O mercado de quadrinhos japoneses é enorme, e de tempos em tempos algum autor acaba rendendo alguma polêmica relacionada a crimes ou contravenções. Recentemente o meio otaku foi surpreendido com mais uma notícia sobre Kenya Suzuki, mais um autor de mangá envolvido em crime de posse de material pornográfico infantil, e isso nos fez ter a ideia de relembrar os casos mais famosos envolvendo autores japoneses e suas delicadas situações com a justiça. Vamos à lista?
Mitsutoshi Shimabukuro, autor de Seikimatsu Leader den Takeshi!
No final dos anos 1990, uma época na qual a revista Shonen Jump (a mesma de Dragon Ball e Naruto) estava desesperada para encontrar um novo sucesso, o novato Mitsutoshi Shimabukuro estreou com o mangá Seikimatsu Leader den Takeshi (algo como "A História de Takeshi, um Líder do Final do Século"). A comédia mostrava a vida do jovem Takeshi (é jovem mesmo tendo essa barba de brucutu do cinema dos anos 1980), cujo sonho era ser um grande líder. O título foi sucesso considerável, e Shimabukuro estava prestes a entrar no rol de grandes nomes da Shonen Jump quando... o autor foi preso.
Em meados de 2002, o Shimabukuro foi parar na cadeia por ter pagado pelos serviços sexuais de uma adolescente de 16 anos. A polêmica gigantesca repercutiu o bastante para a editora Shueisha interromper a publicação de Seikimatsu Leader den Takeshi, retirando o mangá da revista sem muita explicação aos leitores.
A carreira de Shimabukuro não foi prejudicada pela prisão. Três anos após a detenção, a mesma Shueisha permitiu que ele terminasse o mangá em outra revista da editora, e três anos depois o autor voltava à Shonen Jump com o seu maior sucesso até então, Toriko (publicado no Brasil pela editora Panini). O êxito do mangá sobre caçadores de comidas raras foi tanto que rendeu anime e vários produtos licenciados, afastando de vez as memórias sobre as polêmicas do passado.
Recentemente, Shimabukuro teve mais uma oportunidade na Shonen Jump, dessa vez com o mangá Build King, mas este foi um fracasso gigantesco e acabou interrompido sem direito a um final.
Kazuichi Hanawa, autor de Na Prisão
Kazuichi Hanawa é um artista de mangá pouco comentado por aqui, mas o autor possui uma série de importantes títulos publicados no Japão. Além dos mangás, um de seus hobbies era o das armas de fogo, e justamente em 1994 ele acabou sendo preso por porte de armas modificadas.
Após passar três anos na prisão, ele lançou um mangá intitulado Keimusho no Naka sobre seu período na cadeia, detalhando o dia a dia do confinamento e abordando o tema também por um aspecto filosófico. O Graciliano Ramos dos mangás se deu muito bem na empreitada, pois seu trabalho autobiográfico rendeu prêmios, adaptações e muitos críticos adoraram o jeitão meio "documentário" do quadrinho.
Keimusho no Naka foi lançado no Brasil em dezembro de 2005 pela Editora Conrad, que adaptou o título para Na Prisão. Infelizmente por conta da época da publicação, o mangá só é encontrado agora em sebos.
Mamare Touno, autor de Log Horizon
Mamare Toono não é bem um autor de mangá, e sim de light novels, mas seu nome também esteve estampado no noticiário por causa de problemas com a justiça. Conhecido por ter criado a série Log Horizon, Mamare passou um perrengue com o "leão japonês" e foi acusado pelo crime de evasão fiscal.
O autor deixou de contribuir com 30 milhões de ienes (cerca de um milhão e trezentos mil reais em valores atualizados), tudo do lucro de suas obras. O autor foi sentenciado a 10 meses na prisão, mas o sistema judicial japonês poderia anular essa pena caso ele apresentasse bom comportamento.
Tanto o mangá quanto o anime de Log Horizon são publicados no Brasil pela NewPOP Editora, e a série conta a história de Shiroe, um gamer que fica preso em um jogo online de fantasia no melhor estilo Sword Art Online.
Nobuhiro Watsuki, autor de Rurouni Kenshin - Samurai X
Com certeza este é o mais conhecido caso de autor que passou por problemas na Justiça. Em meados de 2017, a franquia Rurouni Kenshin (ou Samurai X para nós) estava entrando em processo de reaquecimento: o autor Nobuhiro Watsuki havia começado uma continuação oficial, Rurouni Kenshin: Kokkaido Arc, e havia a promessa de novos filmes para adaptar o final da série original.
Só que em novembro daquele ano o autor foi parar nas notícias policiais do mundo inteiro por ter sido acusado de possuir material pornográfico com menores de idade. No escritório do autor foram encontrados DVDs com vídeos de adolescentes nuas, e o autor então confessou às autoridades sobre o crime.
