Em 2008, o autor britânico Patrick Ness lançava Mundo em Caos (ou The Knife of Never Letting Go), primeiro volume de sua saga distópica sobre um mundo futurista repleto de manipulação e falta de privacidade. Agora, após 12 anos, a trama ganha as telonas com uma adaptação estrelada por Tom Holland (Homem-Aranha) e Daisy Ridley (Star Wars). Além de receber exclusivamente o primeiro trailer (veja acima) pela Paris Filmes, o Omelete conversou com Ness para entender como é ver sua obra se tornando um verdadeiro blockbuster.
Ambientada em um futuro próximo pós-apocalíptico, a saga mostra um mundo em que todas as mulheres desaparecem, e os homens são atingidos por uma infecção chamada de O Ruído, capaz de expor por completo todos os seus pensamentos. A trama de Mundo em Caos acompanha Todd Hewitt (Tom Holland), um garoto que descobre uma nave caída nas florestas e encontra Viola (Daisy Ridley) - a primeira mulher com quem tem contato na vida. Com ela correndo perigo em um planeta perigoso, Todd jura protegê-la, partindo em uma jornada para explorar os vários segredos sombrios de sua história.
A premissa é bastante forte ao tratar da falta de privacidade e individualidade causada pelo Ruído. Quando Patrick Ness escreveu o romance, em 2008, a noção já parecia perigosa. Mas hoje em dia, com a humanidade 24 horas por dia conectada, em constante compartilhamento e exposição nas redes sociais, há tons ainda mais certeiros. “Não posso dizer que previ alguma coisa. Os livros começaram exatamente com uma preocupação, ou uma indagação, sobre redes sociais e os efeitos do compartilhamento excessivo”, diz o autor. “Nos romances e no filme, essa questão é levada adiante: e se você não tivesse escolha, a não ser compartilhar tudo? O que isso significa para a sua autopercepção, e como se cresce assim? Se você não tem os momentos em particular para cometer erros, e tudo está em exposição, como isso te afeta?”.
“Não tenho uma resposta”, continua Ness. “Só queria explorar como os jovens de hoje em dia, com toda a informação que têm, crescem, aprendem e se tornam adultos. Isso é o que realmente me interessa. Desde que escrevi o livro, essa questão só se tornou mais pertinente porque temos uma nova rede social atrás da outra, elas não param de chegar. Lá atrás - só há dez anos - havia apenas Facebook e Twitter. Agora temos Instagram, TikTok e haverá algo novo amanhã. Então, é um questionamento cada vez mais relevante.”
O estúdio Lionsgate inicialmente adquiriu os direitos dos livros lá em 2011 e, entre várias versões, enfim rodou a atual sob o comando de Doug Liman (No Limite do Amanhã, A Identidade Bourne) em 2017. Nos últimos três anos, Mundo em Caos teve refilmagens, pós-produção e, claro, um adiamento por conta da pandemia do coronavírus. Mas, seja como for, o filme enfim está pronto. “É fantástico finalmente vê-lo pronto”, fala sobre a longa história do projeto. “Há muitos fãs animados, então vai ser um momento incrível!”.
Entre Mídias
O caso do longa é um pouco inusitado quando se trata de adaptações, visto que Patrick Ness, o autor do material-base, também é roteirista do filme, ao lado de Christopher Ford (Homem-Aranha: De Volta ao Lar). Segundo ele, adaptar o próprio trabalho é algo bastante complicado: “O mais difícil é saber o que cortar”, diz aos risos. “Um filme é algo completamente diferente de um livro, tem outras necessidades e cumpre outros propósitos. É preciso aprender a abrir mão de algumas coisas e adicionar outras. Quando o material-base é de outra pessoa, que eu já tive a função de adaptar, é muito mais fácil de cortar coisas. Quando se é o autor, é preciso aprender a ‘matar seus queridinhos’, como diz aquela frase de William Faulkner. É o processo de entender que um filme precisa de elementos diferentes para ser bom, e então partir na busca desses elementos incríveis.”
Como cita brevemente, Ness têm experiência no processo de adaptação. Na verdade, é versado nas principais áreas do entretenimento. Além de livros, Patrick Ness já escreveu roteiros de cinema, como Sete Minutos Depois da Meia-Noite (2016), e também foi showrunner de Class (2016), série de TV derivada de Doctor Who. “Tudo é narrativa”, diz, sobre trabalhar nesses três meios. “Livros são bastante solitários. Eu passo um ano inteiro sozinho, escrevendo. Já filmes são muito colaborativos, pois há muita gente trazendo coisas tão diferentes das minhas. Tento levar meu melhor para a produção de um filme, e aí essas outras pessoas também dão seu melhor, e juntos criamos algo melhor que todos nós juntos.”
Para Ness, que criou Class durante a sua única temporada de oito episódios, a televisão é como um meio termo entre os livros e os filmes. “A TV é um ótimo meio para escritores, na verdade. Você tem muito mais tempo para contar uma história, mas é tão colaborativa quanto o cinema, já que é preciso pensar como dividir a trama, como servir os atores, e como eles estão te servindo”, afirma. “São meios bastante diferentes mas, em essência, é tudo narrativa. Apenas formas diferentes de fazê-la.”
Além dos créditos de Ness e da saga bem estabelecida nos livros, algo que chama bastante atenção é o elenco de peso. Tom Holland e Daisy Ridley lideram uma lista que ainda conta com Mads Mikkelsen (Hannibal), Cynthia Erivo (The Outsider), David Oyelowo (Selma) e Nick Jonas (Jumanji). “É engraçado que os fãs na internet acham que os autores são os responsáveis pela escalação do elenco”, diz o autor, aos risos. “Mas realmente não sou. Você mira lá em cima e, de vez em quando, dá sorte de receber alguém bom, e fomos muito sortudos aqui. Sério, o resultado final é incrível, eu continuo me beliscando aqui. Eu adoraria dizer que foi tudo minha ideia, mas foi o estúdio, o diretor e os roteiristas. Me sinto um autor bastante sortudo”, celebra.
Mundo em Caos chega aos cinemas em 2021.