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Motoboys - Vida Loca | Crítica

<i>Motoboys - Vida loca</i>

17.06.2004, às 00H00.
Atualizada em 21.09.2014, ÀS 13H16

Motoboys - Vida loca
Brasil, 2004
52 min. - Documentário

Direção: Caíto Ortiz

Como resolver o trânsito de São Paulo? Como impor limites aos motoboys? Como acabar com a selvageria dos entregadores sem prejudicar a rotina da "cidade que nunca pára"?

Se você procura respostas, não as encontrará no documentário Motoboys - Vida Loca (2003), escolhido como o melhor da sua categoria na Mostra Internacional de São Paulo. O primeiro grande triunfo do média-metragem de estréia de Caíto Ortiz é não tentar abraçar o mundo. Antes disso, é preciso desmanchar preconceitos, expor todos os fatores que contribuem para o caos, revelar a complexidade do problema. E isso os seus 52 minutos fazem com transparência e sobriedade.

Mais urgente, por exemplo, é entender que sem os entregadores sobre rodas - fenômeno urbano que há anos substituiu os pedestres officeboys - a máquina financeira, estatal e social acaba engessada. É entender que a maioria dos quase 300 mil motoboys de São Paulo não têm registro, benefícios ou direitos. É saber que o governo estadual perde 200 milhões de reais por ano com acidentes de trânsito envolvendo as motos. Mais importante que antecipar conclusões é saber que a metrópole mata dois motoqueiros a cada dia.

Liberdade

O filme fornece os dados e busca o lado humano. Ortiz alcança um segundo grande êxito ao arrebanhar, num número pequeno de entrevistados, uma variedade completa de perfis. São quatro motoboys e uma motogirl, mas cada um deles tem as suas motivações, os seus objetivos. Há o pai de família que exerce a profissão há doze anos e preza pela sua segurança. Tem o outro que vara a madrugada nas ruas atrás de uns trocados a mais - mesmo com o perigo de ter a moto roubada pela enésima vez. Há o típico cachorro louco que coleciona cicatrizes e não vislumbra mais do que um acidente mortal num dia de azar. E existe a mulher de meia idade, divorciada, que perdeu um filho, e depende do frenesi constante das entregas para não pensar na própria vida.

Apesar das individualidades, existe uma aura que rege cada um dos personagens. E com o seu ritmo dinâmico, de câmeras postas sobre guidões e garupas, de informações ligeiras jogadas na telona, de trilha sonora antenada feita pelo coletivo Instituto, o filme desenha com desenvoltura essa "vida loca". Mostra que, dentro dos capacetes, há uma genuína manifestação de anarquia. Ver-se apto a voar nos engarrafamentos é fazer parte de uma tribo urbana onipotente num universo onde ninguém mais é senhor do tempo.

Ter uma moto que funcione custa alguns salários mínimos, mas confere status, poder e, principalmente, liberdade. De quebra, o símbolo fálico motorizado configura domínio sobre a mulherada. "É só chegar com uma moto que as minas colam, nem precisa ser bonito", diz um dos motoqueiros, recém-saído da adolescência.

Indignação

Evidentemente, há o lado pouco satisfeito dos excluídos e congestionados: não é difícil ver na horda de motoboys que buzinam, que discutem e que quebram retrovisores a personificação de uma irmandade do Mal. Personalidades, pensadores e estrategistas da CET (Companhia de Engenharia de Tráfego) dão o seu parecer diante da câmera. Concordam que a cidade não viveria sem os entregadores, mas se incomodam com os desmandos no trânsito. Esboçam indignação, mas não conseguem visualizar uma solução imediata.

Aos poucos, outro tipo de indignação nos pega. Ortiz informa que o projeto para a construção de uma pista exclusiva de motoqueiros sairia mais barato do que o dinheiro perdido com cada acidente rotineiro. Revela também que havia uma lei no Código de Trânsito que proibia o tráfego nos chamados corredores, as faixas que separam as pistas de rolagem. Mas o governo FHC extinguiu essa cláusula, explicando que ela acabaria com a eficiência dos entregadores. Em outras palavras, praticidade vale mais do que segurança.

Nesse momento, percebemos que a grande culpada é a própria cidade, com o seu crescimento afobado que não segue projetos, com a sua ética deformada que desrespeita habitantes, faz da pressa uma norma e louva a informalidade descartável. Em defesa do bom senso, sem julgamentos, Motoboys - Vida Loca termina, ilumina a questão e dá o seu recado.

Nota do Crítico
Bom
Motoboys - Vida Loca
Motoboys - Vida Loca
Motoboys - Vida Loca
Motoboys - Vida Loca

Ano: 2004

País: Brasil

Classificação: LIVRE

Duração: 53 min

Direção: Caíto Ortiz

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