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Crítica

Rainha do Mundo | Crítica

Alex Ross Perry faz o seu Eu Sei o que Vocês Fizeram no Verão Passado (o vilão é a misantropia)

06.10.2015, às 12H23.
Atualizada em 29.06.2018, ÀS 02H37

Convém saber que ego e misantropia são os ingredientes principais dos filmes do roteirista e diretor Alex Ross Perry, na hora de encarar Rainha do Mundo (Queen of Earth, 2015). Porque quando Elisabeth Moss surge em close-up invasivo logo na abertura do filme, com a maquiagem preta borrada pelo choro, em pleno rompimento com o namorado, o espectador talvez tenda a pensar que nada, na vida da personagem, pode ficar pior do que está.

Na trama, a atriz de Mad Men interpreta Catherine e Katherine Waterston, de Vício Inerente, vive sua melhor amiga, Virginia. Ao longo do filme elas passam uma semana de verão na casa de campo isolada da família de Virginia, e parece ser a oportunidade ideal para Catherine cuidar da sua mágoa pelo fim do relacionamento com James (Kentucher Audley) e pelo suicídio recente de seu pai, que ela idolatrava. Na casa de campo, porém, voltam lembranças e ressentimentos, acabando logo com a ilusão de que teremos um filme sobre redenção, se essa ilusão ainda houvesse.

Porque Perry usa a casa do lago não como cenário de iluminação mas como gênero - da trilha sonora tensa aos letreiros que parecem saídos de um slasher dos anos 1970, tudo em Rainha do Mundo evoca o terror de cabana, e, se já não tivesse sido usado antes, o título Eu Sei o que Vocês Fizeram no Verão Passado caberia muito bem nesta história sobre rancor e loucura. Aqui, a introspecção da solidão, ao invés de curar os lutos, serve apenas para isolar ainda mais.

Ao mesmo tempo em que respeita as regras desse gênero (a opressão se dá principalmente pela oposição de Catherine à figura estoica e viva de Virginia, com sua roupa de ginástica, suas saladas e sua disposição matinal), Perry usa o suspense para tratar dos temas que ele carrega consigo de outros filmes, como o recente Cala Boca Philip, o único lançado no Brasil. A impossibilidade da empatia é o principal desses temas. A desarticulação provocada pela incapacidade de se enxergar no outro, central para Perry, é transformada em Rainha do Mundo em combustível não só para uma morte social mas para uma ruína física completa.

Moss e Waterston respondem notavelmente às exigências de Perry até a metade do filme; as duas atrizes se saem particularmente bem nas cenas de diálogos cortantes, de comportamento passivo-agressivo, pelas quais o roteirista/diretor é conhecido. O combustível parece escassear, porém, do meio para o fim, quando o arsenal formal de fusões e close-ups se esgota e a alienação entre Virginia e Catherine não tem mais volta.

Em nome de uma fidelidade ao gênero que escolheu seguir aqui, Perry faz do outro uma ameaça apenas (a faca sobre a mesa, o desejo de roubar o amante) - e isso no fim soa simplista. Talvez o diretor pensasse que estivesse levando seus temas ao limite do melodrama, mas o desfecho de Rainha do Mundo (que já ficava claro e incontornável muito cedo) parece mais uma saída fácil e de impacto para o drama de sermos incapazes de dividirmos com os outros a nossa dor.

Nota do Crítico
Bom

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