[Atenção: artigo contém spoilers de “Amado”, quarto episódio de Invasão Secreta]
As suspeitas sobre a identidade do Máquina de Combate (Don Cheadle) foram confirmadas em Invasão Secreta. De fato, como o diálogo do episódio anterior sugeriu, Rhodey não é apenas um Skrull aliado de Gravik (Kingsley Ben-Adir), mas uma peça estrategicamente posicionada dentro do governo estadunidense com acesso a armas e ao próprio presidente Ritson (Dermot Mulroney). Logo, a dispensa de Nick Fury (Samuel L. Jackson) e a recém-estabelecida competitividade entre personagens também partem da mesma motivação: extinguir a humanidade e adquirir controle absoluto da Terra.
Rhodey é, portanto, uma farsa — e, ao que tudo indica, já há algum tempo. Em entrevista do site da Marvel, o presidente do estúdio Kevin Feige afirmou que parte da razão que motivou a revelação era estimular que os fãs tentassem desvendar desde quando a troca está vigente. "Gostamos da ideia dos fãs voltarem, assistirem a outras aparições do Rhodey e perceberem que não era ele". Ou seja, dá para desconfiar do seu papel em Falcão e o Soldado Invernal, no início da Saga do Multiverso, mas também de basicamente qualquer uma das suas participações anteriores no MCU.
Este, contudo, não foi o único relacionamento de Fury que foi ressignificado em “Amado”. Afinal, a pessoa a quem Rhodey incumbiu a tarefa de executar o antigo diretor da S.H.I.E.L.D. foi Varra/Priscila (Charlayne Woodard). Mas, na guerra entre Skrulls e humanos, ela escolheu o amor — era esse seu objetivo, conforme seu poema preferido deixou claro. Ainda assim, a decisão, como o próprio Fury diz, não pôs às claras se este é um sinal de que devam se divorciar ou renovar seus votos. No momento, pelo menos, apenas enfatizou que ele é o ponto fraco da Skrull.
É curioso, portanto, que em um episódio em que Fury toma duas facadas nas costas (figurativamente falando), ele carregue mais uma vez uma carga de vilania. É fato que ele sempre foi uma pessoa que colocou seus deveres acima da sua vida pessoal. Então, vê-lo preferindo salvar o presidente estadunidense a tentar resgatar Talos (Ben Mendelsohn) das mãos de Gravik não é exatamente surpreendente — até porque foi ele quem disse a Talos que ter misericórdia seria um sinal de fraqueza. No entanto, não deixa de ser uma despedida dolorosa, sobretudo considerando que o antigo general Skrull confiou em Fury até o final.
O humano, no entanto, usou o povo do amigo para seu benefício pessoal — ele deve sua carreira aos Skrulls, afinal de contas —, não tendo problema em arriscar vidas alheias já bastante traumatizadas pela guerra, sem oferecer nada em troca. E, passados 30 anos de uma promessa vazia, quando Talos ainda demonstrava preocupação e gratidão para a humanidade, ele foi deixado para morrer, sozinho, como efeito colateral de uma guerra que Fury foi arrogante demais para antecipar.
No papel, esta seria uma área cinzenta interessante de se explorar no personagem, isto é, mostrar a maleabilidade do seu caráter conforme a ocasião, e seu pragmatismo para decidir o que é prioridade ou não. No entanto, a Marvel parece hesitar em olhar para seu herói com a mesma intensidade que faz com figuras como Gravik, Sonya (Olivia Colman) e G’iah (Emilia Clarke). Digo isso porque a série o retrata ora como um homem perspicaz, capaz de prever as jogadas dos seus adversários, ora como alguém indefeso. Na própria despedida de Talos, por exemplo, fica explícito que Fury tem voz entre os soldados. Contudo, ele é incapaz de usar sua influência para encontrar alternativas, como tentar dar um comando que fosse ajudá-lo a carregar o corpo do amigo ou, mesmo, dar cobertura para que levasse o presidente para um lugar seguro. Ele age como se não tivesse opção, uma constatação inocente e, portanto, atípica para alguém como Fury.
Mais do que uma dubiedade proposital, como é observado em toda a série, trata-se de uma inconstância esquisita, que pinta o herói quase como um hipócrita com pouca consciência de si do que alguém diante de uma escolha difícil. É conveniente para sedimentar qualquer que seja a reviravolta que Invasão Secreta prepara, mas um desserviço para um personagem que, mesmo sentindo o peso da idade, já provou mais de uma vez ter a mente ágil para dobrar quem quer que fique no seu caminho. Fury não deveria soar tanto como um mentiroso, mas “Amado” deixa um gosto amargo que flerta justamente com isso.
Invasão Secreta é exibida às quartas, no Disney+. Abaixo, confira nossa entrevista com o elenco:
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