Filmes

Entrevista

O Hobbit - A Desolação de Smaug | Omelete entrevista Fran Walsh e Philippa Boyens

As roteiristas comentam a adaptação, o tom "caótico" do livro e os puristas

27.11.2013, às 18H05.
Atualizada em 29.06.2018, ÀS 02H39

Durante a nossa visita ao set de filmagens de O Hobbit: A Desolação de Smaug, segunda parte da trilogia que adapta o livro O Hobbit, o Omelete conversou com as roteiristas e produtoras Fran Walsh e Philippa Boyens sobre o desafio de adaptar o livro em uma trilogia de filmes e fazer ligações com O Senhor dos Anéis.

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"Bilbo é diferente de Frodo. Encontrar seu tom foi desafiador", diz Philippa Boyens

Para Fran Walsh, só realizar agora a adaptação do primeiro livro de J.R.R. Tolkien na Terra-média foi um alívio. "As pessoas me perguntam por que não começamos com O Hobbit... e eu sempre respondo que foi porque era difícil demais! O tempo todo temos 15 personagens na tela disputando espaço! Dar atenção a todos não é algo fácil de conseguir", comenta.

"Nós queríamos que o público se apaixonasse por todos eles. Que se preocupasse com cada um desses personagens. Graças ao nosso elenco incrível, que deu vida e independência a todos graças à dinâmica de grupo e a união deles, acreditamos que conseguimos", segue Philippa Boyens, em seu acolhedor trailer no set na Nova Zelândia.

Para Philippa, o teor menos "dramático" da jornada também é algo que torna esta adaptação mais difícil. "Esta não é uma busca para salvar o mundo como a de O Senhor dos Anéis. E Frodo é um personagem maravilhoso. Bilbo é muito diferente... bem menos nobre. Encontrar seu tom foi desafiador. Mas acertamos com a escolha de Martin Freeman."

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Bard é um dos personagens principais da Cidade do Lago,
cenário que ganha mais ênfase nas telas do que no livro

"Ele É o Bilbo", empolga-se Fran. "E o personagem é muito menos nobre do que Frodo. Ele é mais festivo, engraçado, charmoso e extremamente britânico! Ele encara coisas que o amedrontam com heroísmo, ele enfrenta situações terríveis com peito aberto, mas preferia muito mais estar tomando um chazinho no Bolsão."

As roteiristas também dedicaram-se exaustivamente ao desenvolvimento de personagens citados em apenas algumas páginas do livro, mas que são fundamentais para a trama. "É o caso de Bard, que é muito pouco explorado por Tolkien. Descobrir como integrá-lo à nossa história foi muito difícil", seguiu Philippa. "O público precisa se preocupar com ele e as pessoas da Cidade do Lago. Esse é o mundo dos homens e o primeiro encontro de Bilbo com eles. Poderíamos acelerar essa parte ou dar ênfase a ela - e optamos pela segunda opção simplesmente porque adoramos essas pessoas, especialmente o Mestre da cidade".

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Martin Freeman e Benedict Cumberbatch no set:
"Smaug é um presente para qualquer roteirista"

Mas o personagem favorito da trilogia para ambas é mesmo Smaug, o dragão. O flagelo dos anões e principal antagonista dos filmes é "um presente para qualquer roteirista", segundo Fran. "Ele é maravilhoso. Um psicopata de verdade", complementa Philippa.

"Era muito importante encontrar a pessoa certa para fazer sua voz. É ela que o torna tão especial. No livro fala-se 'cuidado com a voz dele' enfaticamente. E sua composição é meio parecida com a do Gollum, meio arquetípica. É um personagem lindo de se trabalhar, muito poderoso. E conseguir Benedict Cumberbatch para vivê-lo foi fundamental", diz Philippa.

"Ele fez coisas extraordinárias no papel. Nos papéis, aliás, já que ele dubla o Necromante também. Sabe, nunca foi nossa intenção ter a mesma pessoa para ambos os vilões, mas ele fez coisas com ambos que nunca vimos ator nenhum fazer. Eu nem sabia que era possível usar a voz daquela maneira", comenta Fran. "Foi sem querer que o colocamos nos dois papéis. Ele simplesmente foi perfeito em ambos e as vozes não parecem a mesma".