A má conduta do autor respingou em Rurouni Kenshin: Hokkaido Arc, cuja publicação foi interrompida pela editora Shueisha. Outros países, como os EUA, também cessaram a publicação de volumes de Rurouni Kenshin até que tudo fosse resolvido.
No fim, Watsuki foi multado em 200 mil ienes (cerca de dez mil reais) e após o pagamento tudo voltou ao "normal": saíram dois filmes de Rurouni Kenshin nos cinemas japoneses, o Hokkaido Arc voltou a ser publicado e recentemente houve o anúncio de um novo anime para recontar a história de Rurouni Kenshin, dessa vez produzido pelo estúdio Liden Films (de Tokyo Revengers). Até pouco tempo atrás a franquia comemorou aniversário e vários autores renomados da Shonen Jump deram depoimentos muito positivos sobre Watsuki e sua obra.
Tatsuya Matsuki, roteirista de Act-Age
De tempos em tempos a editora Shueisha precisa lidar com as polêmicas de alguns de seus autores, e em 2020 foi a vez de Matsuki Tatsuya, o roteirista de Act-Age. O título era relativamente recente na Shonen Jump e contava a história de uma garota com uma grande facilidade em interpretar papéis e cujo sonho era ser uma grande atriz. Act-Age vinha se destacando nas vendas e nos rankings de popularidade, já havia sido licenciada para vários países e o futuro parecia promissor para a série, até que o roteirista cometeu um crime pesado.
Tatsuya foi preso após assediar sexualmente uma estudante colegial, entre 12 e 15 anos. Segundo matérias que apareceram na imprensa japonesa, o autor tocou na garota de forma indevida e tentou fugir de bicicleta, mas acabou identificado por câmeras de segurança. Outros assédios semelhantes também foram registrados e o roteirista acabou confessando o crime.
Ao contrário do episódio com o Mitsutoshi Shimabukuro, ocorrido em uma época em que mangá não era tão popular no mundo todo, dessa vez a pressão mundial pode ter levado a Shueisha a ser bem mais severa. Para começar, Act-Age foi cancelado na Shonen Jump sem qualquer chance de um final, e a editora lançou um pedido de desculpas público aos leitores. Além disso, os responsáveis pela revista também demonstraram apoio à desenhista Shiro Usazaki, que perdeu seu trabalho com o cancelamento de Act-Age.
O cancelamento de Act-Age veio em uma escala global: todos os países que publicavam o mangá interromperam a publicação e até hoje a Shueisha retira qualquer menção ao título de seu catálogo, como se nunca tivesse existido.
Kenya Suzuki, autor de Oshiete! Galko-chan
O mais recente caso desta lista aconteceu no finalzinho de 2021, poucos dias antes do Natal. O autor Kenya Suzuki, do mangá Oshiete! Galko-chan (não publicado no Brasil), foi preso pela polícia do município de Aichi, no Japão, por posse e importação de pornografia infantil.
De acordo com as notícias locais, foram encontradas com Kenya seis coleções com fotos enviadas do exterior, e o próprio autor confessou que tinha bastante interesse em adquirir o material pornográfico de crianças estrangeiras, afinal isso seria difícil de conseguir no Japão. A polícia também realizou uma busca em sua casa e encontrou dezenas de livros com conteúdo de pornografia infantil.
Oshiete! Gallko-chan é o título de maior expressão do autor e era publicado desde 2014. Na história acompanhamos o dia a dia de três amigas adolescentes, uma otaku, uma recatada e uma garota com mais atitude, e sobre como elas comentam coisas sobre suas vidas pessoais. O mangá foi adaptado em um anime em 2016.
Homura Kawamoto, autor de Kakegurui
Esse não é necessariamente um caso de crime, mas se trata de uma contravenção grave em vários países. Homura Kawamoto, criador do mangá de Kakegurui (série com anime disponível na Netflix) decidiu começar uma nova história em 2021. Isekai Tenseisha Goroshi -Cheat Slayer- seria mais uma das várias séries isekai disponíveis no mercado japonês, mas com uma diferença: era para ser uma “paródia” do gênero.
O primeiro capítulo foi publicado e o público percebeu que o grupo de vilões do novo mangá era muito parecido com vários personagens de várias séries isekai conhecidas, como Re:Zero, That Time I Got Reincarnated as a Slime e por aí vai. Como resposta imediata às críticas sobre essas semelhanças, a Kadokawa cancelou a publicação do mangá e o autor precisou se desculpar publicamente.
Em seu tweet, o autor lamentou ter criado uma obra sem levar em consideração o uso de personagens criados por outras pessoas. Alguns autores que tiveram seus personagens plagiados também se manifestaram publicamente, como Fuse (autor da história do Slime) e Rifujin (autor de Mushoku Tensei: Jobless Reincarnation). Este inclusive ficou indignado que os personagens de isekais famosos foram transformados em vilões em Cheat Slayer.