Stephan James é um dos melhores atores de sua geração, só está lhe faltando a oportunidade de mostrar. Lá em 2018, o canadense impressionou com performances de empatia complementar no filme Se a Rua Beale Falasse e na série Homecoming, um ano que poderia ter carimbado o seu passaporte para o estrelato… caso ambos os títulos não tivessem sido largamente ignorados pelas premiações de Hollywood, relegando seu astro a seguir carreira em produções que raramente o mereciam. Ricky, exibido no Festival de Sundance 2025, é a exceção a essa regra - e também mais um atestado impactante do que James é capaz de fazer, quando ganha espaço para isso e tem um material dramático interessante em mãos.
Na trama, desenvolvida pelo diretor e roteirista Rashad Frett a partir de um curta-metragem de sua própria autoria, Ricky (James) é um rapaz de 30 anos de idade que acaba de sair de uma temporada de 15 anos na prisão. Isso significa que não só ele precisa navegar as dificuldades de reconstruir uma vida pós-encarceramento - incluindo as condições complexas de sua condicional, vigiada pela agente linha-dura Joanne (Sheryl Lee Ralph) -, como também que ele precisa aprender a ser adulto, e portanto responsável por si mesmo, pela primeira vez na vida. É uma conjunção dramática esperta: a partir dela, Frett e sua corroteirista Lin Que Ayoung podem explorar dilemas sociais importantes sem se verem reféns deles como única muleta temática. Sua história, afinal, é na verdade uma de amadurecimento tardio.
James, é claro, vira peça chave na construção segura desse arco. O ator encontra o equilíbrio certo entre a ingenuidade que Ricky precisa demonstrar diante de situações que nunca teve a oportunidade de viver (um flerte com a vizinha, um vacilo do irmão mais novo, um confronto no local de trabalho) e a intensidade emocional das escolhas que ele precisa fazer a cada novo obstáculo que surge no caminho para a construção dessa nova vida que ele não faz ideia de como manejar. Ele é compulsivamente assistível, até pela expressão cristalina que sabiamente escolhe diante da câmera conduzida na mão, com muita intimidade, por Frett e pelo diretor de fotografia, seu colaborador frequente Sam Motamedi. É James quem faz com que a busca de Ricky por uma saída seja realmente desesperadora, e sua inevitável falha em encontrar essa saída ainda mais.
Ao redor de Ricky (o personagem), Ricky (o filme) ainda trata de colocar uma galeria poderosa de personagens femininas que formam a sua rede de apoio - mas que, em última instância, não podem viver a vida por ele. Brilham nesses papéis atrizes como Sheryl Lee Ralph (Abbott Elementary), que transporta a sua dicção impecável e a sua capacidade inigualável de evocar autoridade para o papel importante da oficial de condicional que vai além dos limites de seu cargo para tentar ajudar o rapaz; Simbi Kali (3rd Rock from the Sun), rígida e machucada na pele da mãe de Ricky; Andrene Ward-Hammond (Loving), impetuosa e sexy como a mulher mais velha com quem ele se envolve no grupo de apoio a ex-presidiários; e Imani Lewis (First Kill), que descasca lindamente as camadas de cuidado por baixo da ironia da jovem com quem Ricky conversa, meio por acaso, para conseguir um emprego.
A beleza de Ricky está em como ele desenha uma história sobre a beleza interconectada de uma comunidade, e as mulheres que a sustentam, sem negar ao protagonista masculino a responsabilidade de andar com as próprias pernas - e, como se diz por aí, “assumir os próprios B.O.’s”. Dono de qualidade dramática rigorosa, ele encena os conflitos que marcam a passagem de um estado para o outro (dependência para independência) com inteligência e intencionalidade que o ajudam a escapar da maldição de ser só mais um drama social explorando a miséria dos marginalizados. Longe da tragédia shakespeariana, essa é uma história sobre coragem, autonomia e autoconhecimento - enfim, sobre o que você precisa para continuar vivendo apesar da tragédia.
Ano: 2025
País: EUA
Duração: 109 min
Direção: Rashad Frett
Roteiro: Lin Que Ayoung, Rashad Frett
Elenco: Sheryl Lee Ralph, Titus Welliver, Stephan James