Jungle Cruise | Brasil do filme com The Rock tem Plano Real já em 1900

Créditos da imagem: Disney/Divulgação

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Jungle Cruise | Brasil do filme com The Rock tem Plano Real já em 1900

Nova aventura da Disney retrata parte brasileira da Amazônia entre erros e acertos

30.07.2021, às 08H00.
Atualizada em 04.08.2021, ÀS 07H09

Jungle Cruise traz o astro Dwayne "The Rock" Johnson mais uma vez para terras brasileiras. Depois de chutar bundas na Amazônia em Bem-Vindo à Selva (2003) e sair na mão com Vin Diesel na Cidade Maravilhosa em Velozes e Furiosos 5: Operação Rio, o grandalhão de ascendência samoana retorna ao "pulmão do mundo" na mais nova adaptação cinematográfica de um brinquedo dos parques da Disney. Ao lado de Emily Blunt e Jack Whitehall, Rock zarpa no barco-título de Porto Velho (RO) rumo ao coração da floresta amazônica. Antes disso, entretanto, ele atravessa um curioso panteão de escolhas bizarras na caracterização do Brasil.

Nada é tão gritante quanto a cena de Missão Madrinha de Casamento (2011) em que Kristen Wiig, Rose Byrne, Melissa McCarthy e o resto do elenco saboreiam um "churrasco brasileño" ao som de cúmbia, mas por mais que Jungle Cruise acerte mais que a média quando usa o português e não o espanhol como nossa língua predominante, o filme tem sua boa dose de erros na hora de retratar outras características da identidade cultural brasileira. Começando pelo uso de Real ao invés de Réis, enquanto moeda-corrente no início do século XX. Mesmo que tenha sido apenas um erro de plural (afinal, o singular de réis é a moeda portuguesa real), faltou pesquisar e entender que ninguém no país falava assim. A impressão que fica é que Itamar Franco já presidia o Brasil, à época.

Depois, há uma questão visual na representação de Porto Velho. No principal bar do cais onde o tal Cruzeiro da Floresta de The Rock fica aportado, é possível ver uma decoração que mistura referências de faroeste bem spaghetti, objetos de cena genéricos que remetem ao clichê da identidade cultural latina (uma só, quando na realidade ela engloba várias) e iconografia mexicana. Um quadro em particular não faz o menor sentido: mostra um mariachi. A Disney sabe que o México fica no "continente" deles e não no nosso, né?

Disney/Divulgação

Só que nada é mais idiossincrático do que o personagem de Paul Giamatti, um suposto alívio cômico que nunca parece se encaixar no filme em que está. O nome dele é Nilo Nemolato, o que junto com seu sotaque falando inglês indica que seja italiano. Ao mesmo tempo, porém, tudo que ele fala com os moradores da região é em espanhol, só que ele é um homem de negócios poderoso e já muito bem estabelecido em Porto Velho; como e por que ainda erra a língua do lugar onde mora? Giamatti é um grande ator, claro, mas cabia muito um artista brasileiro no papel. Ou, talvez, que o deixassem falar italiano ao invés de derrapar no portunhol. A bagunça, segundo o próprio, é reflexo da falta de preocupação da Disney: "Não havia um personagem. Eles só disseram venha e faça algo funcionar", explicou.

Brasil de mentirinha

Como confirmou o ator Édgar Ramirez, em conversa com o Omelete, nada de Jungle Cruise foi filmado no Brasil. Tudo visto no filme foi captado ou em locações no Havaí, ou em estúdios da Disney, em Atlanta (EUA). Com a produção fora do país, é lógico que encontrar talentos brasileiros para deixar a representação de Porto Velho mais crível fica difícil — especialmente quando só nós iremos identificar a maior parte dos erros. É por isso que Velozes e Furiosos 5: Operação Rio ainda sai na dianteira no quesito representação brasileira em Hollywood (ao lado, talvez, da abertura de O Incrível Hulk, de 2008): teve cenas realmente filmadas aqui.

Columbia TriStar Film Distributors International/Divulgação

Bem-Vindo à Selva, por outro lado, conseguiu equilibrar bem o cuidado com alguns detalhes e os erros provocados pela distância da produção. Em 2002, o diretor Peter Berg e o produtor Kevin Misher vieram até o Brasil para buscar locações, mas desistiram da missão depois de serem assaltados à mão armada. Com as filmagens relocadas para o Havaí, eles usaram a vinda até aqui para levar boas referências que fazem com que o filme, mesmo tendo sido lançado há 18 anos, ainda tenha um dos retratos mais divertidos do nosso país no cinema-pipoca: há samba, pessoas falando (e xingando) em português e fetichização de tênis da Nike. Só Rosario Dawson fingindo ser brasileira que não chega a ser um "Joga Bonito" da produção.

Mas e aí, no que Jungle Cruise acerta?

Acerta em não forçar tanto a ideia que o Brasil é uma terra exótica e misteriosa cheia de riquezas a serem exploradas, que flerta com o pensamento por trás da prática colonialista que nos trouxe graves problemas estruturais. Focando mais no humor e escapismo, o filme consegue contornar esse lugar-comum de histórias de aventuras na floresta e te distrair para outras questões. A forma como coloca a participação indígena também ajuda, já que mesmo quando parece que vai incindir em algo extremamente ofensivo, isso acaba apropriado pela história, de forma a subverter a pior das expectativas.

Há um acerto, também, no esforço de Dwayne "The Rock" Johnson e Emily Blunt falarem português. É divertido ouvr o grandalhão gritar um "abra a janela" aqui, ou ver o esforço da britânica para conseguir tirar o som certo ao falar "Porto Velho". Há até uma cena consideravelmente longa em que Rock fala alguma das línguas originárias do tronco tupi, embora a exatidão dessa representação nativa brasileira me escape. Ainda assim, é legal ver certo cuidado com uma parte tão importante da nossa identidade que, até mesmo dentro do país, é costumeiramente menosprezada.

Outro acerto histórico está no conflito central do filme, que gira em torno de uma expedição espanhola ao coração da Amazônia em busca de uma mítica árvore sagrada. Embora lendas como essa não sejam necessariamente o que consta em livros didáticos, essas invasões por povos colonizadores são parte da história da região amazônica desde o século XVI. Só não espere uma seriedade documental em como o filme da Disney retrata isso, claro.

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