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Radiohead: <i>OK computer</i>

Radiohead: <i>OK computer</i>

10.06.2003, às 00H00.
Atualizada em 21.09.2014, ÀS 13H14
Radiohead - OK Computer


5 ovos

(nota máxima)

É tão curioso quanto arriscado eleger um álbum de uma década tão recente como um clássico, mas Ok Computer merece o posto. É modelar, é referencial. Parece ter sido concebido num daqueles raríssimos momentos de inspiração tão elevada que uma nota a mais, um segundo a menos, uma palavra mal colocada poriam tudo a perder. Um daqueles momentos em que os relógios pararam (inclusive o Big Ben!) e os olhares de todo mundo se voltaram à Grã-Bretanha para assistir ao Radiohead cravar definitivamente seu nome na História da Música.

Não é por acaso que OK Computer foi chamado o Dark Side of the Moon dos anos 90. Assim como o clássico do Pink Floyd, Ok Computer é conceitual, exige um profundo exercício mental para ser compreendido e se tornou referência imediata na música que seria feita subseqüentemente. Que o digam Coldplay, Muse, Elbow, Travis, etc.

Absolutamente todos os infindáveis ruídos presentes no álbum têm razão de ser. Tudo o que está ali é partícula indivisível de um organismo que compõe uma obra-prima. Mesmo com esse conceito na cabeça, assim como as grandes obras de arte, Ok Computer permanece indecifrável: a magia que permeia o álbum está sempre lá, inatingível, mesmo que você esteja escutando o disco pela enésima vez.

A temática do álbum é a do ser humano sendo dragado pela tecnologia e a dinâmica que governa o mundo moderno. Munindo-se de milhares de aparatos que seriam supostamente necessários para o viver corretamente, o homem se enclausura de tal forma que acaba por não reconhecer a si mesmo e aos que o rodeiam. Na perspectiva de Ok Computer a sociedade está doente, sofrendo do mal da não convivência e da rendição às máquinas em detrimento dos sentimentos. Uma sociedade que não comunga entre si, já não poderia nem mesmo ser chamada de sociedade, não é mesmo?

Algumas análises sugerem que o álbum se trata de uma história com início-meio-fim. Não acredito que as músicas estejam seqüencialmente interconectadas, mas sim que trabalham sobre um tema em comum, com visões diferentes a cada nova faixa.

Thom Yorke personifica andróides, alienígenas e empresta sua voz aos computadores. Assim, seus personagens têm um olhar imparcial que reflete conceitos acerca da humanidade que, nós, fazendo parte dela, talvez não sejamos mais capazes de perceber. No máximo, assim como Yorke em Subterranean Homesick Alien, ao se dar conta da essência da qual estamos lentamente nos distanciando, passamos então a nos sentir os anormais, os estranhos, os não humanos.

O álbum é composto de experimentações sonoras de cabo a rabo, afinal o assunto são as máquinas. Bastou para que fosse rotulado de progressivo. Contudo, o progressivo estaria restrito às experimentações, porque, de forma alguma, encontramos em Ok Computer solos intermináveis e letras rareando. Ao contrário, a textura serve para contribuir para a sensação de espacialidade, mas de maneira geral, trata-se de um trabalho minimalista, no qual, em alguns momentos, o instrumento nada mais é do que a própria voz de Thom Yorke. Além disso, há rompantes de puro rock n´roll como em Paranoid Android, um dos vários exemplos do deslumbrante casamento entre rock n´roll e eletrônico proporcionados pelo álbum.

A introdução é feita pela enigmática Airbag. Yorke preconiza ter sido salvo por um airbag ao sofrer um acidente. Agora, a sua missão passa a ser salvar o universo.

Paranoid Android é uma verdadeira sinfonia provocada pela mescla de instrumentos acústicos e eletrônicos. Thom Yorke alterna os vocais entre momentos de apenas murmúrios e violenta irritação. Aos três minutos, a música dá uma belíssima reviravolta, deixando todo o ambiente extremamente ruidoso para, em seguida, encontrar-se novamente com a voz calma que traz tranqüilidade e suavidade... temporárias. De novo estamos mergulhados na profusão de ruídos e caos. Ao fundo, uma voz robótica repete I may be paranoid, but not an android, oferecendo uma das chaves do enigma que envolve todo o álbum. A música termina abruptamente e finalmente encontra alívio em Subterranean Homesick Alien.

