Quero Matar Meu Chefe (Horrible Bosses, 2011) é tão ciente de suas intenções que fica até difícil criticá-lo. A comédia tem uma estrutura tão reconhecível que suas próprias referências viram piada autorreferente. A trama, afinal, pega a ideia original de Alfred Hitchcock de troca de alvos de assassinato (do clássico Pacto Sinistro, de 1951), e a aproveita como comédia, sem esquecer, elegantemente, que Jogue a Mamãe do Trem já havia feito isso em 1987.
Quero Matar Meu Chefe
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Ao citar suas inspirações, o filme assume que não vai levar para casa o prêmio de originalidade e deixa claro ao espectador que ele não sairá do cinema impactado pela criatividade do roteiro. Como condenar algo tão honesto, portanto?
Sem o peso dessa expectativa por inovação, sobra ao texto espaço para o que os roteiristas e o elenco sabem fazer melhor: piadas. E elas vêm em ondas motivadas pelo ambiente. No bar frequentado por negros, discutem-se estereótipos; no apartamento do cocainômano, o tom é de comédia de chapados; no consultório da dentista fogosa, é o sexo que faz rir... e por aí vai.
Os roteiristas estreantes no cinema John Francis Daley, Jonathan M. Goldstein e Michael Markowitz, conhecidos como atores ou escritores de seriados menores de TV, conseguem emplacar também uma das mais engraçadas e difíceis formas de humor... a piada recorrente, algo que o diretor Seth Gordon soube aproveitar muito bem (nem parece o mesmo sujeito de Surpresas do Amor). O timing da edição é perfeito (nas piadas do gato) e a direção de (descontrolados) atores é excelente quando os protagonistas disparam os diálogos com o Ferra-Mãe Jones (Jamie Foxx).
De seu lado, o trio condutor da trama, formado por Jason Bateman, Charlie Day e Jason Sudeikis, está afiadíssimo como os três subordinados frustrados profissionalmente que decidem que a única solução para suas vidas é matar seus chefes, vividos por Colin Farrell, Jennifer Aniston e Kevin Spacey (excelentes como o idiota, a tarada e o psicopata). Bateman e Sudeikis agem em sua zona de conforto, com a paspalhice esperada e treinada em tantos filmes. Cabe assim a Day, em seu primeiro papel principal fora da série It's Always Sunny in Philadelphia, a tarefa de surpreender. E ele o faz em conjunto com os demais ou sozinho (como na impagável cena da injeção).
O sujeito é histérico. Pena que seu personagem e suas motivações não sejam tão bem trabalhadas quanto as dos outros dois. As razões para o assassinato que ele deseja não fazem sentido perante sua situação (se a dentista ninfomaníaca é a única que o emprega, matá-la não daria o mesmo resultado que um pedido de demissão?) - e, pior, o assistente de dentista está disposto a matar mas é incapaz de trair a esposa com a Rachel de Friends? Que ética insana é essa? O contador vivido por Sudeikis também deixa a desejar, já que o ator não convence como galanteador e as cenas de sexo pareçam forçadas, motivadas apenas pela necessidade da trama ao final (a ausência do gravador).
Vale lamentar também o volume de piadas perdidas na tradução. As legendas simplesmente não fazem justiça à boca-suja e aos trocadilhos do original ("I'm a squirter" era ouro). Se você é fluente em inglês certamente aproveitará muito mais o filme. Trocar "Mother-Fucker" por "Ferra-Mãe", por exemplo, simplesmente não desce. O tom boca-suja, o grande trunfo da comédia, é amainado pela classificação mais abrangente. Dá pra entender o objetivo do estúdio enquanto empresa, mas não dá para ser conivente com a higienização do linguajar da obra original.
De qualquer maneira, Quero Matar Meu Chefe é um excelente exemplo de comédia que, ao mirar baixo, acaba atingindo o alvo graças à força de suas piadas. Algo que Gordon certamente aprendeu não no cinema, mas na televisão. Desde o infame Surpresas do Amor, ele fez escola em séries como Parks and Recreation, Modern Family e The Office - todas elas focadas justamente na comédia de situações e não na inovação de estrutura. Contanto que as piadas fluam, fica muito mais fácil olhar para o outro lado.
Quero Matar Meu Chefe | Cinemas e horários
Ano: 2011
País: EUA
Classificação: 14 anos
Duração: 98 min
Direção: Seth Gordon
Elenco: Jennifer Aniston, Jason Bateman, Charlie Day, Jason Sudeikis, Colin Farrell, Jamie Foxx, Donald Sutherland, Lindsay Sloane, John Francis Daley, Kevin Spacey, Julie Bowen, Meghan Markle, Steve Wiebe, Michael Albala, Jennifer Hasty, Reginald Ballard, George Back, Barry Livingston, Celia Finkelstein