Para garantir que essas revisões e implementações funcionem, as roteiristas e o diretor Peter Jackson realizaram leituras frequentes com o elenco. "Todos leem juntos e eles nos dão suas próprias ideias. Aí voltamos ao trabalho. É um processo orgânico, esse de levar personagens à vida, e passa pelas qualidades e seguranças de cada um dos atores e atrizes", explica Fran.

Mas nem tudo acontece tão tranquilamente nesse processo. A obsessão do diretor Peter Jackson por detalhes frequentemente levava Fran e Philippa a retrabalhar diálogos. "Entregávamos as páginas da semana e ele devolvia com anotações dizendo que 'esquecemos de um momento' em algum lugar. Primeiro nos olhávamos com cara de 'ele está louco', mas logo estávamos refazendo tudo porque ele sempre está certo e enxerga minúcias incríveis", relembra Philippa.

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Evangeline Lilly como a elfa Tauriel: "Não há
como fazer um filme só de homens hoje em dia"

Questionadas sobre se estão preocupadas com os puristas da obra de Tolkien, que reclamaram da ausência de Tom Bombadil em O Senhor dos Anéis e das mudanças com relação a Arwen e outras personagens femininas, Fran e Philippa dão de ombros. "Não há como agradar um purista", lamenta Fran. "Filmes e livros são mídias completamente diferentes e tem requerimentos dramáticos distintos. Não há como ser 100% fiel. No final, nosso objetivo é criar algo que - como fãs de Tolkien - nós mesmas gostaríamos de ver no cinema. Mas isso inevitavelmente vai desagradar alguns. Em O Hobbit, nosso maior problema foi a ausência de personagens femininas. Obviamente, tivemos que criar uma heroína, Tauriel, pois não há como fazer um filme só de homens hoje em dia".

"Era muita energia masculina junta. Precisávamos de mulheres. Então Galadriel retorna e sabíamos que na Floresta das Trevas há elfas, então partimos daí - de algo que já funcionou no passado e ampliamos. Mas, sendo muito sincera, se não tivéssemos encontrado a pessoa certa para viver Tauriel, talvez ela tivesse sido cortada. Mas Evangeline Lilly foi fantástica! Fez uma personagem única, completamente diferente de Arwen e Galadriel. Ele é mais ligada à terra. Espero que as pessoas gostem dela", diz Fran.

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"Ainda que seja mais charmoso, O Hobbit é mais caótico que O Senhor dos Anéis", explica Philippa

Ao lado de Philippa, Fran e Peter Jackson, outro roteirista trabalhou no filme: Guillermo del Toro. "Ele tem um conhecimento incrivelmente profundo em termos de fantasia. Ele realmente entende esse gênero. É brilhante e o melhor nisso que eu já conheci", elogia Philippa. "Ele foi um parceiro fundamental em O Hobbit", complementa Fran.

"Ele nos ajudou muito a enxergar certos aspectos da história. Ela se passa na Terra-média, mas é muito diferente de O Senhor dos Anéis. A sensação é diferente. Ele nos ajudou a ver certos pontos onde a trama, que é menos sisuda no livro, demonstrava uma certa robustez. E, de certa forma, O Hobbit, ainda que seja mais charmoso, é mais caótico que O Senhor dos Anéis", explica Philippa. "Tolkien o escreveu anos antes, mas dá pra sentir que as trevas estão ali, ocultas. É quase como se ele estivesse já imaginando o que viria a seguir, o horror".

É justamente essa sensação de horror que Del Toro ajudou a manter, mesmo que o tom do filme fosse mais infantil pela natureza da obra. "Fizemos questão de evidenciá-lo. Eu acho que as crianças amam o horror. É algo que está meio perdido hoje, essa sensação delas de que assistir a alguma coisa terrível em um filme as torna mais valentes".

Ao final, Philippa e Fran comentam se existe mais alguma história de Tolkien que gostariam de explorar. "Para mim, a história não contada que é mais fascinante é a do Gollum", revela Philippa. "Sim! A história do que aconteceu nos 60 anos desde que ele perdeu o Um Anel até sua tortura", empolga-se Fran. "Mas isso seria um roteiro completamente novo... e não seríamos nós a fazê-lo. Estaríamos bem velhinhas e aposentadas", conclui Philippa.

O Hobbit - A Desolação de Smaug estreia em 13 de dezembro.

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