Aggretsuko tem em sua premissa tanto seu chamariz, quanto seu maior desafio. A história de uma fofa personagem que desconta suas frustrações do dia a dia cantando death metal em karaokês é, sem dúvidas, uma enorme isca para o espectador mais curioso. Porém, é preciso muito esforço e criatividade para criar uma história que não se escore apenas em seu enredo excêntrico. Consciente do desafio, a equipe responsável pela série da Netflix aumenta suas apostas temporada após temporada, chegando ao ápice em seu terceiro ano, que expande os horizontes além da vida no escritório.
Após gastar todo o seu dinheiro com um namorado virtual, Retsuko fica desesperada para pagar suas contas. A situação que já era crítica fica pior quando ela bate no carro de Hyodo, o produtor das OTMGirls, um grupo idol independente. Para sanar sua dívida com ele, a panda vermelha aceita cuidar das finanças do talentoso trio, tarefa que executou com perfeição até tudo mudar com a revelação de seu talento secreto nos karaokês.
É curioso perceber como a equipe responsável por Aggretsuko soube reconhecer os erros da produção e, principalmente, corrigi-los durante seu curso. Mesmo com um saldo positivo, a primeira temporada engasgou por conta de uma trama que vira e mexe caía em repetições. Para o ano seguinte, a saída foi definir arcos mais longos que serviram para não deixar a história caminhar em círculos, o que funcionou até certo ponto, já que os enredos não foram integrados de forma natural. Já a terceira temporada aperfeiçoou essa fórmula ao construir um único arco que soube se adaptar para o formato “maratonável” característico de produções originais da Netflix.
A produção tem um ritmo quase irretocável, que é competente desde sua apresentação, passando pelos desafios encontrados por Retsuko e seus amigos para enfim chegar em um clímax diferente de tudo o que a produção havia ousado antes. Para isso, o anime teve a coragem de deixar de lado o foco na vida de sua protagonista no escritório - algo que já havia sido sugerido na segunda temporada - para colocá-la em um caminho verdadeiramente único.
A mudança de ares, inclusive, chega a ser um crescendo que só prova como a produção realmente está interessada em fazer paralelos com o mundo real. Na crítica da primeira temporada citei a relação de Aggretsuko com a popularização do kawaii metal, estilo que uniu o pop japonês ao heavy metal e que colocou bandas como Babymetal para dividir palco com grandes nomes como Ozzy Osbourne. Assistir essa relação se materializar no enredo da série se torna especialmente satisfatório por mostrar como agora a produção se livrou das amarras da “vida normal” e perdeu o medo de abordar enredos mais fantasiosos.
Considerando que Aggretsuko ganhou muitos elogios pela forma como retrata os perrengues da vida adulta, que em grande parte se concentram na vida profissional, foi preciso coragem para virar a chave assim, mas o roteiro cobre a aposta e entrega uma história realmente cativante. Com temas bem definidos, a obra volta a abordar a tal “vida adulta” ao propor debates sobre assuntos que dialogam diretamente com a geração atual.
Se aproveitando da popularidade da cultura idol, cujo sucesso se tornou mundial graças à popularização de grupos de k-pop como BTS e Blackpink, a série debate sobre a cultura de fã. De forma até ácida, a produção reflete sobre a tênue linha entre sonhos e mero consumismo que permeiam essa indústria. Chega a ser curioso perceber que esse tema está sendo levantado dessa forma em uma produção com personagens da Sanrio (empresa focada em lançar produtos de personagens fofos como a Hello Kitty).
Com domínio em sua narrativa e coragem para ousar, Aggretsuko entregou sua melhor temporada até aqui. Ainda sem um quarto ano confirmado, esse poderia ser o final triunfal para uma das mais curiosas produções dos últimos anos. Por outro lado, se a Netflix renovar o anime, a próxima leva de episódios terá a ingrata missão de manter o alto nível do título.
Criado por: Rareko
Duração: 3 temporadas