Na segunda temporada de Bom Dia, Verônica, o missionário Matias Cordeiro (Reynaldo Gianecchini) é uma figura que vai soar familiar para qualquer brasileiro que tenha acompanhado os desdobramentos do caso João de Deus: um líder religioso que promete curas milagrosas aos seus fiéis, e que seleciona mulheres entre seu rebanho para “atendimentos particulares”, onde elas sofrem abuso sexual.
“Infelizmente, o Brasil é um país com muitos casos de abuso por parte de líderes religiosos, e figuras de poder em geral”, admite Raphael Montes, criador da série ao lado de Ilana Casoy, em entrevista ao Omelete. “Se você abrir para médicos, anestesistas, e várias outras searas, o homem usa da sua posição de poder, de ser uma figura de autoridade, para cometer crimes sexuais. Então é um assunto muito do dia”.
Montes ainda destaca que o Brasil é “um país de fé”, e que ele mesmo segue a religião católica: “De maneira alguma a gente está falando contra religiões na série, somos muito cuidadosos e respeitosos com isso. Não queremos falar mal de uma religião, mas sim da figura humana que faz uso do poder da religião, da fé das pessoas, para cometer crimes”.
O que não mudou da primeira para a segunda temporadas de Bom Dia, Verônica foi a vontade de usar a dramaturgia para conscientizar. “Eu nunca quero abrir mão de contar uma boa história, com viradas de trama, ação, explosões”, aponta Montes. “Mas só contar uma história é muito pouco quando você pode provocar reflexões, mostrar como as coisas acontecem”.
Uma história de despertar
Enquanto o primeiro ano buscava desconstruir a noção de que mulheres vítimas de violência doméstica podem “simplesmente ir embora de casa” (“Não é uma prisão física, é psicológica, o que a torna muito mais difícil de se escapar”, define o escritor), esta nova leva de episódios dá um passo além e mostra a dificuldade de denunciar abusos.
“A gente pegou detalhes de vários casos diferentes para mostrar como é difícil para a mulher fazer a denúncia, mesmo depois de ela sair da situação de violência, porque ela acredita que não vai ser ouvida, que vão falar mal dela, que vão colocar a culpa nela. E é muito comum isso acontecer mesmo!”, diz Montes.
Em suma, o título de Bom Dia, Verônica não foi escolhido de forma leviana: “Já está dito ali: é uma série sobre o despertar da Verônica [Tainá Müller] para a ineficiência do sistema, para como as mulheres são silenciadas, para casos que passam invisíveis. [...] Mas cada temporada também narra um despertar diferente: primeiro da Janete [Camila Morgado] entendendo como sair do ciclo da violência doméstica, e agora da Ângela [Klara Castanho] entendendo que o pai-herói dela não é tão herói assim”.
As duas temporadas de Bom Dia, Verônica estão disponíveis para streaming na Netflix.
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