Em poucas franquias hoje a cultura do fã e do consumo adquirem uma aura tão benévola quanto em Kung Fu Panda. O terceiro longa da mais bem sucedida série da DreamWorks Animation segue a receita dos filmes anteriores - que misturam filosofia zen com referências do cinema de artes marciais, embalados num visual arrebatador - e aposta mais no colecionismo.
Porque ao mesmo tempo em que seguimos o crescimento espiritual de Po (que depois de ter se tornado um mestre do kung fu agora precisa dominar o poder do chi), num aprendizado que vai ficando cada vez mais ligeiro a cada filme, o panda nunca deixa de ser o representante do espectador em cena, o fã fascinado com seus ídolos, fascínio esse que se realiza no consumo.
Em resumo, Kung Fu Panda 3 é o confronto entre um fã "do bem", Po, com suas piadinhas metalinguísticas de cinéfilo (a entrada triunfal, a saída dramática), e um fã predatório, o touro Kai, o ex-companheiro de Oogway que retorna ao mundo dos vivos depois de tomar a alma dos velhos mestres do kung fu (que Kai transforma em pedras e coleciona numa corrente). Ao contrário de Kai, o máximo que Po se permite, enquanto fã, é brincar por algumas horas com as armas e armaduras sagradas do templo.
Ao mesmo tempo em que fica difícil imaginar algo mais fofo do que ver panda pai e panda filho se divertindo juntos com seus brinquedos, e a questão do colecionismo volta sempre como piada na figura da Tigresa de miniatura, Kung Fu Panda 3 faz do consumo rápido também seu meio narrativo. Da trilogia, é o longa mais cheio de montagens pra dinamizar a trama (sempre apresentadas em estilizações de encher os olhos), o que passa a impressão de que as lições de Po vão ficando mesmo mais fáceis com os anos.
Em relação a essas narrativas compactas com poucos tempos fracos, Kung Fu Panda 3 ainda está longe de ser uma overdose de açúcar como os filmes de Madagascar, mas se há algo em comum entre as animações da DreamWorks é a capacidade de criar filmes incessantes sem que eles pareçam apressados demais. A cultura nerd também não é uma exclusividade de Kung Fu Panda; vem à mente o sucesso do primeiro Vingadores, o filme definidor dessa tendência, com seus heróis transformados em action figures reais aos olhos do fã Coulson, com seus cards do Capitão América.
O que Kung Fu Panda tem de particular, sim, e que até hoje continua sendo seu maior triunfo, seu ying-yang, é a incrível capacidade de conciliar os esoterismos de desapego do Oriente com essa incontornável religião do Ocidente que é o capitalismo.
Ano: 2016
País: EUA
Classificação: LIVRE
Duração: 0 min