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Tida por muitos como uma burguesa metida a intelectual, a diretora francesa Catherine Breillat ganhou notoriedade depois de promover o astro pornô Rocco Siffredi a protagonista de Romance (1999), o seu sexto filme. Talvez por medo dos censores - que barraram Romance no mundo todo devido às variadas e ostensivas cenas de sexo - ou por maturidade mesmo, o seu filme seguinte, Para minha irmã! (À ma soeur!, 2001), suaviza um pouco a apelação gratuita, para penetrar de forma incisiva na psicologia adolescente.
Anaïs (Anaïs Reboux) e Elena (Roxane Mesquida) são irmãs. Anaïs, doze anos, é uma versão prematura e sinistra de Bridget Jones. Esconde debaixo de suas várias camadas de gordura uma ácida, realista e madura, porém reprimida, visão de mundo. Elena, quinze anos, já exibe formas capazes de chamar a atenção dos homens. Todavia, a beleza do seu corpo esguio traz, também, a maldição de sentir inúmeras tentações numa idade de tantas incertezas.
Elena a escraviza, incentiva a gula de Anaïs. Esta sofre com a discriminação dos pais, mas encobre os namoros da irmã. Alguns poucos dias de férias, quando Elena decide perder a virgindade com o estudante italiano Fernando (Libero De Rienzo), bastam para abalar essa frágil harmonia entre cumplicidade e rivalidade.
Volúpia represada
Catherine teve a idéia do filme quando encontrou, à beira de uma piscina, uma gordinha como Anaïs. A menina nadava de um lado a outro, e se abraçava nos corrimãos das escadas como se namorasse um homem. A cena se repete no filme e ilustra de forma inteligente a volúpia represada da personagem. Segundo a diretora, esse é o retrato da própria adolescência, sexualmente afoita, que não quer mais ser uma criança, mas ainda não pode seguir as regras do mundo adulto. O filme expõe a complexidade do conflito, ao apresentar uma Anaïs sem moralismo, com dignidade.
Já o lado crítico da diretora aflora na outra ponta, quando exercita a ironia ao tratar das dúvidas da irmã. O magnetizante diálogo que antecede o sexo entre Fernando e Elena, quando o rapaz gasta longos minutos para convencê-la a se entregar, é emblemático. Ao explicar o relacionamento, Catherine pega mais pesado na questão da virgindade: Existe tanta culpa associada ao fato de querer transar, que a menina exige do parceiro palavras de amor, mesmo que ele esteja mentindo. Na verdade, ela pede que ele minta. Essa necessidade do mito do amor é um estupro psicológico.
Existe certa luz no pensamento da francesa. E se algumas passagens de Para minha irmã! sugerem perversidade - como quando Anaïs se esbalda com um bastão de marshmallow, símbolo fálico proposital -, o discurso geral é de uma polêmica libertária.
O grande problema do filme é o final. O caso de Elena é bem resolvido. A diretora, porém, cria uma armadilha ao propor mais questões para Anaïs do que o seu roteiro é capaz de responder. Assim, o impacto derradeiro parece mais uma solução improvisada do que realmente elaborada. Acontece que esse final já havia sido pensado desde o início. Surgiu, inclusive, quando Catherine folheava o caderno policial de um jornal, naquele mesmo momento em que viu a menina na piscina. Talvez seja o momento mais frágil de um filme muito bem controlado.