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Em “Woman’s World”, Katy Perry nos lembra de um pop raso que não faz falta

Entre sátira e hino feminista sincero, novo single da cantora só é uma nulidade

Omelete
4 min de leitura
12.07.2024, às 12H06.
Atualizada em 18.09.2024, ÀS 16H08

Longe de mim subestimar Katy Perry, ou a marca indelével que ela deixou na música pop desde sua explosão, no finzinho da década de 2000, com a inesquecível “I Kissed a Girl”. Dentro de um cenário de inovações espetaculares, ela construiu uma imagem popularesca e descontraída sem nunca deixar de lado o fato de que é, no fundo, uma cantora-compositora com raízes no folk-rock. De “Firework” a “Dark Horse”, de “Last Friday Night” a “Hot N Cold”, ela criou algumas das confecções pop mais emblemáticas das últimas décadas - e eu também adoro hits menores dela, como “Waking Up in Vegas” e “Walking on Air”!

Mas confesso que é difícil ignorar o gostinho amargo que “Woman’s World”, novo single da cantora, deixa na boca. No aquecimento para o seu primeiro álbum em quatro anos (143, o disco em questão, sai em 20 de setembro), Perry fez o que toda popstar se sente na obrigação de fazer diante do cenário que se apresenta diante dela: se adaptou. Daí a duração de menos de 3 minutos - 2:43, sem o interlúdio que interrompe a canção no meio do clipe -, e daí a cena do vídeo em que ela se posta ao lado de uma moça que está gravando uma dança para o TikTok, executando passos simples desenhados para viralizar no aplicativo de vídeos rápidos.

Curiosamente, não são essas modernizações que incomodam. Como boa compositora que é, Perry estrutura “Woman’s World” para não sofrer da sensação de coito interrompido que assombra tantas canções pop que se dobram à exigência de brevidade na era do streaming musical (quanto mais curtas as músicas, mais reproduções repetidas, e melhor performance nas paradas). “Woman’s World” começa com um gancho melódico forte, repete o seu refrão em uma frequência satisfatória, e até encontra tempo para uma bridge bem à moda antiga. E, quando se trata da concessão ao TikTok, Perry encara a cena do clipe com a patetice cara-de-pau que sempre foi uma de suas melhores armas.

Essa falta de vergonha na cara não é o bastante para convencer, no entanto, durante o restante do vídeo - e o motivo para isso é sintomático, de certa forma, do calcanhar de Aquiles de Perry como entidade pop: sua vontade irrestrita de agradar todo mundo. Por causa dessa vontade, “Woman’s World” existe em um purgatório entre sátira e hino feminista honesto, nunca afiada o bastante para posicionar suas estranhas concessões ao olhar masculino como ironias efetivas, e nunca densa o bastante para convencer como manifesto sincero de uma artista que encontrou novas ideias de feminilidade nos últimos quatro anos (que englobaram uma mudança de marcha na carreira, uma gravidez, um noivado, e sem dúvida muito mais na vida privada da popstar).

É curioso porque, de certa forma, o single tem tudo a ver com o que Perry sempre fez. “Acho que, quando as pessoas pensam em mim, elas pensam em ‘Roar’, em ‘Firework’, às vezes em ‘I Kissed a Girl’, mas na maior parte do tempo nessas canções empoderadoras. Canções com uma mensagem, que podem virar slogans em camisetas, comentou ela em entrevista à Apple [via Elle]. “Woman’s World” certamente está cheia de linhas memeáveis, mas para que ela convencesse como algo além do que um slogan de camiseta faltou uma de duas coisas: ou alguma especificidade que nos conecte a Perry como artista, como fazem popstars contemporâneas à la Billie Eilish e Olivia Rodrigo; ou um faro transgressor esteticista mais penetrante, nos moldes Charli XCX e Sabrina Carpenter.

Faltou, enfim, algo que fizesse de “Woman’s World” um acontecimento pop significativo. Com uma produção competente e propulsiva, mas terminalmente avessa a qualquer inovação, o single moderniza a música e a imagem de Perry na superfície, mas por baixo disso banca em uma nostalgia que não funciona porque coloca sua mira em uma era que simplesmente não faz falta. Para muito além do envolvimento de Dr. Luke, acusado de estupro pela cantora Kesha (mas a falta de personalidade do single, vale dizer, segue bem o padrão dele como produtor), o “mundo das mulheres” de Perry não seduz justamente por querer tanto seduzir todo mundo. Gregos e troianos, diria a sabedoria popular.

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