Daisy Jones and The Six está lançando novos episódios neste mês no Amazon Prime e o longa Tár é um dos grandes longas concorrendo ao Oscar, que acontece neste domingo (12). Apesar de ambas as obras serem centradas no universo da música, ambos têm mais elementos semelhantes do que se imagina. Com a popularização, diversas pessoas que assistem se perguntam ou acreditam que, tanto a banda de rock quanto a regista, são pessoas da vida real, gerando diversos artigos esclarecendo que Lydia Tár e o grupo são apenas ficção.
Mas o que essas produções possuem que geram essa confusão? A resposta envolve desde o formato que as histórias são narradas até as bases de inspiração.
FORMATO BIOGRÁFICO
Tanto a série quanto o longa usam formatos que produções biográficas geralmente utilizam para retratar astros da música: Daisy Jones and The Six utiliza do documentário para contar sua narrativa, intercalando com cenas de flashback com arquivos de fotos e vídeos com visual datado, remetendo a tecnologia dos anos 70. Enquanto Tár usa o formato de cinebiografia mostrando o storytelling comum dessas produções: o ápice da carreira, vivendo em luxo com o sucesso, os baixos que mostra seus defeitos, o artista em êxtase pela sua arte e performances marcantes.
Todos esses artifícios de contar a história são muito usadas ao retratar obras audiovisuais sobre artistas reais. No caso de Daisy Jones, o uso do documentário por si carrega um status de verídico. Documentários com esse formato semelhante são The Beatles: Get Back e o premiado What Happened, Miss Simone?. Vale ressaltar que existe o formato mocumentário (mockumentary) que são os falsos-documentários que usam esse formato para contar uma história fictícia, como The Office e What We Do In The Shadows.
Ao passo que Tár usa o formato mais “tradicional” de cinebiografias para contar sua história, como Ray, baseado no cantor de jazz Ray Charles, e o longa Elvis, que também está concorrendo ao Oscar, sobre a trajetória do Rei do Rock.
FICÇÃO BASEADO NA VIDA REAL
Outro ponto que ambas as produções citadas utilizam elementos que se inspiraram para contar as narrativas baseadas em pessoas e episódios reais. Daisy Jones and The Six é uma adaptação do livro homônimo de Taylor Jenkins Reid, que usa de pano o estilo de vida dos astros do rock nos anos 70, algo como Quase Famosos, mas seu adicional foi colocar uma trama amorosa entre os membros da trama fictícia - que se assemelha com uma banda da vida real.
Fleetwood Mac foi uma das bandas que marcou o rock dos anos 1970 e tinha um diferencial comparado aos outros grupos musicais: ter mais de um membro mulher - o que era raro - e que eles se envolviam amorosamente - o que gerou diversos conflitos entre si.
A banda tem grandes hits como "Dreams", "Go Your Own Way" e "Everywhere", mas também ficou marcada por hiatos, saída de membros e brigas. Seu álbum de sucesso “Rumors” tinha tudo para dar errado que estava em produção: na época, em 1977, a tecladista Christine McVie e o baixista John McVie estavam se divorciando, o baterista Mick Fleetwood descobriu que sua esposa estava traindo com o melhor amigo e guitarrista da banda Bob Weston e a cantora Stevie Nicks e o guitarrista Lindsey Buckingham terminaram o namoro.
A fórmula perfeita para o desastre virou a chave para o sucesso com músicas conhecidas (e cheias de indiretas) como "Dreams" e "Go Your Own Way", mesmo que haja um clima entre os membros - perceba os olhares entre eles nessa performance de "The Chain":
Por mais que a autora não diga que se inspirou diretamente, fica claro que há acenações ao contar a história da banda de rock que fez sucesso com muito álcool, drogas, brigas e envolvimento entre os integrantes no auge do sucesso. Outro fator para ser mais real é que a Amazon já lançou o álbum do grupo "Aurora" nas plataformas de música.
Enquanto Tár, apesar de não se inspirar em uma pessoa especificamente, o diretor Todd Field usou em seu pano de fundo instituições e pessoas do meio da música clássica reais - aumentando sua autenticidade. Além de representar com exímio o ciclo da cultura do cancelamento: a acusação, o escândalo, processo judiciais, a mídia explanando o caso, a reação exacerbada do público, empresas cancelando patrocínio e parcerias, a punição ou a falta dele.
Outro fator para mencionar é que Lydia é uma profissional da área da música erudita, um gênero nichado em que poucos conhecessem sobre o mercado e os atuais artistas do meio. Ao nos apresentar a protagonista envolvida na série de escândalos, é possível que muitos pensem que foi um episódio que não estavam cientes e pesquisem se realmente aconteceu.
Vale destacar que a atriz Cate Blanchett executou com excelência ao entregar uma personagem tão cheia de camadas, que nos faz gerar desde admiração até desprezo pela musicista, criando essa humanização também presente nos personagens baseado em produções biográficas. Todos esses fatores aumentam a verossimilhança da obra, apesar de ainda ser uma ficção.