Não tem sido uma jornada tranquila para Drake. Um dos artistas mais populares do mundo teve sua imagem abalada (de novo) há pouco tempo, quando Pusha-T o acusou de esconder um filho com Sophie Brussaux, uma atriz pornô. Isso foi combustível suficiente para haters mundo afora incendiarem as redes sociais com memes e críticas pesadas, trollando o rapper de todas as maneiras possíveis. Agora, no lançamento de Scorpion - seu quinto álbum - resta saber se a força do disco será suficiente para fazer o mundo esquecer por um momento os problemas da vida pessoal dele e focar na música (que é o que realmente importa).
Quase que simultaneamente, Drake soltou o primeiro single "I'm Upset", oportuno como nunca, onde ele deu um recado deixando claro que não vai ser tão fácil assim tirá-lo de seu trono. Com um mês de lançamento, a música já tinha mais de 60 milhões de plays no Spotify e, em se tratando de Drake, isso é só o começo. "Nice For What", o single lançado pouco tempo antes, já conta com mais de 340 milhões.
Mas o que isso tudo significa? Scorpion é disco que vai "salvar" a carreira de Drake? É o que vai afundar de vez? Provavelmente nem um, nem outro. Ele não precisa de um disco salvador e mesmo que Scorpion não o seja, seus singles provam que de fazer hits ele entende. Ou seja, tudo vai ficar bem quanto a isso. Até porque Drake já teve uma das maiores presenças no topo da história do hip hop, já trabalhou com praticamente todas as estrelas do jogo e vem batendo recorde atrás de recorde nas paradas de seu gênero. E ainda assim o cara coleciona detratores.
Scorpion é uma resposta ácida a todos eles, onde se ouve um Drake fuzilando letras obscuras e cheias de raiva. Aliás, uma resposta longa: Scorpion é um álbum duplo - coisa não muito comum nos dias de hoje - com nada mais nada menos que 25 faixas, inclusos os já lançados singles "I'm Upset", "God's Plan" e "Nice for What". Quem segue o rapper no Instagram pôde ver o quanto ele se dedicou dentro do estúdio. Se ele está exausto depois de tanta produção, do lado de cá tem gente ansiosa pra ouvir o produto final.
Uma das marcas mais interessantes do disco é o equilíbrio entre o hip hop e o lado R&B do canadense (é um disco duplo com um álbum dedicado a cada estilo). Aqui ele aparece soltando bastante a voz e se arriscando com sucesso nas melodias. Mas não se engane, o foco do disco é mesmo a acidez, e quem viu o trailer lançado há poucos dias para divulgar o álbum percebeu isso: uma vibe rancorosa, melancólica e "cara fechada".
A já mencionada "I'm Upset" é cheia de alfinetadas sobre sua ex, sobre as recompensas ofensivas que ele precisa até recontar, sobre o tamanho do desrespeito de tanta chupinhação em cima de seus versos. Em "Emotionless" ele ataca novamente a vida moderna e as redes sociais, como se também não as usasse para se promover, e aproveita para resvalar no assunto de Pusha T, tentando botar panos quentes e seguir adiante: Look at the way we live, I wasn't hiding my kid from the world, I was hiding the world from my kid” ("eu não escondia meu filho do mundo, escondia o mundo do meu filho"). O assunto volta novamente em "March 14", onde ele abre mesmo o jogo e fala tudo sobre o caso, fechando o disco com o recado que muita gente esperava que ele desse. E ele ainda se lamenta: "A gente só se encontrou duas vezes e, diferente de Billy Jean, o filho é meu".
A poderosa "Nonstop" tem tudo para ser um grande hit. Batida super marcada e aquele groove indefectível, mas mesmo o que parece amigável esconde também uma resposta aos críticos que reclamam de suas músicas feitas para as baladas. "Nonstop" é isso, mas com uma mensagem maldosa no refrão quase ininteligível. Veja se você pega o recado. Os quase 90 minutos de Scorpion são assim, desafiadores e elétricos, feitos para mostrar que ninguém veio aqui a passeio. Drake está pronto para ser metralhado de novo, e mais ainda para resistir de novo.
"8 out of 10" e "Blue Tint" são dois socos na orelha, perfeitas para testar até onde seu fone de ouvido aguenta com tanto bumbo eletrônico. "Sandra’s Rose" e a ótima "Final Fantasy" deixam você descansar o ouvido um pouco com seu clima soul e mais melódico. Mas o que importa ainda mais do que as músicas é a atitude e a mensagem geral do disco. Drake é o dono da bola, não mexam com ele porque senão a coisa fica feia. É um trabalho agressivo e transparente, é o Drake que está louco para se provar novamente. E que consegue.
Scorpion é grandioso em sua ambição e Drake faz questão de mostrar que pensou realmente grande em todos os aspectos do projeto. Tanto que outro ponto alto do disco é o time de participações especiais que ele convocou: entre outros tem Jay-Z, Ty Dolla $ign, Static Major e até - pasme - Michael Jackson! Sim, o rei do pop faz uma aparição póstuma na faixa "Don’t Matter To Me" (onde se ouve mais uma alfinetada quando ele diz “that’s not the way to get over me”) e prova que ainda é referência e faz parte do que acontece de mais importante no mundo da música, mesmo depois de 9 anos morto.
E é assim que Drake, um dos maiores artistas da atualidade, ensina como se faz para se manter assunto nos tempos de redes sociais, trollagem e fake news. O cara tem um quê de Midas: tudo que ele toca vira discussão, vira meme, vira hit, vira amor e ódio, vira recorde na Billboard. Scorpion - com todas as suas agruras, produção soberba e um Drake que sabe transformar raiva em confiança e música impecável - não será diferente. Quem tiver a paciência de ouvir todos os recados que ele tem pra passar em 1 hora e meia de música nova vai ser recompensado. É o tipo de trabalho tão denso e tão cheio de meandros e mensagens subliminares que precisa ser ouvido, lido, entendido e estudado. E ouvido de novo e de novo. Scorpion é um triunfo.