É justo dizer que Marie Curie é uma das pessoas que mudou o mundo através da ciência. Suas descobertas permitiram avanços tecnológicos importantíssimos para a humanidade, salvaram incontáveis vidas e ainda lhe renderam dois prêmios Nobel. Sua rica história é o tema de Radioactive, filme que chega à Netflix com base na HQ Radioactive: Marie & Pierre Curie: A Tale of Love and Fallout, de Lauren Redniss.
O filme acompanha Marie Slodowska (Rosamund Pike), pesquisadora científica desacreditada na França cuja vida muda com uma inesperada parceria com Pierre Curie (Sam Riley), com quem ela se casa e depois mudaria os rumos da ciência, com a descoberta da radioatividade.Para investigar os altos e baixos da vida e obra de Marie Curie, Radioactive tem a seu favor uma espetacular recriação de Paris no final do século XIX e início do XX. A direção de Marjane Satrapi (Persepolis) acerta ao explorar esse cenário tão belo, que faz com que a cidade pulse e nos convide a passear por seus becos e avenidas.
É curioso que esse retorno romântico ao passado tenha quebras em recursos modernos, que vão desde a iluminação neon no figurino de uma dançarina, até o uso de objetos 3D para explicações científicas e a presença de sintetizadores na trilha sonora orquestral. Mais do que criar rupturas, esses artifícios criam uma identidade única para o projeto, que usa as tais quebras para mostrar como a obra dos Curies impactaram a sociedade - para o bem e para o mal.
Visualmente impecável e com elenco formidável, Radioactive sofre com o desafio de condensar muitos eventos em menos de duas horas de duração. Com uma pressa que se instaura ainda no primeiro ato, o filme estabelece um andamento corrido demais. A falta de respiros é perceptível pela constante sensação de que os grandes momentos - sejam de sucesso ou fracasso - estão sempre se atropelando para que o seguinte possa ter início.
Esse ritmo, ao mesmo tempo apressado e enfadonho, prejudica a imersão na trama. Não há tempo para pensar sobre mistérios que surgem ou como resolver problemas que deveriam ser urgentes, porque o roteiro corre para que tudo seja sanado em questão de minutos. Chega a ser frustrante não conseguir saborear as vitórias de Marie Curie, especialmente sabendo que são eventos grandiosos que ressoam até os dias de hoje.
Por outro lado, a frustração só não é maior porque o elenco encontra espaço para brilhar. Rosamund Pike (Garota Exemplar) é cuidadosa ao retratar Curie como uma mulher firme e orgulhosa, sem cair em caricaturas. Se conseguimos sentir o cansaço, o orgulho ou a frustração da personagem é completamente pela entrega da atriz.
Em menor grau é possível dizer o mesmo de outros membros do elenco. O Pierre de Sam Riley (Controle: A História de Ian Curtis) é carismático e complementa bem a personalidade explosiva e firme de Marie. Junto a Pike, ele dá vida a um romance que parece palpável através de gestos e olhares mínimos, mas que fazem toda a diferença. Outro destaque, mesmo que curto, é Anya Taylor-Joy (A Bruxa). Intérprete da versão adulta de Irene, cientista e filha mais velha do casal Curie, ela rouba os holofotes e confere um ar gracioso que combina com a importância histórica de sua personagem.
É uma pena que todo esse empenho seja diluído ao longo de um roteiro que não permite sutilezas. Cada cena traz momentos que praticamente gritam sua função narrativa ao espectador, subestimando a capacidade de quem assiste.O texto de Jack Thorne (Extraordinário; Enola Holmes) parece desesperado para que suas mensagens sejam absorvidas na marra em diálogos artificiais que só diluem o impacto de eventos que falam por si. O resultado é um filme que sempre fica a um passo de pegar carona na jornada de Marie Curie e esboçar um potencial próprio, sempre frustrado.
Ano: 2019
País: Reino Unido
Classificação: 14 anos
Duração: 109 min
Direção: Marjane Satrapi
Roteiro: Jack Thorne
Elenco: Anya Taylor-Joy, Rosamund Pike, Sam Riley