Quando vi o trailer de Clair Obscur: Expedition 33 pela primeira vez, fiquei conflitante. A premissa, visual e trilha eram interessantes, e o combate era espalhafatoso e cheio de efeitos, para colocar o hype de qualquer um nas alturas. Mas ao mesmo tempo muitas pessoas começaram com o discurso de que esse jogo, que apareceu do nada, era a evolução, o futuro dos RPGs de turno. Ao ver essas reações, eu, como um grande fã do gênero, fechei a cara para Clair Obscur. Não entendia o porquê desse hype todo. Não sabia se era por que o combate parecia veloz, ou se só era a birra que muitos têm com jogos japoneses sendo refletida nesse jogo, que é de um estúdio francês. Eu estava preparado para não gostar de Clair Obscur. Achava que ia ser uma amálgama de boas ideias e péssimas execuções, mas eu estava enganado, extremamente enganado, e ainda bem que foi o caso.
Para contar para vocês minha jornada de maravilhamento ao descobrir um dos (possíveis) melhores jogos do ano, quero propor um review com uma abordagem diferente. Em vez de ir falando um pouco sobre cada elemento que compõe o game, quero ir relembrando com vocês minha jornada com ele. Como aceitei suas principais mecânicas, como entendi melhor seu enredo, e como foi cair em tentação pelas lindas vozes de sua trilha sonora, até mesmo o cantarolar que toca sempre que os personagens morrem. Acredito que só assim, fazendo o review dessa forma, eu consiga verdadeiramente expressar o quanto eu gostei desse jogo, então espero que aproveitem esse texto comigo.
Logo de cara, somos colocados no fim de um ciclo e no começo de outro, aqui representado pela troca de um número em um enorme monólito, feita pela Artífice. Todas as pessoas com a idade representada no número morrem. Tutoriais de combate, apresentações de diversos personagens e um momento tocante marcam o início de Clair Obscur: Expedition 33. É um início confuso e estranho. O jogo não esconde a nacionalidade de seus criadores, para o bem ou para o mal - tem até uma Torre Eiffel murcha na cidde inicial. Nunca sabemos em que mundo essa história realmente se passa, mas tudo indica que é uma realidade alternativa, já que a cidade não se chama Paris, e sim Lumiere. Ninguém faz referência a mais nada do nosso mundo.
O jogo não dá muito tempo para respirar. Logo após sermos apresentados ao conceito das expedições, grupos que tentam ir anualmente até a Artífice para tentar impedi-la, já saímos para a nossa aventura, a Expedição 33. É a 67ª tentativa de matar a suposta deusa desse mundo. Já tive muitos poréns com o jogo logo de início. A quantidade de personagens e a urgência da situação não deixam seus protagonistas brilharem, e também o combate não estava encaixando comigo.
Clair Obscur funciona como a maioria dos RPGs por turno atuais. Habilidades que podem ser equipadas, ordem de turnos com base na velocidade do personagem, começar a batalha atacando o inimigo, e por aí vai. Os grandes pontos que diferenciam o jogo dos demais são apenas dois: os Quick Time Events, e as ações defensivas manuais. E até esses pontos não são grandes novidades pro gênero, mas o que Clair Obscur faz de diferente é como eles são aplicados no gameplay. Os QTE são a parte mais besta do jogo, e deu pra perceber isso logo de cara, sendo todos a mesma coisa: apertar o X (PlayStation) quando aparece na tela para o ataque dar mais dano. Mas é nas ações defensivas que está a principal mecânica do jogo, e logo de cara eu já a odiei.
Vejam bem, eu não sou a pessoa com os melhores reflexos, e esse jogo é focado nisso. Não importa se você dá muito dano nos inimigos. Em Clair Obscur, se você não aprender o ritmo do ataque adversário para apará-lo, você vai morrer, e morrer muitas vezes. Eu morri tanto por causa disso no começo que chegou a me frustrar imensamente. E além disso, outra fonte de frustração veio logo em seguida, quando sai da área inicial para o mapa do jogo.
Clair Obscur tem um grande mapa, composto por diversos calabouços e cidades, com várias áreas opcionais. E aí que veio uma das minhas principais questões com o jogo. Tirando o indicador da missão principal, o mapa em si não possui mais nenhuma ferramenta, Ele é extremamente limitado. Visto que há diversos pontos de interesse, alguns completáveis logo de cara, outros não, senti muita falta de ferramentas para deixar marcadores ou anotações, e isso só piora no fim do jogo, quando há mais áreas abertas. E a falta de um mapa ou minimapa dentro das dungeons também me incomodou logo de cara, já que há muitos cantos a serem explorados, mas como a direção de arte é bem espalhafatosa e cheia de cores, eu me perdia toda hora, errando o caminho, ou via fendas e passagens onde não existiam.
