Better Man - A História de Robbie Williams pegou todo mundo desprevinido. Pudera: dentro de um cenário no qual todos os anos temos uma chuva de cineiografias bastante previsíveis, venham elas no formato de Back to Black ou Um Completo Desconhecido, o filme sobre o popstar britânico é um bálsamo de criatividade.
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Além da escolha genial de substituir o protagonista por um macaco de CGI, Better Man pulsa com um pendor à fantasia e ao espetáculo que falta muito às biopics musicais que optam por um caminho mais tradicional. Nesse pique, o Omelete resolveu selecionar outros 10 filmes (ou talvez sejam 12...) que quebram essa cartilha não-oficial de Hollywood. Confira abaixo a lista!
Experimenter
Onde ver: Disponível para streaming no Prime Video.
Stanley Milgram é um dos psicólogos mais proeminentes na cultura pop deste lado de Sigmund Freud. É também um dos mais controversos - o legado de seus experimentos sociais, que recrutavam pessoas comuns e as colocavam em situações frequentemente extremas, é estudado intensamente até hoje, mas também levanta questões de ética que chegam a obscurecer seus resultados. Em Experimenter, no entanto, o diretor e roteirista Michael Almereyda ataca este legado somente de forma perpendicular. Ele está mais interessado em criar um filme que desmonte os seus cenários da mesma forma que Milgram buscava desmontar a sociedade ao seu redor, e que explore as consequências pessoais dessa visão de mundo. Com excelentes performances de Peter Sarsgaard (um ator frequentemente subutilizado) e Winona Ryder, é um filme que merece ser mais visto. - Caio Coletti
Steve Jobs
Onde ver: Disponível para aluguel e compra no Prime Video e Apple TV.
É um equívoco achar que você precisa contar a vida toda de uma pessoa, do seu nascimento até a morte, para entendê-la. Às vezes é mais interessante observá-la em momentos cruciais, onde a pressão e os riscos revelam sua verdadeira face. Numa estrutura que devia ser mais copiada, Aaron Sorkin escreve três momentos da vida de Steve Jobs – três períodos de 45 minutos antes do fundador da Apple apresentar um produto em suas lendárias conferências – e com a ajuda de Danny Boyle e Michael Fassbender, encontra nesse ritmo rápido tudo que precisa dizer sobre um dos homens mais importantes da tecnologia: seu carisma, sua ambição, sua arrogância, seu egoísmo. - Guilherme Jacobs
Jackie, Spencer e Maria Callas
Onde ver: Jackie e Maria Callas disponíveis para aluguel e compra no Prime Video; Spencer disponível para streaming no Prime Video e Max.
Na falta de uma, Pablo Larraín fez três ótimas cinebiografias que fogem do convencional. O cineasta chileno começou, com Jackie (2016), um ciclo de biopics sobre mulheres emblemáticas dos círculos de poder e da cultura pop no século XX. O mais bacana dos filmes de Larraín - além do filme estrelado por Natalie Portman, que aborda a vida de Jackie Kennedy, ele fez Spencer (2021) sobre a Princesa Diana, com Kristen Stewart; e Maria Callas (2024) sobre a diva da ópera, com Angelina Jolie - é que eles se aproveitam integralmente das possibilidades sensoriais do cinema. Seus textos são sobre as performances que exigimos das mulheres que vivem sob os holofotes; e sobre as narrativas de gênero que entrelaçamos com a vida real, porque somos bombardeados por elas o tempo todo nas nossas telas. Mas os filmes traduzem isso em climas, em ritmos, em imagens fraturadas e manipuladas com sons e lentes - um banquete cinematográfico, além de uma aula de história. - Caio Coletti
Vidas ao Vento
Onde ver: Disponível para streaming na Netflix.
A devastadora perda da beleza. Aviões que vão pra guerra e nunca voltam, criações transformadas em armas. Amores eternos enquanto duram, levados por uma doença infeliz. Um terremoto. Um incêndio. Um vendaval. A maldição de ser sonhador em tempo de guerra. De precisar criar sabendo que, como um filme deixando o estúdio para viver na mente da audiência, a arte eventualmente deixa de ser sua. E no meio desse vento que se ergue, nossa tentativa de viver. Nossa insistência em amar, sonhar e fazer arte. Vidas ao Vento, teoricamente, é sobre Jiro Horikoshi – o inventor do Zero, caça usado em ataques kamikazes pelos japoneses na Segunda Guerra Mundial. Na prática, porém, ele é sobre Hayao Miyazaki e qualquer um que cria arte que, um dia, sai de seu controle. - Guilherme Jacobs
Maria Antonieta
Onde ver: Disponível para aluguel e compra no Prime Video e Apple TV.
