Filmes

Entrevista

Dedé Santana fala da saudade de Os Trapalhões e do papel em O Shaolim do Sertão

Aos 78 anos, comediante se prepara para dividir a cena mais uma vez com Renato Aragão em releitura de Os Saltimbancos

04.01.2016, às 14H35.

Orgulhoso de sua porção palhaço, embora também tenha sido um diretor de sucesso, um campeão de bilheteria e, acima de tudo, um trapalhão, Dedé Santana terá um 2016 de muito trabalho, nos palcos e nas telas, começando por sua participação em uma das comédias mais esperadas do ano no país: O Shaolim do Sertão. Aos 78 anos, o ator niteroiense de São Gonçalo que fez rir gerações de brasileiros ao lado de Renato “Didi” Aragão, Mussum e Zacarias integra o elenco do novo longa-metragem de Halder Gomes, realizador do fenômeno popular Cine Holliúdy (2013). Já em filmagem no Ceará, a produção presta um tributo aos clássicos das artes marciais, narrando as aventuras de um aspirante a Bruce Lee no Ceará, vivido por Edmilson Filho. A mocinha (Bruna Hamú) tem um pai que é uma fera: o padeiro Seu Zé, papel de Dedé, que, filma em fevereiro, ao lado de Aragão, uma releitura do musical Os Saltimbancos, com direção de João Daniel Tikhomiroff (de Besouro) e roteiro de Mauro Lima (diretor de Meu Nome Não é Johnny Tim Maia). O título do filme: Rumo a Hollywood.

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Eu nunca me julguei um astro, porque, como venho do circo, onde estreei ainda menino, aprendi a encarar a arte como trabalho. Mas é gratificante ser lembrado. Sobretudo ser lembrado por um diretor que vem de fora do Rio, lá do Ceará, como o Halder. No Rio, tem muita gente fazendo comédias, mas ninguém nunca me chamou para atuar”, diz Dedé, cujo nome verdadeiro é Manfried Santana. “O carinho de ser reconhecido e poder filmar é muito bom”.  

Antes do Ceará, ele esteve em Brasília, contracenando com sua filha Yasmin Santanna no longa Licença Prêmio, de Santiago Dellape. Na produção, Dedé interpreta um policial que força uma turma de funcionários públicos a trabalhar. “É uma brincadeira com a realidade do funcionarismo público de Brasília”, diz o ator, que atuou também em Meu Pai é Figurante, um longa catarinese de 2012 ainda inédito no eixo Rio-SP.

Em 2014, ele e Aragão fizeram Os Saltimbancos Trapalhões no teatro, sob o comando da dupla Charles Möeller e Cláudio Botelho, os bambas do musical no Brasil. São eles que cuidam da trilha sonora e da coreografia de Rumo a Hollywood. Mas agora Dedé vai viver uma nova e inusitada experiência teatral. Ele vai deixar a persona do humorista de lado e encarnar um personagem diferente na peça: A Última Vida de um Gato, um texto de Alexandre Riboni, com direção de Victor Garcia Peralta, que estreia em 22 de janeiro no Teatro Brasil Kirin, em Campinas. Ele divide as cenas com Felipe Cunha no espetáculo, que classifica como “o primeiro” de seus 70 anos de carreira.    

“Nos Saltimbancos, eu era o Dedé. Aqui, não. É uma comédia, mas nela, eu não faço o  mesmo Dedé de sempre. É a história de um coroa que vive em seu apartamento e, aos poucos, vai descobrir uma amizade. É uma peça sobre a capacidade que o ser humano tem de superar suas limitações”, diz o eterno trapalhão, que volta a Fortaleza no dia 14 para rodar as últimas cenas de O Shaolim do Sertão. “Filmamos muita coisa no ano passado. Fiquei uma semana no Ceará trabalhando. Volto agora para uma cena de circo, o que já me comove muito. Eu entrei em cena pela primeira vez, em um circo- teatro, aos três meses de idade, no colo da minha mãe. Minha família é de artistas. O circo está em mim”.

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Quem vê Dedé atuando para as câmeras se impressiona com sua vitalidade: “Sabe aquele sonho que você acredita que nunca vai conseguir realizar na vida? Pois então... filmar com Dedé representava isso para mim”, orgulha-se Halder Gomes, que levou meio milhão de brasileiros aos cinemas para ver Cine Holliúdy. “Ícone das nossas lembranças de criança, Dedé é um profissional que se entrega ao papel com total disciplina. E ainda nos divertia contando os bastidores dos Trapalhões”.

Para teóricos de História do Cinema Brasileiro, como o pesquisador João Carlos Rodrigues, a comicidade de Dedé se impunha pela elegância.

O circo deu à cultura brasileira uma tradição de duplas cômicas, onde você vê o palhaço arrumadinho de um lado e o palhaço bagunceiro do outro. Dedé e Didi levaram essa tradição para os cinemas, criando entre si uma química perfeita, na qual um depende do outro”, avalia Rodrigues, responsável pelo levantamento das maiores bilheterias brasileiras dos anos 1970 a 2000, entre os quais entram filmes dirigidos por Dedé, como Os Trapalhões e O Mágico de Óroz (1984) e Os Trapalhões no Reino da Fantasia (1985). “Dedé era o lado galã da dupla com Didi, o palhaço comportado”.   

Relembrando seus momentos como cineasta, Dedé se surpreende com a velocidade do cinema contemporâneo. “Na época em que eu dirigia, você tinha que esperar dois, às vezes três dias, para poder ver um copião com o que filmou. Portanto, não se podia errar. Nos Trapalhões, nos chegamos a filmar no Marrocos. Imagina você errar um take lá? Como poderíamos voltar para refazer? Olha o quanto iríamos gastar... Hoje, tudo é rápido”, diz o ator, que ri ao lembrar das peripécias do colega Aragão nas gravações Os Trapalhões. “Um dia, eu tinha que entrar em cena às pressas, vestindo um smoking. Quando cheguei no set e pus a mão nos bolsos do paletó, eles estavam cheios de mangas. Foi trapalhada do Renato. Ele é um cara muito responsável e sério com o trabalho antes de gravar. Mas quando chega frente às câmeras, vira um menino".

Em 2017, Dedé completa 80 anos de vida. Ao passar em revista suas conquistas, o comediante se emociona: “Minha saudade maior é a minha convivência com meus colegas de Trapalhões. O Mussum era um cara sensacional, que fazia todo mundo rir. Renato era esse grande brincalhão nas gravações. E o Zacarias... Zacarias era o único ator de verdade entre nós. Eu admirava muito o talento dele. Nós quatro vivíamos 24 horas juntos e levávamos essa vivência para o nosso programa e para os nossos filmes. Hoje, a vida na comédia mudou muito: as pessoas só encontram na hora de gravar. Não há como criar a mesma intimidade em cena”, diz Dedéque tem predileções especiais entre os humoristas de hoje. “Gosto demais da dupla de Os Caras de Pau, do Marcius Melhem e do Leandro HassumA câmera gosta delesMas há no Brasil um outro grande comediante que é um ator brilhante, mas administra muito mal a própria carreira: o Tiririca. Ele é uma mistura de Dercy Gonçalves com Costinha. Mas precisa administrar melhor a carreira”.

Para este ano, Dedé torce pelo futuro do Brasil: “A situação anda difícil. Show caiu, teatro caiu... mas a luz e gás aumentam. Só a crise da Saúde já me dá uma tristeza enorme. Mas eu tenho esperança. Eu torço para o país voltar a sorrir”.  

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