David Fincher recentemente declarou seu total desinteresse em realizar uma sequência para Se7en - Os Sete Pecados Capitais. "Tenho mais interesse em ter cigarros sendo apagados em meus olhos", comentou na ocasião. O cineasta é categórico: "Eu vivo tentando sair de baixo de minha própria sombra. Eu não quero fazer a mesma porcaria de novo e de novo".
O Curioso Caso de Benjamin Button (The Curious Case of Benjamin Button, 2008) é a mais nova tentativa do diretor nesse sentido. E não poderia ser mais bem-sucedida e distinta de toda a sua brilhante cinematografia. Trata-se de uma fábula, levemente baseada no conto de F. Scott Fitzgerald (1896-1940), escrito em 1922, sobre um sujeito "nascido em circunstâncias incomuns". Benjamin Button nasce velho, às portas da morte e doente. No entanto, do lado oposto da citada "porta"... afinal, a cada minuto ele rejuvenesce, numa dramática inversão do ciclo da vida.
O Curioso Caso de Benjamin Button
O Curioso Caso de Benjamin Button
O Curioso Caso de Benjamin Button
No início o filme assombra pelos efeitos. É inacreditável ver o bebê/velho, abandonado na escada de um asilo, com o rosto enrugado de Brad Pitt. Leva algum tempo para que essa sensação de estranheza se dissipe, mas o ritmo pacato e centrado do primeiro ato é focado nesse sentido. Conforme Benjamin torna-se capaz de sentar-se, começa a balbuciar suas primeiras palavras, levanta-se com o auxílio de muletas, vamos nos acostumando com o corpo senil do astro de Hollywood, criado através de computação gráfica e efeitos práticos de maquiagem. Enfim, quando Benjamin está pronto para explorar o mundo lá fora estamos mais que prontos a acompanhá-lo.
Nesse ponto, O Curioso Caso deveria mudar seu título para O Fascinante Caso... antes de tornar-se O Poético Caso de Benjamin Button. Sim, pois a premissa estranha dá lugar a uma meditação sobre a mortalidade, a passagem do tempo (e dos tempos) e o amor, em uma bem amarrada sucessão de eventos históricos vividos pelo protagonista.
A estrutura lembra bastante Forrest Gump - e não é por acaso: o roteiro é de Eric Roth, o mesmo escritor do premiado filme estrelado por Tom Hanks e divide com o longa anterior o mesmo delicado equilíbrio entre drama, humor e aventura, ainda que Fincher tenha um estilo mais maduro que o de Robert Zemeckis e seja mais esteta e meticuloso que o colega, buscando emoções e atmosferas distintas em cada segmento registrado, como a Segunda Guerra Mundial, o movimento beatnick ou a Nova Orleans pré-Katrina.
Não falta aqui também um relacionamento impossível, como o de Forrest e Jenny. Benjamin "cresceu" ao lado da menina Daisy, que ele encontra nas férias quando a garota vai visitar a avó no asilo. A diferença de idade aparente, porém, os afasta. Até que eles se encontram anos depois - ela 20 anos mais velha, ele 20 anos mais moço. Aliás, a cena em que Cate Blanchett, que vive Daisy, ao pé da escada, reconhece o amigo, é uma das mais emocionantes do filme. O casal protagonista está perfeito, bem como o excepcional elenco de apoio que inclui Tilda Swinton, Taraji P. Henson, Jason Flemyng e Jared Harris.
Não dá para deixar de exaltar também a deslumbrante direção de fotografia de Claudio Miranda, a direção de arte de Donald Graham Burt ou a trilha de Alexandre Desplat. Fincher soube cercar-se como nunca de talentos para realizar sua mais poética obra, uma que - como se ele já não estivesse - o arranca debaixo de sua sombra e o coloca sob as mais brilhantes luzes da sétima arte.
Ano: 2008
País: EUA
Classificação: 12 anos
Duração: 159 min
Direção: David Fincher
Elenco: Cate Blanchett, Brad Pitt, Tilda Swinton, Elle Fanning, Jason Flemyng, Elias Koteas, Julia Ormond, Taraji P. Henson, Bianca Chiminello, Josh Stewart, Faune A. Chambers, Donna DuPlantier, Jacob Tolano, Earl Maddox, Ed Metzger, Danny Vinson, David Jensen, Joeanna Sayler, Mahershalalhashbaz Ali, Phyllis Somerville