Roger Waters é um dos maiores compositores do rock. Sempre com uma visão aguçada do mundo e uma crítica ácida e afiada sobre os absurdos da política e como isso afeta nossas vidas, ele tem um dom único de transformar tudo isso em poesia e melodias devastadoras.
Mas não é só de conflitos externos que Waters entende. Alguns de seus grandes trunfos no Pink Floyd foram justamente os conflitos internos: a solidão, a ausência, a timidez (e tantos outros temas individuais que nos corroem todos os dias) sempre foram tema da banda e geraram alguns dos maiores clássicos do rock: Dark Side Of The Moon, Wish You Where Here, The Wall são discos que exploram justamente todos os grandes questionamentos do homem e suas angústias.
Em The Wall, Roger expôs e juntou seus conflitos numa obra-prima que retratava a dor da perda de seu pai (conflito interno) na segunda guerra mundial (conflito externo) e sem medo mostrou-se frágil e humano, uma pessoa como eu e você, que sente dor e saudade, se isolando num muro de muita revolta e paranoia.
Desde então, até certo ponto pode-se dizer que Waters nunca mais largou esse tema. O trabalho seguinte do Pink Floyd, The Final Cut, era uma continuação, uma espécie de poslúdio onde ele fazia um disco-memorial em homenagem ao seu pai. O monotema dividiu a opinião dos fãs e gerou tanta discórdia interna que acabou provocando a saída dele da banda, mas até hoje ele sustenta seu lado político com muita força.
Já fez uma ópera, é ativista e já revisitou seu “muro” em pelo menos duas turnês gigantescas (e espetaculares). E o mais interessante é como a cada vez o disco se mantém atual. Agora, depois de um hiato de 25 anos desde Amused To Death, Waters volta com fôlego total em Is This The Life We Really Want ?, um álbum de sonoridade tipicamente floydiana e com as questões políticas de sempre, atual como nunca.
"The Last Refugee" é uma das faixas mais bonitas de todo o disco, traz elementos típicos de Pink Floyd no arranjo e apresenta uma das melhores letras. Ainda preciso, Waters lamenta a rapsódia que desmantela seu coração, chama a nossa atenção para o inevitável tema dos refugiados e o descaso com que são tratadas tantas mortes em conflitos por todo o planeta, num mundo governado por líderes “sem a p***a do cérebro”.
Ele está claramente irritado com tudo e faz questão de colocar a culpa em todos nós. Na faixa título ele não poupa farpas e deixa claro: cada vez que a cortina cai sobre uma vida esquecida é porque nós não fizemos nada. E se ele fosse Deus (em "Deja Vu"), teria feito um trabalho melhor.
Apesar de toda a raiva contida nas letras, o instrumental é melódico e traz notas de esperança. Is This The Life We Really Want? - a pergunta do disco - serve para provocar a todos nós. E esse é o propósito de Waters em todas as faixas: mostrar que devemos ser unidos, que podemos fazer a diferença e, mais do que isso, não podemos ficar indiferentes. Panfleto, protesto, militância, provocação, esperança. Tudo isso faz de Is This The Life We Really Want? um grande manifesto humanista. A “trilogia” final é particularmente emocionante e passeia por situações onde a indiferença é impossível.
E é isso que Waters quer. E você? Is This The Life You Really Want? (Ouça o disco na íntegra).