cidade para salvá-lo.
Se a trama lhe parece familiar, não é por acaso. Toy Story (1995) e Stuart Little (1999) são outros dois dos inúmeros casos em que uma rivalidade por atenção doméstica se desdobra em típica lição de amizade. Repare, inclusive, que os dois roteiristas de Garfield, Joel Cohen e Alec Sokolow, assinam não apenas a trama de Toy Story, como também repetem a mesma fórmula "separados erramos, unidos venceremos" em Doze é demais (Cheaper by the dozen, 2003). Ok, parece redundante criticar o filme por remodelar o personagem, mas precisava investir numa idéia tão batida?
O fato é que os realizadores criaram um produto ideal para as crianças, sem se preocupar com uma história sólida ou minimamente interessante para quem cresceu com as tiras do gato. Tudo ali é mastigado, fácil como papinha, desde as motivações do fraquíssimo vilão até as investidas amorosas de Jon. Aliás, esqueça o clássico palerma: no mercado de filmes as regras vigentes exigem amores felizes. Isso sem contar que uma adaptação decente não poderia dispensar um Odie virtual, babão e orelhudo. Fica claro que a aposta cai unicamente sobre o gato digital - e dependendo do carisma dele, a concorrência das férias já está ganha.
Mas, se serve de consolo, o uniforme de veterinária fica muito melhor na voluptuosa Jennifer do que na olhuda Liz de papel. De tão bem tracejados, os seios da atriz parecem irreais. São a coisa mais genuinamente cartunesca que o filme tem a oferecer.
Ano: 2004
País: EUA
Classificação: LIVRE
Duração: 80 min
Direção: Peter Hewitt
Roteiro: Jim Davis
Elenco: Breckin Meyer, Jennifer Love Hewitt, Stephen Tobolowsky, Bill Murray, Evan Arnold, Mark Christopher Lawrence, Vanessa Christelle, Daamen J. Krall, Eve Brent, Bill Hoag, Michael Monks, Mel Rodriguez, Juliette Goglia, Jerry Hauck