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Dizem que o brasileiro não tem memória, mas os norte-americanos não ficam para trás. O diretor holandês Walter Stokman saiu por Nova York perguntando aos transeuntes quem conhecia o clássico Um Dia de Cão (1975). A grande maioria dos entrevistados não conhecia o filme, interpretado pelo grande Al Pacino e dirigido por Sidney Lumet.
A história é sobre um cara que assalta um banco com o objetivo de conseguir dinheiro para que seu namorado faça uma operação para trocar de sexo. Baseado em fatos reais, o filme foi indicado a 6 Oscar e ganhou 1 por melhor roteiro adaptado (Frank Pierson). Na época, houve grande polêmica, pois não havia filme algum que falasse sobre homossexualismo e tivesse no elenco uma estrela consagrada como Pacino.
A idéia de Stokman era mostrar o caso real por trás da ficção. Para isso ele buscou o depoimento dos policiais que cuidaram do caso, dos reféns que trabalhavam no banco, dos familiares dos bandidos, do diretor Sidney Lumet e do roteirista Frank Pierson. Além dos testemunhais colhidos, ele usou cenas do filme e uma entrevista concedida por Liz Eden já operada (antes da cirurgia chamava-se Ernest Aron), e do próprio John Wojtowicz a um programa de TV um ano após o roubo. Por sinal Wojtowicz continua agindo de forma desequilibrada. Stokman tentou entrevistá-lo para o documentário, mas as negociações não saíram como o previsto. Wojtowicz mostrou-se uma pessoa inacessível. Exigiu altas somas de dinheiro e queria ser pago antes de começar as filmagens. O modo de entrega do dinheiro era ainda mais surreal: seria entregue a um "Zé ninguém" num hotel e depois ele entraria em contato. Começou pedindo 18 mil dólares, depois passou a 25 mil e no final acabou pedindo 28 mil dólares. Chegou a fazer ameaças ao holandês, dizendo que ele voltaria para seu país num caixão.
No filme, percebe-se que as outras versões coletadas vão de encontro às de Wojtowicz. Ele afirma que seu parceiro no assalto, Sal, foi executado após ser desarmado. Porém, as outras pessoas presentes não contam dessa maneira. O mais curioso é que Sal era apenas um delinqüente juvenil que conheceu Wojtowicz em um bar e resolveu participar do assalto, pois o dinheiro seria dividido entre os dois. Ele não era homossexual e ficou irritado ao ser classificado como tal.
Wojtowicz mostra ter o perfil de uma pessoa desestruturada. Ele gosta de ter controle sobre tudo e realmente achava que naquele episódio tinha. Não passou pela sua cabeça que o FBI tomaria aquela atitude. Ele pensa e afirma que foi - "o único homem que desarmou a polícia norte-americana e os fez deitarem no chão com se estivessem na sarjeta". Wojtowicz mostra esse lado controlador ao negociar com Stokman a sua aparição no documentário. Afirma que o filme é dele, exige que o título seja o que ele escolher, faz colocações completamente fora da realidade.
No país das oportunidades, o que não falta são oportunistas
Um ponto interessante que está implícito e pode ser destacado é o oportunismo do povo norte-americano. A ex-mulher de Wojtowicz, Carmem, esperou 15 anos para pedir o divórcio com o intuito de receber algum dinheiro. Uma das reféns compôs uma música "Pirulitos e Espingardas", bem ao estilo do grupo The Mamas and Papas, seu marido gravou e enviou para a produção do filme. Até Liz, que foi o pivô de todo o acontecimento, lucrou. Com o dinheiro que Wojtowicz ganhou ao vender sua história para a Warner, pagou a operação de troca de sexo que ela tanto sonhava. Porém, quando ele saiu da prisão, Liz não quis mais vê-lo. Na verdade havia se casado com um rapaz de 18 anos e com um membro de 23 centímetros de comprimento. O mais patético é que Wojtowicz disse que sua relação com Liz nunca foi sexual, pois ele/ela era péssimo na cama. Sobre sua relação com Wojtowicz, Liz Eden não pôde prestar nenhum depoimento para Walter Stokman, pois faleceu em 1977 devido a complicações causadas pela AIDS.
Wojtowicz parece ainda viver sobre a fama de seu ato. Só atende ao telefone se ouvir o código DOG. Acha-se uma lenda viva e chega a se comparar com Pacino. Como não houve acordo, não participou das filmagens. Foram usadas apenas fotos que tirou em seus encontros com o diretor e uma filmagem feita durante a entrega de um prêmio ao roteirista Frank da qual ele participou. E a falta de um depoimento seu perante as câmeras não prejudica a produção. O diretor usou as conversas que tiveram ao telefone durante as negociações, os depoimentos dos envolvidos na época, imagens veiculadas na TV, tanto do assalto quanto da repercussão que teve na mídia e ainda passagens do filme.
Num primeiro olhar Um Dia de Cão - A História Real parece um trabalho acadêmico. Stokman desenvolve suas idéias linearmente, não fugindo muito do padrão. Mas isso não desabona seu esforço. Pelo contrário! Apesar de não inovar na linguagem, seu documentário cumpre a função que toda a produção desse estilo deve ter, que é informar. Baseado em fatos reais, sem tomar partido, Stokman realiza uma pequena obra-prima nesse aspecto.
Um Dia de Cão - A História Real
Based on a True Story
Ano: 2005
Lançamento: 16.02.2006
Gênero: Documentário
País: Holanda
Classificação: 14 anos
Duração: 75 min
Direção: Walter Stokman
Elenco: John Cazale , Sidney Lumet , Al Pacino
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