Com US$ 90 milhões arrecadados globalmente (quase 4 vezes o seu orçamento, de US$ 25 milhões), Tudo em Todo o Lugar ao Mesmo Tempo é um caso curioso na Hollywood contemporânea: uma história totalmente original, não ancorada por algum astro gigantesco da indústria americana, e patentemente bem-sucedida nas bilheterias. Os diretores Daniel Scheinert e Daniel Kwan teorizaram sobre o motivo desse sucesso em entrevista ao Omelete.
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“Nós desenhamos o filme para se parecer com um blockbuster de Hollywood, como se fosse nossa versão disso, mas ao mesmo tempo fizemos tudo com os nossos amigos, e da forma que estamos acostumados - ou seja, com muito improviso, em esquema de guerrilha", conta Scheinert. “Então, de certa forma, este era mesmo o objetivo: alcançar as pessoas e dar a elas uma boa experiência de entretenimento, mas também fazer algo muito pessoal pelo caminho”.
Kwan não vê problemas em admitir que o filme foi pensado para ser “viralizável”, especialmente em uma era na qual as conversas sobre uma produção na internet podem definir o seu sucesso ou fracasso. “Pensamos muito sobre a linguagem dos memes, sobre como a cultura e as ideias se movem através das mentes hoje em dia, como elas evoluem. É como uma seleção natural de ideias, em que sobrevivem as mais fortes”, compara.
“Filme de kung fu! Multiverso! Muitas coisas bizarras acontecendo! É assim que fazemos as pessoas falarem sobre o nosso filme, é assim que nos certificamos que as imagens que criamos fiquem na cabeça das pessoas e se espalhem pela sociedade”, continua. “É quase uma estratégia maquiávelica, que pode ser lida como cínica e nojenta se feita da forma errada, mas é uma forma de se destacar em um cenário saturado de informação”.
Scheinert traz o outro lado da moeda, se dizendo feliz por perceber que o público se conectou com os temas mais profundos do filme. “As pessoas estão falando dele não por causa do espetáculo, mas por causa de coisas que abordamos, como a experiência imigrante, ou a forma como encaramos o niilismo de frente. É bem raro que um filme discorra sobre pensamentos assustadores como esses, e eu não esperava que as pessoas se agarrassem tanto a isso”, diz.
Para Kwan, essa dualidade entre superfície e conteúdo em Tudo e Todo o Lugar é bem expressa em uma metáfora ecológica: ele cita a borboleta-monarca, espécie cujas asas são pintadas de um belo padrão laranja e preto como “aviso” para os predadores. “Ela está tentando te dizer que você não deve comê-la, porque é amarga - e, quando você tenta, ela é de fato muito ruim”, relata.
No outro extremo está a borboleta vice-rei, que imita o visual da monarca, mas não as suas propriedades gustativas. “A promessa que ela faz na superfície não é refletida de volta para você. Para mim, é sobre isso: qual é o sinal que você envia para o público visualmente, mercadologicamente, e qual é a experiência de verdade? Conseguimos fazer com que ambas as coisas sejam boas?”, completa o cineasta.
Quem arremata a discussão, com o bom humor de sempre, é Scheinert: “Talvez haja uma lição aí: se o seu filme tem algo a dizer, algo que as pessoas querem muito ver explorado no cinema, elas vão comprar ingressos! [...] Ou talvez nós só fizemos um filme que é tão confuso que você precisa assisti-lo mais de uma vez, e por isso estamos fazendo sucesso. O segredo é vender mais de uma entrada por pessoa, galera!”.
Tudo em Todo o Lugar ao Mesmo Tempo está em cartaz nos cinemas brasileiros.