Depois de ficar famoso em Hollywood como "doutor de roteiros" e de redefinir o subgênero das duplas policiais com Máquina Mortífera, Shane Black tem tentado, como diretor, oxigenar esse subgênero com novos elementos. Dois Caras Legais (The Nice Guys, 2016) é um filme muito parecido, nesse sentido, com o primeiro longa de Black na direção, Beijos e Tiros (2005) - particularmente nos excessos.
Black parece convencido de que, para defender uma assinatura de autor, esses seus filmes precisam deixar claros os procedimentos de metalinguagem e de subtexto que usam. No caso de Dois Caras Legais, fica evidente o tempo inteiro que o diretor está tentando fazer um Boogie Nights dentro da sua variação de Máquina Mortífera: um retrato da Califórnia dos anos 1970, da Nova Hollywood, que redima os párias underground de bom coração e boas intenções e puna a América corporativista.
Ryan Gosling vive um detetive particular falido que aceita a encomenda de encontrar uma atriz perdida. Paralelamente, a atriz contrata um outro detetive, especializado em força bruta (papel de Russell Crowe), para impedir que o personagem de Gosling continue na busca. Quando percebem que estão sendo enrolados - em reviravoltas repetidas que envolvem festas, tiroteios, mortes, perseguições - os dois terminam se juntando para descobrir a verdade.
Não é raro que os filmes noir terminem abordando a própria indústria do cinema hollywoodiana - terreno próspero para complôs e perversões, tipos maliciosos, mulheres fatais e inocentes úteis. Dois Caras Legais se filia a essa tradição e, embora Black leve ao limite seu sarcasmo, a caricatura e o humor pastelão, o que ele faz aqui é uma reverência até bastante solene da nostalgia e da fantasia de um cinema artesanal comprometido com verdades - cinema esse que Black, no seu exercício de metalinguagem, admite ser a única instituição americana que se mantém impermeável à corrupção.
Ano: 2016
País: EUA
Duração: 116 min
Direção: Shane Black
Roteiro: Shane Black
Elenco: Ryan Gosling, Matt Bomer, Russell Crowe, Kim Basinger, Ty Simpkins