Entrou em vigor, na última terça-feira, a famosa lei que rege a numeração de CDs e DVDs produzidos no Brasil. Seguindo decreto assinado pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso, em 18 de dezembro do ano passado, a nova lei permite um controle mais rígido das vendas desses produtos.
O decreto é resultado de uma briga velha: há décadas, músicos lutam pelo direito de uma maior transparência na sua relação com as gravadoras. Em 2001, um projeto de lei foi apresentado ao Congresso, com apoio de uma bancada de artistas liderada pelo músico Lobão.
O projeto exigia que cada CD, livro e DVD carregasse uma numeração individual, para garantir o controle dos pagamentos autorais de acordo com as reais vendas dos produtos. Segundo manifesto lançado por Lobão na época, as gravadoras sempre esconderam números, vendendo muito mais produtos do que a quantidade anunciada.
A briga causou uma cisão no meio musical. De um lado, Lobão, Beth Carvalho e outros, defendiam a lei, garantindo que o custo seria praticamente nulo às gravadoras e os benefícios, imensos. Por outro lado um grupo mais conservador, notoriamente Caetano Veloso, Rita Lee e Gilberto Gil (atual Ministro da Cultura, não custa lembrar), se colocaram contra o projeto original, que acabou sendo vetado pelo presidente.
Dessa discussão surgiu um "grupo de trabalho", formado por representantes da indústria fonográfica, editoras e músicos, que tinha a missão de estudar uma solução economicamente viável e que agradasse a todos. Os meses de trabalho desse grupo resultaram no novo decreto, que está em vigor desde 22 de abril de 2003.
O que muda
A partir de agora, todos os CDs devem conter uma numeração, dividida por lotes máximos de 50 mil exemplares, impressa tanto no CD quanto no encarte. A marcação padrão será formada por duas letras, a partir de AA, representando o código seqüencial do lote, e um número, representando a quantidade de exemplares produzidos naquele lote.
Os registros dos lotes, da produção de CDs e de CDs devolvidos deve ser guardados por um prazo mínimo de cinco anos. A lei também determina que todos os músicos e produtores envolvidos na gravação devem ter livre acesso a esses registros. A destruição dos CDs "encalhados" também deverá ser comunicada aos artistas, com uma antecedência mínima de dez dias.
Essas novas regras visam permitir um controle mais palpável da venda dos discos, pelos produtores. Além disso, os músicos também poderão vistoriar as prensas e o estoque das gravadoras e distribuidoras.
O decreto deixa bem claro também que todas essas mudanças devem ser aplicadas sem qualquer ônus ao consumidor. Na época da assinatura do decreto, Lobão dizia que os músicos tinham feito um acordo com a Associação Brasileira dos Produtores de Discos, em que os membros desta se comprometiam a bancar o custo, cerca de 3 centavos por exemplar. Infelizmente no Brasil, onde os CDs já estão beirando os quarenta reais, esse detalhe beira a ironia.
Outra mudança é a obrigatoriedade de se seguir o International Standard Recording Code, através de um código digital inserido em cada faixa, listando o nome do fonograma e todos os autores e intérpretes presentes na gravação. Esse padrão de identificação, que vem sendo adotado no mundo todo, permite um rastreamento mais preciso de onde e quando cada música foi tocada.
Na teoria, como nenhuma gravadora ou associação protestou contra a lei até hoje, qualquer CD que chegar às lojas sem a numeração a partir desta semana, deveria ser considerado produto pirata e apreendido pela polícia.
Na prática, bem, é esperar pra ver.