Sabe quando, naquela sitcom adolescente ou naquele musical descolado, os personagens “improvisam” uma rotina de dança que obviamente foi ensaiada por dias a fio antes das filmagens, e mesmo assim você não consegue impedir um sorrisinho bobo de se formar no seu rosto? Nos melhores momentos do show do NCT Dream no Vibra São Paulo, na última terça-feira (4), o grupo de k-pop conseguiu suscitar em mim a mesma sensação gostosa de se entregar - mesmo que só por uns minutos - à crença ingênua de que o mundo pode ser descontraído e sorridente e perfeito desse jeitinho claramente ficcional.
Não tem nada errado em escapismo, e se existe um filão cultural que entende isso atualmente, é o k-pop. Lá pelo miolo do show do Dream, os integrantes trocaram os figurinos elaborados em preto que abriram o espetáculo por terninhos estilizados (no melhor espírito kitsch, Haechan e Chenle optaram ainda por óculos escuros, embora já passasse das 20h30 em uma arena fechada), e abandonaram as formações complexas de suas coreografias mais difíceis por movimentos soltos que abraçam toda a extensão do palco. O resultado foi pura magia.
Enfileirando uma série de hits (“Dèja Vu”, “Dive Into You”) e baladas melodramáticas apresentadas em meio a litros de gelo seco (“Bye My First”, “Sorry, Heart”), o grupo mostrou que sabe entregar populismo adolescente de primeiríssima categoria. Pulos, rebolados, abraços, acenos para o público e fofuras em geral se incorporavam facilmente ao movimento dos cantores pelo palco, sem dúvida atingindo perfeitamente as marcas pré-ensaiadas, mas deixando claro que há espaço para a diversão no meio do caminho. O semblante iluminado dos integrantes não mentia: essa também era a parte preferida de todos eles.
É uma pena que, ao redor dessa fatia central, o talento e carisma do NCT Dream tenha sido engessado pela produção pomposa do show. Talvez visando demonstrar o amadurecimento do grupo, inicialmente concebido como uma unidade teen do supergrupo NCT, a turnê The Dream Show 2: In a Dream abusa da pirotecnia - música sim, música não, os canhões de papel picado e serpentina mirados na direção do público explodiam, ou as labaredas localizadas na beira do palco eram ligadas para adicionar impacto a canções como “Glitch Mode”, que representam o lado noise music da discografia do grupo.
Também incomodou a insistência em versões encurtadas de canções emblemáticas do repertório do Dream. Talvez tenha sido a ânsia de colocar o máximo possível de faixas na setlist, ou talvez a demanda da geração streaming por canções pop de duração cada vez menor, mas o resultado foi de qualquer forma frustrante: quando hits como “Dreaming” ou “Chewing Gum” começavam a empolgar o público, já era hora de passar para a próxima na lista. Privar o fã de música pop da catarse de um último refrão, ainda mais em meio a experiência coletiva do ao vivo, deveria ser crime hediondo.
O que resta em meio a esses problemas é a beleza de uma “Hello Future”, sublinhada pela deliciosa introdução melódica ao piano; e a energia de uma “Beatbox”, que chegou quase ao fim do show para mostrar que o NCT Dream é uma das forças mais dinâmicas e excitantes do k-pop… quando a produção os deixa ser.
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