Na coluna irmã da LÁ FORA, o Omelete mergulha nas bancas e livrarias para comentar os principais lançamentos recentes. Nesta edição: Os 300 de Esparta, Grandes Astros, Superman: Britânico legítimo e O prolongado sonho do Sr. T e Chiara Rosenberg.
Os 300 de Esparta
Por Marcelo Forlani
Quando um amigo ou amiga fala para mim que histórias em quadrinhos são coisas de criança eu empresto (ou recomendo, se já sei que é daqueles que não devolvem as coisas) três livros: Maus, de Art Spiegelman, Gen - Pés descalços, de Keiji Nakazawa, e Palestina, de Joe Sacco. São títulos que, como se vê, não têm nada a ver com Turma da Mônica, Disney ou super-heróis. Não há mundos fantásticos, universos paralelos, ou heróis de capas esvoaçantes. São histórias sérias, sobre guerras reais e até certo ponto recentes.
Um possível quarto livro dessa lista volta mais no tempo e tem heróis e capas, mas eles não se assemelham em nada aos defensores da Marvel ou DC Comics. Estou falando de Os 300 de Esparta, obra-prima de Frank Miller e Lynn Varley.
Para explicar minha fascinação pela obra, terei que voltar um pouco no tempo. Quando vi o Preview, catálogo que mostra uns três meses antes o que vai ser lançado nos Estados Unidos, eu já garanti a minha primeira edição (de 5) de 300, que sairia pela Dark Horse em 1998. Na épóca em que a Abril Jovem lançou no Brasil a versão nacional, batizada de Os 300 de Esparta, eu trabalhava lá e ganhei as edições nacionais. Ao saber que a Dark Horse lançaria um encadernado em formato horizontal, com capa dura da obra, não resisti e comprei, pela terceira vez a mesma história... Você está entendendo onde eu quero chegar, ou preciso dizer que tenho em mãos agora a quarta versão diferente de uma das maiores histórias de todos os tempos, contada por um dos gênios dos quadrinhos de forma magistral?
Se você perdeu as versões anteriores e não sabe que a obra está para ser adaptada para os cinemas, uma rápida aula de história: Os 300 de Esparta mostra a batalha em que os soldados do Rei Leônidas enfrentam com a cabeça erguida e escudos em punho as temíveis tropas do Rei-Deus Xerxes, da Pérsia, que invadia a Grécia. Com a reduzida tropa que dá nome ao livro, Leônidas consegue deter por dias o exército que "fazia tremer o chão ao marchar". Seu feito heróico serviu de inspiração para que os gregos se unissem e depois reconstruíssem um país livre.
Miller estava iluminado. A narrativa é empolgante e a cada virar de página, frases de efeito surgem mais rápidas e certeiras que as lanças dos espartanos. E a arte é tão bela quanto as moças gregas que viviam como oráculos. O formato diferenciado foi pensado para privilegiar os desenhos, e é mais uma prova do apurado senso artístico de Miller, que fez grandes painéis a cada página, como se a história fosse mostrada em widescreen, alargando suas fronteiras.
A edição nacional nada deve à original. O papel pode ser um pouco mais fino e a impressão ligeiramente mais escura, mas é visível o cuidado que a Devir teve com o produto. A capa dura recebeu um verniz sobre o logo que valoriza o livro. Não que precisasse. As páginas internas são seu grande tesouro.
(300) Devir. Formato: 33cm x 24 cm. 88 páginas. R$ 46,50.
Grandes Astros
Por Érico Borgo
Recomendação máxima da Cozinha para este mês: a linha All-Star da DC Comics finalmente chegou ao Brasil. Grandes Astros: Batman e Robin e Grandes Astros: Superman trazem as primeiras edições da coleção cuja idéia é bastante simples: convidar alguns dos principais criadores da editora para escrever histórias estreladas pelos maiores ícones da DC, sem se preocupar muito com a cronologia ou continuidade.
As duas primeiras duplas são Grant Morrison e Frank Quitely, no título All-Star Superman; e Frank Miller e Jim Lee em Batman & Robin.
Ambas as séries chegam simultaneamente às bancas brasileiras, mas a primeira se destaca - é recheada de ótimas sacadas e a página inicial já vale o preço de capa. A de Miller ainda precisa engrenar. Apesar de promissora, dá uma impressão que o criador está contando com glórias passadas (chamar Robin de soldado, uma referência direta a Cavaleiro das Trevas, é o ponto alto da primeira edição) para criar interesse pela aventura.
Miller, porém, falou brevemente ao Omelete sobre como é o trabalho ao lado de Jim Lee. "Quando eu trabalho com um ilustrador, ele é o ilustrador. Eu não falo como ele deve fazer seu trabalho. Nunca meti o bedelho no trabalho de Jim Lee, Dave Gibbons ou Geoff Darrow. Digo o que eles devem desenhar, mas nunca como. Seria um desperdício do talento deles. Jim é um artista sensacional e está trazendo sua própria interpretação às histórias que eu escrevo. Por outro lado, meu roteiro aproveita algumas das maiores qualidades do trabalho dos artistas com os quais trabalho. Para Jim, por exemplo, estou colocando um monte de garotas na história, porque ele as desenha muito bem. Estamos nos divertindo muito trabalhando juntos!". Sobre a história, limitou-se a dizer que "quero que os leitores apaixonem-se pelo Robin nela".
