Antes de chegar ao catálogo da Netflix, o filme que encerrava os eventos da série The Last Kingdom foi “vendido” para a mídia especializada como “independente” da série e como um dos mais caros da plataforma. Podemos começar estabelecendo que Seven Kings Must Die não é nem uma coisa, nem outra. O filme funciona muito pouco para os que não conhecem a história central e embora resolva seu baixo orçamento, essa é uma limitação evidente no resultado final.
Filmes baseados em séries que já se encerraram são um filão do mercado. Em alguns casos eles resolvem tramas que ficaram em aberto depois que o estúdio resolve cancelar a obra e recebe certa indignação. Em outros casos, o filme é uma maneira de continuar lucrando com algo que deu certo e se esgotou no formato televisivo. Uma terceira via – mais rara – é a de séries que ganham filmes durante sua vida na TV. Nos anos 90, Arquivo X foi quase uma pioneira nesse sentido, fazendo de Resista ao Futuro (1998) – que estreou no intervalo entre as temporadas 5 e 6 – um grande sucesso.
A HBO é uma campeã de títulos relevantes nesse sentido. Embora o segundo filme de Sex and the City seja extremamente problemático, o primeiro é um hit até hoje. O canal fez longas até para séries com pouquíssima audiência – como Looking – só para que elas não ficassem com pontas soltas. Contudo, as altas expectativas para o filme baseado no passado de Tony Soprano encontraram desinteresse comercial e reações discretas da crítica. O filme saído de Breaking Bad passou pela mesma coisa.
O fato é que tanto The Sopranos quanto Breaking Bad foram unanimidades que encerraram suas trajetórias plenamente. David Chase e Vince Gilligan (respectivamente os criadores das séries) não tiveram outra saída que não fosse flexibilizar a ideia. Chase foi para o passado e Gilligan focou em um personagem para contar uma história sem nenhum impacto no que já se sabia dele. É como se esse tipo de decisão criativa estivesse totalmente atrelada à necessidade de levá-la adiante. Alguma coisa ficou realmente pendente?
Enfim, o último reino
O longa que saiu do mundo de The Last Kingdom tem uma razão de ser. Quando a série se encerrou, na quinta temporada, os últimos três livros de Bernard Cornwell não tinham sido adaptados. Antes de assistir Seven Kings Must Die, a decisão parecia apenas mercadológica. Depois de assistir ao filme, começa a parecer certo ter deixado tudo para ser resolvido em um longa. Historicamente falando, a Batalha de Brunanburh era o único elo solto da vida de Uhtred (Alexander Dreymon) e o ponto final da luta britânica para manter sua soberania.
Entretanto, o filme dirigido por Edward Bazalgette (que dirigiu episódios da série) bifurca seus objetivos de formas contraditórias. Em parte, o filme ser centralizado na construção da batalha é um acerto. Por outro lado, nesse objetivo o roteiro não se preocupa em situar melhor onde estão cada uma das motivações dos personagens. É como se Edward não quisesse ir fundo demais para não afugentar quem não conhecia a série, mas, ao mesmo tempo, tenha provocado uma dificuldade para o espectador leigo na hora de estabelecer conexões.
O filme começa sem nenhuma preocupação em parecer um longa. A abertura é como a da série, a contextualização não existe e a história se desenvolve como se fosse só mais um season finale começando. Em meio a um festival de nomes que deixam os diálogos confusos (embora a edição tente ajudar com legendas de nomes e lugares), conseguimos rastrear o básico: depois da morte do Rei, o reino da Nortúmbria fica vulnerável e é atacado. Uhtred é chamado – é claro – para cumprir seu juramento de proteção. Lá, ele vai entrar em embate direto com as ideias do herdeiro Aethelstan (Harry Gilby), que junto com seu conselheiro e amante, acaba piorando as tensões que levam até a batalha final.
Passamos pelos acontecimentos pré-batalha com pressa. O que o roteiro quer é chegar até lá, mas até que isso aconteça, um certo tempo é desperdiçado com tramas recorrentes; indo desde a traição ao rei, passando pela dúvida sobre as motivações de Uhtred e chegando até cansativa dinâmica de exílio e vingança. Tudo é tão superficial que quando a Batalha chega estamos interessados nela apenas por conta de seu valor histórico. E quando essa mesma Batalha termina, percebemos que ela não foi inesquecível e nem grandiosa como esperado. Nada da eloquência de um Game of Thrones. Com o que tinha nas mãos, Edward foi correto e conseguiu encerrar seus trabalhos com dignidade.
De longe, o melhor momento é quando, na cena final, somos transportados de uma maneira bastante inteligente do passado para o presente, reforçando o caráter sensível e sagaz que na série de TV aparecia bem mais. Foi muito certeiro usar o recurso para ilustrar que, no fim das contas, as lutas territoriais ainda estão entre nós de maneiras sangrentas e injustificáveis; mesmo que, infelizmente, o ser humano insista em encontrar reverência na guerra.
Não se pode dizer que Seven Kings Must Die seja um filme ruim, mas tampouco ele é digno de um registro histórico... se bobear nem no rodapé da página.
Seven Kings Must Die
The Last Kingdom: Seven Kings Must Die
Ano: 2023
País: Reino Unido
Duração: 1h51m min
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