Filmes de guerra que buscam fugir do conflito e se preocupam mais com a manutenção da civilidade de seus personagens costumam ser interessantes. Um dos melhores do subgênero, A Morte Tem Seu Preço (Raoul Walsh, 1958) é um dos melhores exemplares desse cinema, que vai na contramão de amparar-se na historiografia para impactar pela violência e busca, na verdade, entender as emoções, anseios e medos das pessoas que portam as armas. Mesmo que longe de ser também um grande filme, o norueguês Narvik, de Erik Skjoldbjærg, parece mais próximo desse cinema de guerra humanista do que de uma estetização da brutalidade.
O longa nos apresenta à história real de uma cidade norueguesa que se viu obrigada a abandonar sua neutralidade e abraçar a guerra diante da invasão do exército nazista. Se essa proposta de narrar um evento menor dentro de um mar de grandes acontecimentos da segunda Guerra lembra um pouco o que propôs Christopher Nolan em Dunkirk, na prática, o filme de Skjoldbjærg se distancia bastante por seu apego maior pelos personagens em vez de pelo cenário.
Narvik é um filme imerso na guerra, mas a trata sem ser vil. Skjoldbjærg tenta construir um cenário no qual todos os personagens estão apenas tentando sobreviver diante do conflito, e o faz com algumas ideias interessantes. A primeira é que, por mais que nos momentos iniciais, não haja conflitos no núcleo principal, o ambiente já é tomado pela guerra. É um ambiente soturno, desesperançoso, que mostra os terrores que se avizinham conforme os nazistas se aproximam e obrigam o povo da cidade de Narvik a entrar na guerra.
O apego demasiado à reconstrução histórica apurada parece pesar para Narvik. A primeira metade do filme se destaca pela manutenção da humanidade dos personagens diante do horror. Além disso, o longa possui um bom trabalho de câmera, bastante preciso para que a narrativa também respeite essa humanidade – repare, por exemplo, como as lentes de Skjoldbjærg nunca buscam a violência, mas as reações de seus soldados diante dela, uma abordagem muito respeitosa para a história e seus protagonistas. A segunda parte, por sua vez, é fragmentada demais para manter o nível. Há diversos saltos temporais que até funcionam pela localização histórica da trama, mas que nada desenvolvem em prol das emoções dos personagens e suas relações, algo que custa caro na reta final da obra.
Parece faltar o tato de Skjoldbjærg para entender que a força de seu filme está nas tensões daqueles que são obrigados a lutar na guerra e aproveitar mais os momentos longe do campo de batalha. O horror encontra muito mais potência na expectativa e no medo do combate do que no combate em si. Nesse esforço para seguir a tendência das cenas de guerra intensas dos últimos anos, Narvik muitas vezes se furta de ser mais comedido, e acaba soando um pouco genérico demais.
Mesmo com suas irregularidades, Narvik ainda é um exemplo honesto de que ainda é possível falar sobre guerra no cinema com as câmeras voltadas não para os corpos mutilados no chão, mas para os sorrisos de alívio dos sobreviventes que ainda estão de pé. Entre erros e acertos, é uma obra que sabe que até mesmo retratando os momentos mais brutais da história humana, ainda podemos manter a humanidade, principalmente na forma como filmamos esses momentos. Em vez de a estetização dos horrores da guerra, o drama e o lamento pelo trauma causado por ela, como um bom filme de guerra deve ser.
Narvik
Narvik
Ano: 2022
País: Noruega
Direção: Erik Skjoldbjærg
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