Existem clichês de filmes de desastre que são quase obrigatórios: uma filmagem sinistra de pássaros migrando; uma família protagonista com problemas conjugais; um filho que requer medicamentos (que inevitavelmente serão perdidos no caos). Todos esses elementos estão presentes em Destruição Final: O Último Refúgio, longa lançado no Prime Video no fim de 2020 e que recentemente teve uma sequência confirmada. Mas a ação protagonizada por Gerard Butler merece muito mais reconhecimento. Subvertendo a tradição de galhofa de filmes do gênero, Destruição Final se leva a sério em seu elemento humano, e resultou em um raro filme de desastre, memorável pelo impacto de seus acontecimentos.
Nada na trama em si é muito inovador: um cometa se aproxima da Terra, e um restrito grupo de humanos foi selecionado pelo governo para se dirigir a um abrigo na Groenlândia, onde bunkers foram construídos na tentativa de preservar a humanidade. A família Garrity é uma das escolhidas, e o filme acompanha John (Butler), sua esposa Allison (Morena Baccarin) e seu filho pequeno, Nathan (Roger Dale FLoyd), na tentativa de chegar ao local de encontro em meio ao apocalipse.
O que Destruição Final tem de inovador, em primeiro lugar, é o elemento da família absolutamente ordinária. Ao contrário de outros filmes que acabaram com a humanidade de diversas maneiras - 2012, Contágio, O Dia Depois de Amanhã, Guerra Mundial Z e por aí vai -, aqui não temos nenhuma figura de autoridade com informações exclusivas. O público acompanha a jornada de John e descobre o desenvolvimento do fim do mundo junto com o seu protagonista. Em uma das cenas mais marcantes do longa, no meio da jornada e já tendo passado por diversas adversidades, John encontra uma casa e liga a TV. É apenas ao ver os acontecimentos na telinha que ele começa a tremer com o significado de algo que já testemunhou na pele.
A escolha do diretor Ric Roman Waugh de não fornecer nenhuma informação interna da catástrofe é um dos principais elementos que faz de Destruição Final um filme de desastre surpreendentemente relacionável. Seus três únicos protagonistas são terrenos, o que distancia o filme de um blockbuster baseado nas acrobacias de ação. Não me entenda errado: Destruição Final é um espetáculo de efeitos visuais, mas ele os utiliza a favor da narrativa, e não os coloca acima dela.
Mas, mais do que isso, Waugh faz uma escolha consciente e determinante de enfatizar a relevância das mortes mesmo em um contexto tão caótico. A humanidade está se virando contra si mesma e John é um alvo - a pulseira dos selecionados para o bunker o coloca em risco -, mas não é por isso que nosso herói perde seu elemento humano. Quando passa por um perigo real e precisa se defender assassinando um homem que o atacou, o filme paralisa no rosto de Butler e toma seu tempo. Não é porque a humanidade está acabando que o ato de assassinar alguém deveria perder seu peso.
São essas e outras razões que fazem de Destruição Final, também, o filme de desastre perfeito para tempos de pandemia. Waugh conseguiu unir o entretenimento do blockbuster, tão necessário no último ano, com uma sensação inédita e importante de empatia, rara no gênero. Assim como na maioria dos filmes de desastre, a mensagem final é de otimismo. Mas aqui a esperança é transmitida de um jeito mais tocante, exatamente porque o filme soube explorar a realidade de uma catástrofe.
Talvez seja por isso, também, que não seja tão estranho que Destruição Final ganhe uma sequência. Enquanto uma continuação seria impensável para a enorme maioria dos filmes de desastre, o filme de Waugh intrigou pela construção de seus personagens, e quem acompanhou a jornada da família Garrity quer torcer pelo futuro deles junto ao resto da humanidade. Apesar da amargura de ver o filme cair na mania de Hollywood de prolongar qualquer coisa que tenha dado certo, Destruição Final foi um filme tão único que deixou o público ávido por mais histórias assim.