Uma Velha Amante (Une vieille maîtresse, 2007) é baseado no romance do século 19 escrito por Jules Barbey d'Aurevilly, um autor que sempre explorou as motivações ocultas do ser humano. A cineasta Catherine Breillat aproveitou o material para realizar um filme interessante sobre a relação entre o desejo carnal e o amor. O diferencial aqui reside no número de indivíduos envolvidos nesses sentimentos. Os protagonistas são um homem, uma mulher e uma amante. Breillat aproveita essas figuras dramáticas para apresentar a força por trás de uma paixão incurável. Seu trabalho sempre foi pontuado pelo sexo e a violência explícita. Ao investir em uma produção de época, Breillat abandona seus temas preferidos para investigar o pathos que move as relações sombrias.
Na mundana Paris do século 19, só se fala no casamento do jovem libertino Ryno de Marigny com a bela e pura Hermangarde, uma flor da aristocracia. Os noivos se amam, porém as más línguas insinuam que Ryno não vai conseguir romper um antigo romance com Vellini, uma cortesã escandalosa, filha de uma duquesa com um toureiro. Antes do casamento, a avó de Hermangarde, exige saber do noivo se ele ainda está tendo um caso com a espanhola Vellini. A partir desse momento, um longo flashback surge e Ryno conta como conheceu e se relacionou por 10 anos com a cortesã. Essa seqüência é vital para compreender a fúria avassaladora que existe entre os dois amantes.
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Percebe-se que Ryno e Vellini têm uma relação de necessidade doentia um pelo outro. Um misto de paixão, sexo e amor tão poderoso que chega a ser destruidor. Por mais que tentassem se afastar, uma indigência aproximava os dois. Breillat ilustra o relacionamento com cenas repletas de ardor e tensão. Conforme a narrativa vai se desenvolvendo, tragédia e desespero tomam conta da história. Como um vicio, Ryno não consegue separar-se de Vellini. E ela está presa a ele como um encosto, uma espécie de espírito obsessor. As cenas de Vellini dando baforadas com seu charuto remetem à idéia de uma Pomba-gira da época vitoriana.
Boa parte do sucesso de Breillat neste projeto vem dos atores envolvidos para protagonizar essa relação a três. No livro, Vellini é feia e Hermangarde é de uma beleza helênica. Essas escolhas feitas pelo autor Jules Barbey d'Aurevilly tinham como objetivo demonstrar a força que o desejo tem em detrimento à beleza. Asia Argento foi escolhida para viver Vellini. Apesar de não ser feia, não é um padrão de beleza. Pelo contrário, ela sabe usar suas olheiras e olhar psicopata, para personificar uma mulher sem compostura. Assim ela compensa a falta de feiúra com um jeito chulo próprio de ser. Impossível desviar o olhar dela. Hermangarde é o contraste. Parece uma princesa de conto de fadas. Quem a interpreta é bela Roxane Mesquida. O confronto das duas pelo amor de Ryno reside entre a luxúria e a inocência / o sexo e o amor. Fu'ad Ait Aatou, modelo que virou ator, interpreta Ryno. Ele participa do jogo de gato e rato com desenvoltura. Completando o elenco ainda temos a presença da jornalista Claude Sarraute como a Marquesa de Flers, Michael Lonsdale como Visconde de Prony e Yolande Moreau no papel da Condessa d'Artelles.
Apesar de flertar com confidências, traições e segredos numa sociedade paralisada pelas convenções, o filme tem um ritmo próprio. Os acontecimentos são marcados pela reflexão. O objetivo aqui é provocar uma discussão sobre os sentimentos inexplicáveis que movem o coração e as diferenças entre o desejo, a paixão e o amor. Ao mesmo tempo procura um caminho de como saciar um apetite voraz por alguém.