Encarando esses vários percalços iniciais, eu fui seguindo com o jogo, e fui surpreendido. Quando parei para perceber, já estava me apegando aos personagens, agora devidamente apresentados e começando a se aprofundar. A história tinha se assentado melhor na minha mente e já tinha revelado alguns mistérios que atiçaram minha curiosidade. O combate começou a fazer sentido, e não só me refiro a acertar o timing da defesa. O sistema de construção das builds dos personagens começou a aflorar, e de longe ele é a melhor parte do jogo. O visual de Clair Obscur também não parava de me surpreender, tanto pela visão artística quanto pelo uso de cores e iluminação, apesar de ainda me deixar muito confuso ao navegar pelos espaços, mas as músicas eram a cereja do bolo. Esse jogo tem um constante vai e vem entre calmas melodias e músicas de batalha insanas que são de cair o queixo. Sem contar, além de tudo isso, que o jogo é muito engraçado nos momentos certos, o que pra hoje em dia é muito raro.
Porém, percebi que esse jogo estava com suas garras enfiadas em mim quando uma certa reviravolta aconteceu, lá pelas dez horas de jogatina. Aquele momento, que obviamente não irei estragar, acabou comigo, foi igualmente emocionante e confuso, e adicionou mais camadas para os mistérios da narrativa. A partir dali o jogo se transformou e me surpreendeu, e essa não seria a última vez.
No meio da aventura, eu já estava me deleitando. Após essa reviravolta o mapa se abre mais, mostrando mais e mais conteúdos extras para se fazer, indo de lutas desafiadoras a mapas de parkour que lembram os minigames de escalada do Gold Saucer, no Final Fantasy XIV (quem sabe, sabe). Obviamente não consegui fazer tudo, já que estava correndo contra o tempo pra terminar esse review, mas já que toquei nesse ponto queria aproveitar para deixar algo bem claro aqui.
Clair Obscur tem uma qualidade muito importante para RPGs do tipo, que é o balanceamento. Apesar de todo o conteúdo extra, com diversas possibilidades de conseguir equipamentos diferentes e obter XP, a experiência central é extremamente balanceada. Você não precisa fazer tudo que tem no mapa, ficar 20 horas no grind para enfrentar os grandes chefões da história, nem nada do tipo.
É muito bom explorar o mapa, o jogo te recompensa com bastante coisa, seja cosméticos ou ótimos equipamentos, mas em nenhum momento me senti obrigado a ter que perder algumas horas pra ficar mais forte. Fazer alguns objetivos extras aqui e ali, ter uma estratégia de combate sólida e bom tempo de reação na defesa já são o suficiente para terminar o jogo no modo Normal, mas também tem bastante conteúdo extra que exige mais do jogador que o modo história, como uma torre de missões, ou uma área com inimigos bem mais fortes, que são totalmente opcionais.
E cada vez que chegava mais perto do final, o jogo ia ficando melhor. Os cenários vão ficando cada vez mais ricos, as lutas contra chefes ficam mais malucas, mais opções de defesa são apresentadas, as builds vão ficando cada vez mais quebradas, e o limite de dano de 9999 aparece, você se sente uma máquina de destruição, só pra depois liberar a habilidade de quebrá-lo, podendo ir muito mais além.
Mas é na parte da narrativa que esse jogo mais me surpreendeu. Depois da primeira reviravolta acho que tiveram mais umas quatro, sendo umas pequenas e outras gigantescas. Não posso falar sobre nenhuma, já que são grandes spoilers, mas saiba que elas transformam o jogo, mais de uma vez. Apesar disso, acredito que alguns personagens, os mais secundários do grupo, ficaram perdidos e ofuscados no caminho, o que não encaixa com o começo do jogo, que se aprofundava muito nas relações entre eles.
Mesmo o final, que traz o restante do grupo de volta aos holofotes, não faz jus a como era no início. Com todas as transformações da narrativa, há uma perda da essência do jogo, que não é muito bem balanceada com o tema central que ele quer abordar. Mesmo assim o final consegue ser de tirar o fôlego, me deixando boquiaberto nas últimas lutas, com a insanidade do que estava acontecendo, ao mesmo tempo que eu não piscava de tensão para não errar o timing da defesa.
Tudo isso culmina em uma decisão final que você tem que tomar. Quando ela aparece, eu senti que tudo fez sentido. Normalmente esse tipo de decisão é um pouco ingrata nos jogos, mas aqui não. Em Clair Obscur: Expedition 33, a última decisão é um ultimato, para os personagens e para o próprio jogador. Esse jogo é tão potente, competente e profundo que vai fazer você refletir sobre seu tema central.
Eu fui de um ceticismo a uma completa paixão por um dos jogos mais únicos e belos deste ano. Nesse momento da decisão final, da última luta, mesmo estando cansado, correndo contra o tempo para fazer esse review, eu pulei de empolgação quando essa situação se apresentou, e acredito que isso define um bom vídeo game, um bom livro ou um bom filme melhor do que qualquer outra coisa. A capacidade de nos fazer esquecer o resto do mundo, por pelo menos alguns minutos, poder absorver suas ideias por completo, ao mesmo tempo que nos empolga e entrega uma catarse digna é algo para poucos, como Clair Obscur: Expedition 33.
Clair Obscur: Expedition 33
Lançamento: 24.04.2025
Desenvolvedora: Sandfall Interactive
Publicadora: Kepler Interactive
Gênero: RPG
Classificação: 18 anos
Plataformas: Xbox Series S , Xbox Series X , PC , PlayStation 5
Testado em: PlayStation 5
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