Com a proposta de dar mais visibilidade a jogos com temática LGBTQ+, a mostra NewGame+ trouxe uma seleção de 10 jogos para o Sesc Avenida Paulista, em São Paulo. O evento, que vai até este domingo (1º), nasceu com a ideia de apresentar jogos produzidos por desenvolvedores que fazem parte desta minoria a um público mais amplo.
A ideia nasceu de uma vontade de dar espaço a criadores LGBTQ+ da mesma forma que já acontece com festivais de cinema. “30 anos atrás, quase não se tinha conteúdo voltado à cultura LGBT, com representação e tudo mais. E aí, começou a se criar festivais de cinema cada vez mais acolhedores ao redor do mundo e, três décadas depois, temos centenas de festivais que lidam com o cinema LGBTQ+ e queer”, explica Sophia Wickerhauser, cineasta que também trabalha com festivais LGBTQ+ e é uma das organizadoras do NewGame+.
Nos games, entretanto, o circuito de festivais dedicados especificamente a esta temática ainda é incipiente, mesmo fora do Brasil. “Você até encontra dentro de eventos como o BIG ou a gamescom, mostras focadas em diversidade, mas como coadjuvante de um espaço maior, ou quase sempre com um viés de produto: estamos aqui para vender o jogo, não como uma celebração de expressão como uma questão artística, de dar voz a uma comunidade”, ressalta Ariel Velloso, CEO da Aipo Digital e um dos organizadores do evento.
(Nota da Edição: BIG e gamescom latam são eventos realizados pela Omelete Company, grupo do qual o The Enemy faz parte).
A dupla, que também desenvolve jogos, compõe a seleção de dez jogos da mostra, com cinco títulos do Brasil e cinco títulos internacionais, todos ainda não lançados. Do lado brasileiro, o jogo contou com o aguardado Abyss X Zero, metroidvania 3D produzido pelo Studio Pixel Punk, de Unsighted, além de lum.rdio.taxi, do Soín Coletivo, Other People’s Problem, da Dev Vand. Deliria, da Aipo Digital, e Um Domingo à Tarde, da White Wolfy (o estúdio de Sofia Wickerhauser), completam o grupo.
Já entre os jogos internacionais estão Unbeatable, da D-CELL GAMES; Until Oblivion, da Ixavon; Dustborn, da Red Thread Games; Kitsune Tails, da Kitsune Games; e Spirit Swap: Lofi Beats to Match-3 To, da Soft Not Weak.
O trabalho de organização, que envolveu busca por financiamento — além do Sesc, o evento contou com recursos da Lei Paulo Gustavo e apoio do Governo Federal e da secretaria municipal de Cultura da capital paulista — também envolveu apresentar a ideia de um Festival LGBT+ aos desenvolvedores. Com um histórico de envolvimento com a comunidade de desenvolvedores independentes, Ariel conta que o maior desafio foi, na verdade, convencer estúdios de fora do Brasil.
Unbeatable é um dos jogos itnernacionais presentes na mostra
“Tivemos uma aceitação bem legal dentro dos estúdios brasileiros. Mas do pessoal de fora, percebemos uma certa desconfiança, sobre o que é o festival, de ceder o seu projeto, o que eu acho justo. Você não sabe como vai ser a curadoria, em que contexto estará… então tivemos que fazer um pouco dessa conversa e mostrar que somos bem intencionados”, diz Ariel. A esperança, segundo a dupla, é que a primeira edição consiga justamente abrir portas e trazer cada vez mais produtores de conteúdo LGBTQ+.
Uma das principais preocupações do evento foi justamente a de uma curadoria acessível a todos os públicos. “A gente até discutiu, porque existe uma produção LGBTQ+ que aborda temas mais adultos. Isso é super potente e super válido, mas a gente buscou, no primeiro ano, por uma questão de local (o Sesc), de uma iniciativa inédita, de apresentar para São Paulo e para o Brasil de jogos adequados para a família toda”, ressalta Ariel.
A escolha também passou por uma ideia de desmistificar estigmas de jogos desenvolvidos por estes grupos. Sofia aponta que a mostra conta com jogos que falam sobre a experiência de ser queer, como Other People’s Problem, ou títulos em que a experiência queer está dentro da narrativa, como Kitsune Tails. “Esse contexto LGBTQ+ está simplesmente inserido na narrativa. Ela poderia facilmente não ter personagens queer e funcionaria da mesma forma. A ideia é desmistificar. Não necessariamente porque o jogo tem um personagem LGBTQ+ que o jogo vai ser sobre isso.”
Com o fechamento da primeira edição, a dupla já pensa na organização da próxima, mas a questão esbarra em viabilizar o evento financeiramente. Mas, caso esse obstáculo seja superado, a ideia é deixar o evento ainda mais diversificado, trazendo uma mostra com jogos para toda a família e outra apenas para maiores de idade, que aborda temáticas mais adultas. “Talvez, fazer uma homenagem a jogos eróticos, porque eles não vão para eventos de games, não são aceitos. A gente acha isso absurdo porque eles também fazem parte da cultura, ela é paralela, underground, mas existe e também tem de ser celebrada”, finaliza Sofia.