O anúncio de que um novo filme de O Senhor dos Anéis será lançado em 2026 e um outro está em desenvolvimento colocou uma pulga atrás da orelha de muitos fãs da franquia. Afinal, a obra de J.R.R. Tolkien se imortalizou na literatura e ganhou o mundo com o sucesso da trilogia adaptada pelo diretor Peter Jackson no início dos anos 2000, com bilhões arrecadados na bilheteria e 17 prêmios no Oscar divididos entre os três filmes. No entanto, há aqui uma questão muito pertinente: é realmente necessário desidratar ainda mais uma propriedade tão amada por muitos?
Claro, pensando pura e unicamente na questão financeira, sequer há discussão. Com parte dos direitos da obra assegurados, a Warner Bros. Discovery, através do CEO David Zaslav, já afirmou em mais de uma oportunidade ter o interesse de expandir a franquia para além da trilogia inicial e a seguinte, também comandada por Jackson e que adaptou O Hobbit - essa, no entanto, não conseguiu conquistar o carinho dos fãs da mesma forma que a primeira.
O problema é que a busca desenfreada por (mais) cifras bilionárias vem sangrando outras franquias que há pouquíssimo tempo ainda eram quase irretocáveis para os fãs. Estou falando, é claro, de Star Wars e os filmes da Marvel, que apesar de ainda serem extremamente populares e relevantes na cultura pop, decepcionaram parte do público com lançamentos recentes e não conseguiram repetir o sucesso de outrora, seja na parte financeira ou até mesmo em engajamento.
Arriscar diluir ainda mais a marca mais sagrada da fantasia é uma aposta alta e que pode muito bem fazer o feitiço se virar contra o feiticeiro. O novo filme, intitulado inicialmente como The Hunt for Gollum (A Caçada por Gollum, em tradução livre), será inspirado em histórias não contadas do mundo de Tolkien e pode explorar uma passagem registrada nos apêndices de O Senhor dos Anéis, na qual Gandalf e Aragorn começam uma caçada pela estranha criatura que esteve em posse do Anel do Poder por vários anos.
A presença de uma das figuras mais marcantes de O Senhor dos Anéis e o envolvimento de pessoas que trabalharam nos filmes anteriores - Andy Serkis está confirmado na direção e voltará a interpretar Gollum, enquanto Peter Jackson é creditado como produtor - deve ajudar a tranquilizar os fãs mais céticos. Mas ambos também estiveram envolvidos na trilogia O Hobbit e o resultado, apesar de financeiramente bem aceito, passou longe de agradar a maioria.
No caso de O Senhor dos Anéis: Os Anéis de Poder, série do Prime Video que explora as histórias da Segunda Era da Terra-Média, as primeiras impressões dos críticos aumentaram ainda mais a expectativa do público. Os episódios iniciais até conseguiram emular o espírito da trilogia de Jackson e deixaram os fãs em transe com mais uma viagem pelo mundo de Tolkien, mas a produção foi perdendo força com o tempo e não estava tão mais na boca do povo quando exibiu o seu episódio final - e aqui nem vamos dar relevância às críticas racistas feitas por um seleto grupo barulhento que tentou diminuir a obra por puro preconceito.
Estar reticente sobre um novo filme de O Senhor dos Anéis não é torcer pelo fracasso. Uma boa história, seja ela original, adaptada ou clichê, sempre será bem-vinda. Peter Jackson não precisa provar para ninguém sua qualidade enquanto criador, e Serkis, apesar dos questionáveis trabalhos na direção de Venom: Tempo de Carnificina e Mogli: Entre Dois Mundos, tem amor o bastante pela obra de Tolkien para tocar o projeto com responsabilidade. Mas ter amor não dá garantia nenhuma de qualidade, e uma franquia como esta merece ser trabalhada com tempo, paciência e esmero, onde o lucro e a visão deturpada de alguns engravatados não podem se sobressair.
Há formas diferentes de explorar uma propriedade como O Senhor dos Anéis que merecem, sim, a nossa atenção. A animação The Lord of the Rings: The War of the Rohirrim, prevista para estrear em dezembro deste ano, pode trazer algo novo para a franquia e abusar das inúmeras possibilidades que um filme animado pode usufruir. Fora o fato de não precisar cair na armadilha de apelar para a nostalgia, trazendo rostos conhecidos dos fãs para um fan service gratuito e que pouco acrescenta à narrativa.
São muitas possibilidades e todas passam pelo caminho da incerteza. O único fato é que, em um mundo cujo objetivo final é sempre o lucro, essa é uma discussão que dificilmente terá fim. E nós estaremos aqui, questionando, amando e odiando o que sair da próxima canetada dos produtores. Sempre na primeira fileira do cinema, claro.