Filmes

Entrevista

Depois de polêmica com O Mecanismo, José Padilha diz que não teme boicote a 7 Dias em Entebbe

Cineasta ainda fala sobre a corrupção no Brasil e a questão Israel x Palestina, tema de seu novo filme

18.04.2018, às 15H04.

Provocar é a natureza estética do diretor carioca José Padilha que, depois de eriçar os ânimos com a série O Mecanismo da Netflix, bota agora o dedo em outro vespeiro político, a questão Israel x Palestina, com o longa 7 Dias em Entebbe. Exibido fora de concurso no Festival de Berlim, o filme recria um episódio ocorrido com um voo Air-France em 1976: um avião com tripulantes israelenses foi sequestrado por extremistas alemães e forçado a pousar em Uganda para uma negociação que envolvia a libertação de palestinos presos.

Na Berlinale, o filme, fotografado por Lula Carvalho e montado por Daniel Rezende, dividiu opiniões, sendo considerado politicamente caricato por alguns, e dialeticamente enriquecedor por outros. O desempenho de Daniel Brühl é uma das poucas unanimidades entre os elogios conquistados por esta produção anglo-americana de custo estimado em US$ 3,9 milhões, assim como a habilidade do cineasta para criar tensão em cenas de ação.

Na entrevista a seguir, o diretor do fenômeno Tropa de Elite (2007) fala sobre o retrato do terror e sobre a posição do Primeiro Ministro de Israel, Yitzhak Rabin (papel dado a Lior Ashkenazi), no conflito dos anos 1970, além da prisão do ex-presidente Lula e sobre o futuro do Brasil nas eleições.

Omelete: De maneiras narrativas tão distintas no tempo, mas próximas pela polêmica, como O Mecanismo e 7 Dias em Entebbe afiaram o teu olhar para construir tensão e cenas de ação? Você identifica mais alguma convergência entre esses dois novos pontos de sua obra?
José Padilha: Não vejo semelhança entre os assuntos de O Mecanismo e Sete Dias em Entebbe. E, na verdade, nenhuma das duas narrativas inclui muitas cenas de ação. Embora Entebbe termine em uma sequência assim, ele é a única do filme.

O que 7 Dias em Entebbe te iluminou acerca do conflito Israel x Palestina e acerca do papel histórico de Rabin e de Shimon Perez?
Para mim, a questão crucial é a limitação que a política interna de Israel e também a da Palestina impõem no que tange as possibilidades de negociação em busca de algum acordo de paz. Mesmo em uma situação tão dramática quanto a de Entebbe, tanto Rabin quanto Pérez tinham que levar em conta o fato de que a maioria da população se opunha a negociações com os palestinos. Esse mesmo fenômeno levou ao assassinato de Rabin durante Oslo e a incapacidade de Arafat de negociar com Ehud Barack em Camp David.

Como foi idealizada a utilização do corpo de baile no filme e o que aquela coreografia aponta sobre o conflito histórico de 1976?
A coreografia é famosa e mostra bailarinos se despindo de trajes ortodoxos enquanto realizam movimentos que remetem ao autoflagelo. O único bailarino que não se despe de sua ortodoxia cai continuamente da cadeira em que dança...

O quanto a recepção agressiva a O Mecanismo por uma certa ala da imprensa e de outros formadores de opinião pode tonar áspero o terreno para a estreia de 7 Dias em Entebbe? O que você tira, de positivo e de negativo, acerca dessa saraivada de ataques?
Do mesmo jeito que a acusação de fascismo relativa ao Tropa 1 não tornou áspera a estreia de Tropa 2, não creio que críticas a O Mecanismo atrapalhem Entebbe.

O que Lula representa para você neste atual momento do Brasil e o quanto o personagem do Arthur Kohl pode ser entendido como um reflexo (ou não) dela?
Lula, até onde consigo enxergar, prometeu governar de forma honesta e se opor a corrupção. Fez isto repetidas vezes, em palanques e no governo. Fez isso depois que o esquema do mensalão foi exposto e José Dirceu foi preso. E, no entanto, associou-se ao PMBD de [Michel] Temer, [Sérgio] Cabral e cia, e operou junto com eles e com as grandes empreiteiras, uma gigantesca rede de corrupção chamada de Petrolão. Isto é inegável. A polarização no entorno da prisão de Lula é reveladora, portanto. E nos diz com clareza que parte da esquerda brasileira está pronta a defender alguém que operou o crime organizado e que faz isto por razões ideológicas ou em nome de políticas públicas que Lula defende. O caso de Lula tem, portanto, valor heurístico. Mostra ao eleitor quem relativiza a lei por razões ideológicas ou programáticas. Ora, colocar no poder alguém que relativiza a lei é um risco, um possível passo na direção da servidão. Afinal, se a lei pode ser relativizada para aliviar esquemas de corrupção, pode também ser relativizada para calar a imprensa e para cercear liberdades democráticas, caso da Venezuela. Sobre o qual, diga-se de passagem, a mesma esquerda a que me refiro se cala de forma escandalosa.

O quanto o cinema político de Costa-Gavras, diretor franco-grego famoso por filmes como Z (1969), pesa como influência na confecção de um longa-metragem como 7 Dias em Entebbe? Você usa que referenciais estéticos num filme como esse?
Adoro Costa-Gravas. Seu cinema sempre me inspirou, mas não de forma consciente. De forma que se alguma semelhança estética houver, fica na conta do fato de ter visto seus filmes várias vezes.

Como fica a vida pós O Mecanismo e pós Entebbe? O que você prepara agora?
Vida que segue. Lendo roteiros e buscando histórias interessantes para contar.

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