Woody Allen perdeu o timing. Scoop - O Grande Furo (Scoop, 2006) se emparelha com Dirigindo no Escuro e Igual a tudo na vida entre as comédias mais fracas de sua safra recente - idéias medianas mal executadas, dramaturgia frouxa, ritmo atravancado pela inserção de piadas textuais demais.
Em dois aspectos, porém, Allen permanece genial: os nomes que inventa para os personagens e a maneira como filma as mulheres.
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Scarlett Johansson é a nova Diane Keaton, a nova Mia Farrow, a musa da vez. Mais de um cineasta já capturou na tela a fotogenia mista de inocência e sensualidade da atriz. Scarlett transpira volúpia em Moça com brinco de pérola, Dália Negra, e mesmo em Match Point, a sua primeira parceria com Allen. Em nenhum desses casos, porém, a atriz vive uma personagem tão antiestética como em Scoop.
Na comédia ela interpreta Sondra Pransky, uma estudante de jornalismo estadunidense que está morando em Londres. É o estereótipo da nerd cabeça-de-vento: óculos que escorregam pelo nariz, cabelo preso com elástico, roupas largadas, braços caídos junto ao corpo, jeito deslumbrado de falar. Scarlett como Sondra, vista a três passos de distância, é o avesso de um objeto de desejo. Mas é só a câmera de Allen se aproximar...
A história começa com a morte do famoso jornalista inglês Joe Strombel (vivido galhardamente por Ian McShane). Na barca de Caronte que conduz a sua alma ao Além, o jornalista ouve um furo de notícia: o aristocrata britânico Peter Lyman (Hugh Jackman) é o assassino das cartas de tarô que a polícia britânica tanto procura. Strombel não pode deixar a história passar. Ele então aparece para Sondra, que aceita o desafio e promete investigar o caso. Ela leva consigo o mágico Sid Waterman (Allen), a única outra pessoa que viu o fantasma de Strombel.
Chegar perto de Lyman não é difícil. Ele frequenta a piscina de um clube de alta classe, e Sondra consegue um jeito, com a ajuda de Sid, de entrar no clube também. Neurótico como todos os seus personagens, Sid/Allen dá as dicas para a menina se aproximar do suspeito-galã: "Você é bonitinha, provavelmente esse cara se interessaria por você, particularmente se ele tiver uma mente doentia". Sid então fala para ela fingir que se afoga, para ver se Lyman acode.
O fato de Allen deixar a cena no momento em que Scarlett entra de roupão na área da piscina é como um sinal de que o seu lado ator ficou em suspenso e o lado diretor assumiu o negócio. Ela tira o roupão. Está de maiô vermelho, tipo Baywatch. É o único momento do filme em que Scarlett fica mais alta do que Jackman, que fora d'água deve ter o dobro do tamanho dela. A câmera acompanha a atriz entrando na água sem lhe mostrar o corpo inteiro. Ela encena, se debate, grita, Lyman ajuda. Quando Scarlett senta molhada na beirada, coluna ereta, ofegante, uma luz se reflete na água, uma epifania.
Permita a breguice: é como ver uma borboleta, mesmerizante, deixando o casulo de lagarta.
Esteta da palavra, Woody Allen mostra, em uma tomada, que ainda consegue ser um cineasta, um artista da imagem. Ele enxerga e desnuda o que há de mais erótico no recato da atriz. E Scarlett, em contrapartida, já à vontade no bombardeio de diálogos dos filmes dele, atua com o descompromisso que a situação pede. Ela finge que não é gostosa, Allen faz de conta que a enfeia. Nesse acordo quem sai ganhando é a atriz, que vê empinar o seu mito de menina-mulher.
Ano: 2006
País: Inglaterra, EUA
Classificação: 12 anos
Duração: 96 minutos min
Direção: Woody Allen
Roteiro: Woody Allen
Elenco: Hugh Jackman, Scarlett Johansson, Geoff Bell, Christopher Fulford, Nigel Lindsay, Ian McShane, Fenella Woolgar, Doreen Mantle, David Schneider, Meera Syal, Kevin McNally, Robyn Kerr, Richard Stirling, Jim Dunk, Romola Garai, Carolyn Backhouse, Sam Friend, Woody Allen, Suzy Kewer, Jody Halse, Matt Day