A ambientação onírica em Subterranean Homesick Alien é causada pela combinação da letra, em que Yorke pede para ser levado por naves espaciais por não se sentir mais parte deste mundo e efeitos sonoros que iniciam-se mínimos para atingir um ápice quase já no final da música.

Exit Music (for a film) traz a voz de Thom Yorke introjetada pela própria incapacidade de até mesmo respirar sozinho, segundo ele canta. O tom claustrofóbico e arrepiante dado principalmente pela linha de baixo de Colin Greenwood, num dos momentos mais floydianos do álbum, incomoda, fazendo desta música possivelmente o momento mais dark de Ok Computer.

Let Down é doce, um óasis disfarçado. A sonoridade é bastante pop, mas esconde na letra uma tremenda decepção com a própria vida. O modo Radiohead de discorrer sobre a falta de surpresas que nos guarda.

Karma Police é uma melodia melancólica que questiona o ser diferente. O anormal deve ser detido, já que deixa as coisas fora da ordem. A base do piano dá a cadência necessária para o desespero final de Thom Yorke ao admitir que apesar de todos os seus esforços, não consegue encontrar o encaixe para passar no teste de normalidade.

Fitter Happier é emblemática. Um computador dá os comandos para ser mais feliz: não beber muito, exercícios três dias por semana, conviver mais harmoniosamente com seus colegas de trabalho, comer bem, não consumir comida de microondas e gorduras saturadas, ser um motorista mais tolerante, manter contato com velhos amigos, ou seja, níveis impossíveis de serem atingidos e conseqüente auto-estima indo por água abaixo. Te parece familiar?

Electioneering traz riffs de guitarra para embalar um Thom Yorke agora vestindo a persona de um político. A mais destoante do álbum, nem por isso menos importante. Ela talvez seja um dos grandes motivos de eu não acreditar que o álbum tenha uma unicidade seqüencial.

Climbing up the walls é serena, calma e profundamente dark. O vocal é distorcido, praticamente um lamento. Thom Yorke preparando-se para dar o bote, a música torna-se então melodiosa, novamente a sensação onírica escondendo uma letra, para dizer o mínimo, intrigante. Seria uma metáfora do que há de mais secreto em nós mesmos?

No surprises é minimalista ao máximo. Contradição? Possivelmente, a música mais triste do álbum, o principal instrumento é a voz de Thom Yorke e um clima quase infantil na junção dos demais instrumentos. A história de como uma vida dentro dos padrões pode acabar mal. Acomodar-se afinal de contas pra quê?

Lucky é a mais lenta do álbum. Entretanto, assim como as outras, tem seus ápices e fica mais fortalecida a cada ouvida. A saga do homem que renasceu com a missão de salvar o Universo está chegando ao fim.

The tourist finaliza o álbum. Aqui, Ok Computer já não conta mais com efeitos eletrônicos e economiza nas experimentações. Os instrumentos e as vozes são claras. A calma pedida por Yorke finalmente envolve o ambiente. As coisas estão de volta aos seus devidos lugares... ou não.

Em Ok Computer, o ouvinte é convidado a fazer uma viagem tendo o Radiohead como condutor através de paisagens por vezes tranqüilas, por vezes esquizofrênicas, sufocantes e dolorosas. As nuances, a tristeza e a euforia, a era do transtorno bipolar afetivo, o claro-escuro, se encontram. A harmonia permeando todas essas relações.

Thom Yorke é o guia, utilizando-se, com expressividade incomparável e teatralidade até, de suas várias facetas. Na trajetória, os pré-conceitos vão se esvaindo e sem que se dê conta, você é tragado para o mundo verdadeiro, onde a essência do ser humano é o que importa.

O Radiohead abusou da liberdade para criar uma obra-prima. Intencionalmente ou não, o álbum foi aclamado pela crítica e eleito o melhor do ano (e até mesmo o melhor do século, pelos leitores da respeitada revista inglesa Q). Com Ok Computer, o Radiohead emancipou-se definitivamente do britpop para se tornar uma das bandas mais reverenciadas do mundo.

Ok Computer é isso. Indispensável. Tal qual a verdade.

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