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O Vencedor | Crítica

A verdade que há no estereótipo

03.02.2011, às 20H00.
Atualizada em 21.09.2014, ÀS 14H15

"Eu fiz uma piada e todo mundo começou a chorar", canta Dicky Eklund (Christian Bale) para a mãe. Os versos de "I Started a Joke", do Bee Gees, dão a dimensão do drama que o outrora "Orgulho de Lowell", o verdadeiro protagonista de O Vencedor (The Fighter, 2010), enfrenta para abrir os olhos e aceitar a sua condição de fracassado.

O filme do diretor David O. Russell indicado a sete Oscars é mais um, de uma leva recente que vai de Os Infiltrados a Atração Perigosa, a enfocar a extensa comunidade descendente de irlandeses em Massachusetts, na costa leste dos EUA. A imagem mais recorrente é a de um estado elitista - com sua alta renda per capita, bostonianos prósperos e graduandos de Harvard - e isso acaba aumentando, por contraste, o brio das vizinhanças mais modestas, como os habitantes de Lowell.

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Dicky teve uma glória no seu passado de pugilista quando derrubou Sugar Ray Leonard em 1978 (uma luta que Dicky acabou perdendo). Nos anos 90 ele ainda se apega a esse feito, e o seu irmão caçula, também boxeador, Micky Ward (Mark Wahlberg), se ressente por não receber a mesma atenção de Dicky. Na verdade, da família os irmãos ganham o mesmo nível de condescendência: Micky não ganha nada, mas tudo bem, Dicky está se afundando no crack, mas uma hora ele para.

Assim como na música do Bee Gees, O Vencedor expõe essa mistura de orgulho com autoengano pela via da tragicomédia. A atuação caricata de Bale - que nunca esteve tão parecido com Caco, o Sapo - impõe o tom, mas ela sozinha não bastaria para estabelecer o clima farsesco. A sacada maior do roteiro, neste começo, é colocar em cena os documentaristas da HBO que foram a Lowell fazer um filme sobre Dicky. A metalinguagem permite que O. Russell mostre, de início, que tudo é uma questão de perspectiva. O problema de Dicky não é a vida que ele leva, mas a que ele acha que leva.

A oscilação de gêneros que toma O Vencedor até o fim - a comédia física do começo dá lugar aos poucos ao melodrama de superação - pode parecer pulso mole, mas essa transição era obrigatória. Ela acompanha a conscientização dos personagens, um processo que tem um marco definido (a exibição do documentário na TV) mas não acontece bruscamente. A imagem que os personagens fazem de si mesmos é uma questão que persiste. Não por acaso, Dicky e Charlene (Amy Adams) só chegam a um acordo em relação a Micky quando se reconhecem como párias de uma mesma vizinhança, e não como estranhos.

A inteligência de O Vencedor é identificar que os estereótipos podem guardar verdades profundas. Mickey O'Keefe, o sargento que se torna treinador, seria o clichê do irlandês ruivo sardento policial - só que é o O'Keefe real que está ali interpretando a si mesmo... David Russell realiza um filme muito satisfatório tanto na comédia quanto no melodrama porque entende que o cinema de gênero não pode prescindir de estereótipos.

E se o estereótipo é um engessamento, uma espécie de morte, a canção remedeia: "Quando eu finalmente morri / Isso fez o mundo começar a viver".

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O Vencedor | Cinemas e horários

Nota do Crítico
Ótimo
O Vencedor
The Fighter
O Vencedor
The Fighter

Ano: 2010

País: EUA

Classificação: 14 anos

Duração: 115 min

Direção: David O. Russell

Elenco: Mark Wahlberg, Christian Bale, Amy Adams, Melissa Leo, Dendrie Taylor, Jack McGee, Bianca Hunter, Erica McDermott, Jenna Lamia, Caitlin Dwyer, Chanty Sok, Jackson Nicoll

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