Ninguém além de Sofia Coppola poderia ter transformado a vida de Maria Antonieta, a muito odiada rainha da França na época da Revolução - mais famosa por sua expressão de desdém quando soube que seus súditos passavam fome nas ruas -, em um romance adolescente explodindo em hormônios, iconografia rock n’ roll e subtons feministas. Se, em Priscilla (em muitos sentidos, um filme superior), Coppola escolheu o drama para virar a mesa do retrato histórico de uma mulher famosa, aqui ela aposta de certa forma na comédia. Não que Maria Antonieta deixe o pathos da vida da rainha para trás - ela acabou, afinal, na guilhotina aos 37 anos -, mas o filme emerge mesmo é como uma brincadeira conceitual, um exercício de entender o passado pelos olhos da contemporaneidade, e balizar a imagem pop de uma figura com sua realidade. É um jogo divertido à beça. - Caio Coletti
Corsage
Onde ver: Disponível para streaming no Reserva Imovision e no Telecine.
A Imperatriz Elisabeth da Áustria, mais conhecida apenas como Sisi, é uma figura contraditória no imaginário de seu pais: adorada por milhões, ela viveu uma vida enclausurada e sem nenhum poder verdadeiro, sob a sombra de um rei ilegítimo que se casou com ela pelo trono. A cineasta Marie Kreutzer extrapola essa vivência em um filme sufocante, trágico e apropriadamente decadente - sem fazer questão de vestir os seus cenários aristocráticos, há muito abandonados, com cortinas ou tapetes novos, Corsage se torna uma contradição ambulante. Adicione nessa receita a fúria irrestrita que a ótima Vicky Krieps, e você tem um filme pelo qual é impossível passar incólume. - Caio Coletti
Mishima: Uma Vida em Quatro Tempos
Onde ver: Disponível para streaming na MUBI.
A maior parte deste filme sobre o autor Yukio Mishima é ficção, dramatizando cenas de seus livros para encontrar algum entendimento sobre o homem e seu destino trágico em 25 de novembro de 1970. Os ecos do criador na criação. Ali, encontramos prisões e isolamento, desejos e corpos, atores e máscaras, sacrifício e sangue. Paul Schrader encena as criações de Mishima de forma teatral, para as vermos como artes, mundos imaginados, mas também como devaneios: revelações e extensões da mente que os imaginou. Como um grande filme, claro, Mishima transborda para refletir seu próprio diretor. - Guilherme Jacobs
As Vidas de Glória
Onde ver: Disponível para compra no Apple TV.
Figura emblemática do feminismo estadunidense na segunda metade do século XX, a jornalista e ativista Gloria Steinem ganhou uma cinebiografia apropriadamente multifacetada - com quatro atrizes diferentes interpretando-a em fases diferentes da vida, o longa de Julie Taymor (que também fez Frida, uma cinebiografia só um pouco mais convencional do que essa) pode cair por vezes na babação de ovo chapa branca das “biopics autorizadas”. No entanto, o filme também preserva muito da energia inovadora de sua cineasta, que lança mão de quebras de continuidade, interlúdios teatrais e interações impossíveis entre seus personagens para pintar um retrato vívido do movimento para o qual Steinem serviu de centro nervoso. - Caio Coletti
Não Estou Lá
Onde ver: Disponível para streaming no Belas à la Carte, PlutoTV e Run:Time.
Um dos erros de biopics tradicionais é simplificar demais a pessoa cuja vida está ali dramatizada. Este problema é ainda mais danoso quando se fala de alguém que é tão definido por suas contradições quanto pelos mistérios à sua volta, como Bob Dylan. A solução de Todd Haynes foi literalizar, ainda que poeticamente, suas muitas vidas. No filme, uma peça ousada de conceitualização Dylan é representado por seis rostos – a versão mais próxima da realidade é interpretada por uma magnética Cate Blanchett, mas outras facetas têm outros rostos. Para sua espiritualidade, Christian Bale faz um pastor, enquanto a criatividade é refletida por Ben Whishaw como um poeta. Para a celebridade, Heath Ledger faz um astro do cinema. Para a mitologia, Richard Gere faz um fora da lei vindo do oeste. Para as origens, um jovem Marcus Carl Franklin interpreta um prodígio musical chamado Woody Guthrie. O resultado, ainda que irregular, parece oferecer uma pintura mais completa do cantor. - Guilherme Jacobs
Domino - A Caçadora de Recompensas
Onde ver: Disponível somente em mídia física.
Talvez o último grande filme do saudoso Tony Scott, Domino - A Caçadora de Recompensas é uma explosão de estilo que sintoniza a vibração muito específica de sua biografada, ela mesma dona de uma história de vida improvável. Domino Harvey (vivida aqui por Keira Knightley) era filha da realeza hollywoodiana - seu pai, Laurence Harvey, foi indicado ao Oscar por Almas em Leilão - que flutuou de um emprego sem futuro a outro antes de aterrisar no mundo perigoso dos caçadores de recompensas. Scott, é claro, transforma essa premissa em um filme de ação supersaturado, cheio de poluição visual e sonora, que encarna muito do que Hollywood gosta de varrer para baixo do tapete quando conta uma história tão violenta assim. Foi o último grande ato de rebeldia de um dos maiores subversores do cinema estadunidense. - Caio Coletti
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