Duas edições obrigatórias, sem dúvida. Mas se você tiver que escolher uma, fique com a do Homem de Aço. É um desfile de idéias exageradas e extremamente criativas e só melhora nas próximas edições.
(All-Star Superman) Panini Comics. Formato americano. 28 páginas. R$ 3,90.
(All-Star Batman & Robin) Panini Comics. Formato americano. 28 páginas. R$ 3,90.
Superman: Britânico legítimo
Por Érico Borgo
Histórias da série Túnel do Tempo, em que personagens são retirados de suas cronologias e colocados em situações inusitadas geralmente têm ótimas premissas, mas desenvolvimentos fracos. Superman - Britânico legítimo, HQ que coloca o foguete de Kal-El caindo no interior da Inglaterra, não é o melhor momento desse tipo de publicação, mas ainda assim fica bem acima da média.
A história cômica tem roteiro de Kim "Howard" Johnson, biógrafo do grupo cômico inglês Monty Python, e colaboração de John Cleese, um dos mais conhecidos astros da trupe britânica. O resultado não poderia ser diferente: tem a cara do humor tipicamente inglês. Os traços de John Byrne, totalmente à vontade, completam a equipe criativa e casam-se perfeitamente com a história. Ele desenha o Super-Homem mais trapalhão, caricato e simpático já visto. Entre os desafios do herói estão problemas bem ingleses, como fazer com que os trens circulem no horário, acabar com a apelação na TV aberta e (hein?!) reduzir o tempo de espera de cirurgias de quadril!
É satisfatório também observar como, diferente da maioria das edições Túnel do Tempo, os autores não ficam tentando enfiar o maior número de referências à cronologia oficial do personagem possíveis. Tirando um ou outro personagem (o "Bat-Man" é o melhor!), é tudo muito despreocupado e satírico. Pra ficar melhor, só se os balões tivesse o sotaque inglês de quem está comendo batata quente.
(Superman: True Brit) Edição especial, formato americano, 100 páginas. Mythos Editora. R$ 14,90.
O prolongado sonho do Sr. T e Chiara Rosenberg
Por Érico Assis
Mais uma editora no crescente mercado de quadrinhos brasileiro! A Zarabatana Books, do faz-tudo Claudio R. Martini, apareceu nas prateleiras das livrarias no fim do ano passado com duas obras: O Prolongado Sonho do Sr. T., do espanhol Max, e Chiara Rosenberg, dos italianos Roberto Baldazzini e Celestino Pes.
Primeiro ponto a destacar: a qualidade gráfica das obras. Os dois livros têm um cuidado digno das grandes editoras, e que falta a muitos quadrinhos. Ambos são em preto-e-branco, e você não vê nada daqueles escaneamentos malfeitos. As capas têm detalhes que só valorizam o conjunto. Com tudo isso, o preço ainda é relativamente baixo: R$ 29 pelo Sr. T. e R$ 39 por Chiara Rosenberg.
Quanto ao conteúdo das primeiras escolhas da Zarabatana, os elogios não são tantos. Enquanto Sr. T. certamente vale a leitura, Chiara é um pornô-soft que serve apenas para a editora explorar o mercado da HQ erótica - que ainda dá dinheiro no Brasil.
A personagem título, Chiara, é uma crítica de cinema cujo casamento entra em crise. Seu marido é um aficcionado por perversões sexuais e está cansando a jovem jornalista, que sai em busca de novas aventuras. Como em todo "pornô com história", isso é só um pano de fundo para ligar as cenas de sexo. A narrativa é boba, os diálogos são absurdos - a cena em que um detetive particular fala "Chifrando o marido, hein, sua putinha? Mas eu te pego!" lembra Hermes & Renato - e o negócio é só abrir espaço para o belo corpo de Chiara. E ainda tem o problema das citações intelectualóides, tentando dar algum valor artístico à HQ...
Já O Prolongado Sonho do Sr. T. é uma narrativa fantástica em que o citado Cristóvão T., em coma, entra em um sonho maluco cujo significado você só descobre no fim da história. Os desenhos meio-cartum meio-expressionistas de Max dão todo valor à obra. O roteiro foi premiado pelo Salão de Quadrinhos de Barcelona em 1998, data da publicação original na Espanha.
O interessante é como Sr. T. não se perde no psicologismo nem no espiritualismo, mesmo que envolva as duas coisas. A HQ está mais para a inocência de um Tintim do que para aqueles quadrinhos mais "sérios" dos americanos independentes. Repetindo, vale a leitura.
Enfim, Sr. T. compensa Chiara Rosenberg e lança um bom caminho para a Zarabatana. Os próximos lançamentos da editora são os álbuns Mulheres, de Yoshihiro Tatsumi - mangaká dos anos 50 cujo trabalho está em ascensão devido à sua descoberta nos EUA - e uma coletânea das tiras Maakies, do americano Tony Millionaire. Ótimas escolhas. Vamos ver o que mais essa interessante nova editora vai nos oferecer.
(El Prolongado Sueño del Sr. T) Zarabatana Books. Formato: 16 x 23 cm. 80 páginas. PB R$ 29,00.
(Chiara Rosenberg) Zarabatana Books. Formato: 21 x 28 cm. 88 páginas. PB. R$ 39,00.