Tantas vezes Nova York já foi destruída no cinema, é sempre aquela correria, e em O Espetacular Homem-Aranha 2: A Ameaça de Electro deve ser a primeira vez que os novaiorquinos param para assistir. Nos duelos entre Aranha e Electro ou entre Aranha e Rino, já tem até as grades na calçada prontas para separar a plateia da ação.
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É evidente que tudo se volta para o espetáculo num filme desses - o próprio nome já diz - mas a tendência dos roteiros de Alex Kurtzman e Roberto Orci é sempre lidar com o espetaculoso e não necessariamente com o espetacular. A dupla pensa a trama, a ação, as viradas do roteiro por seu potencial de impacto e de retenção da atenção do espectador, e não seu potencial narrativo; é assim nos roteiros de Além da Escuridão - Star Trek, Transformers e neste novo Homem-Aranha também.
Impacto não falta em O Espetacular Homem-Aranha 2, na forma de revelações (segredos do passado, do presente) e de expectativas (em torno do destino de alguns personagens, em torno da formação do Sexteto Sinistro). Vilões fazem fila para manter a ação em marcha, um de cada vez, enquanto crises e tragédias são dispostas ao longo da trama de forma mecanizada (o adeus aos pais, o vilão prestes a morrer, a donzela na iminência do perigo). Tudo parece grave e urgente nos filmes de Orci e Kurtzman, mas só na superfície e só por um instante: urgências se resolvem num passo, para dar lugar a urgências novas.
Aqui, o que temos é um produto com visível vocação para o descompromisso (o visual colorido em computação gráfica e a trilha de Hans Zimmer lembram desenho animado, e o ator Andrew Garfield foi certeiro ao comparar a ação deste filme a um desenho do Pernalonga) e para espelhar a geração dos millennials (o perfil hipster de Garfield, os diálogos irônicos e autorreferentes entre Peter e Gwen). Então quando Orci e Kurtzman tentam injetar gravidade no espaço curto entre uma cena descompromissada e um diálogo irônico, tudo acaba soando mais artificial, mais posado.
Essa incapacidade de encontrar um tom para o filme vem acompanhada de omissão no trato do herói. O Peter Parker dos quadrinhos é uma clássica figura da Jornada do Herói organizada por Joseph Campbell, capaz de aprender com seus erros, levantar-se de novo e tornar-se um herói melhor; neste filme, o erro só acontece perto do desfecho e não leva à lição, e sim a uma fuga. O Peter dos dois O Espetacular Homem-Aranha vive de luto mas não parece crescer com a perda.
Justiça seja feita aos dois roteiristas, desde o filme anterior - cuja trama de conspiração envolvendo os pais de Peter é elucidada na continuação - já tínhamos um herói tratado com mimos, sob falsos dilemas. Esse é um legado de paternalismo deixado por Harry Potter no cinema de fantasia e aventura: protagonistas protegidos por um heroísmo hereditário (aqui Richard Parker literalmente diz ao filho que ele é "especial"), com coadjuvantes funcionais que resolvem boa parte das buchas (a tia e o pai que explicam a charada, a secretária da Oscorp que sabe mais que o filho do dono).
A certa altura, uma personagem diz que só ela é capaz de resetar um sistema, e por esse motivo, ela, a personagem, seria de fundamental importância na cena. Mas daí surge na tela a alavanca escrita "Master Reset", e o espectador pode acordar para a realidade: qualquer pessoa é capaz de ver e acionar a maldita alavanca! Essa cena sintetiza o falso senso de gravidade em que Orci e Kurtzman envolvem seus personagens, sempre fadados a pensar, diante da torcida, que são astros de um grande espetáculo.
O Espetacular Homem-Aranha 2: A Ameaça de Electro | Cinemas e horários
Ano: 2014
País: EUA
Classificação: 12 anos
Duração: 142 min
Direção: Marc Webb
Roteiro: Alex Kurtzman, Roberto Orci, Jeff Pinkner
Elenco: Andrew Garfield, Emma Stone, Jamie Foxx, Dane DeHaan, Colm Feore, Felicity Jones, Paul Giamatti, Sally Field, Embeth Davidtz, Campbell Scott, Marton Csokas, Louis Cancelmi, Max Charles, B.J. Novak, Sarah Gadon, Stan Lee, Chris Cooper, Frank Deal, Denis Leary, Martin Sheen, Chris Zylka, B. J. Novak