Capas de Visão, Batman e Senhor Milagre

Créditos da imagem: Marvel Comics/DC Comics/Divulgação

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Por que você também deveria ser fã do Tom King

Roteirista trouxe novos olhares aos maiores heróis da DC sem mexer em suas essências

Omelete
4 min de leitura
18.08.2020, às 19H17.
Atualizada em 28.07.2022, ÀS 09H59

Confesso que fiquei com o pé atrás quando Tom King assumiu o título principal do Batman em 2016, logo após o retcon (alteração retroativa de cânone) Renascimento DC. Não porque eu conhecia o trabalho do roteirista, mas porque a única vez que me deparei com o nome dele foi quando Asa Noturna, meu herói favorito da DC Comics, abandonou o manto que usou por 30 anos para se tornar um agente secreto. O arco, escrito em parceria com Tim Seeley (Liga da Justiça, Hellblazer, Mulher-Maravilha), transformou Dick Grayson em um espião, trama que para mim tinha cheiro de caça-níquel barato. Como um bom fanboy, julguei a revista por sua premissa e, entre estágios e TCC, nem me dei o trabalho de ler o gibi. Quando ele deixou Grayson para assumir Batman, eu estava decidido a não gostar das novas histórias do Homem-Morcego.

O arco de estreia de King foi Eu Sou Gotham e mostrava o Cavaleiro das Trevas lidando com Gotham e Gotham Girl, dois novos seres superpoderosos que apareciam na icônica cidade, ajudando-os a entender o significado da palavra herói. A história inchada, que envolveu a Liga da Justiça, o Esquadrão Suicida e pistas para o evento Heróis em Crise (2018), tornaram esse primeiro contato entre roteirista e personagem algo mediano, quase esquecível. Me senti vingado. E aí veio Eu Sou Suicida.

A segunda história de King para o gibi trazia o Batman explicando diferentes detalhes de seu psicológico frágil. O “sempre preparado” Cavaleiro das Trevas admitia, ao mesmo tempo em que se preparava para enfrentar o vilão Bane, que sua cruzada contra o crime nada mais era do que uma tentativa de suicídio. Com uma profundidade que apenas Grant Morrison se atreveu a dar ao Morcego em anos recentes, King desconstruiu completamente a visão quase divina que outros roteiristas deram ao personagem desde os anos 1980. Nos meses seguintes, o quadrinista continuou entregando histórias tocantes, acompanhadas das artes brilhantes de David Finch e Mikel Janin.

Depois de A Guerra das Piadas e Charadas, eu já estava completamente fisgado pela fase do autor. Corri atrás de seus outros títulos – Grayson e a minissérie Visão, da Marvel – e percebi algo que minha teimosia me impediu de ver meses antes: King faz parte do seleto grupo de quadrinistas modernos que não se contenta em entreter. Assim como Morrison, Brian Bendis, Donny Cates, Joëlle Jones e G. Willow Wilson, ele busca entender o personagem com o qual trabalha, assim como o mundo no qual ele se insere e mostra isso ao explorar elementos além da ação típica da mídia. Equilibrando suas experiências pessoais como oficial da CIA e veterano do exército com a mitologia dos títulos que escreve, King entregou algumas das melhores histórias da indústria na última década.

Essa visão não-tradicional que o autor inclui em sua obra, no entanto, não está imune a críticas. Em caso que se tornou infame, King passou diversos números de Batman arquitetando o casamento entre Bruce Wayne e Selina Kyle, apenas para a Mulher-Gato abandonar o amado no altar. A reação imediatista dos leitores, porém, não deu espaço para que os fãs vissem o verdadeiro objetivo do autor. Acertado com a DC para comandar 100 edições, ele idealizou um arco gigantesco, com cada trama menor se conectando por pequenas referências de texto ou imagem, culminando na história épica de Cidade de Bane. Infelizmente, o barulho do público, além de seu envolvimento com o filme dos Novos Deuses, levou a DC a diminuir o período de King em Batman e o autor entregou sua última história para a revista no número 85, levando o final que planejou para a minissérie Batman/Catwoman.

Embora esse encerramento prematuro possa atrair desconfiança ao legado do autor – assim como o menos que mediano Heróis em Crise -, é inegável que King tenha criado clássicos modernos na revista. Dentro de 10 ou 15 anos, é possível que A Guerra das Piadas e Charadas, Cidade de Bane e Dias Frios, no qual Bruce questiona seus métodos após acusar injustamente o Sr. Frio de assassinato, sejam colocados no mesmo panteão que A Piada Mortal, de Alan Moore, e O Cavaleiro das Trevas, de Frank Miller. Ao mesmo tempo, histórias do quadrinista para outros personagens, como Superman: Up In The Sky, The Omega Men e Senhor Milagre, também devem alcançar status semelhantes, não só por sua qualidade, mas pelo impacto que tiveram em personagens icônicos da DC.

Atualmente trabalhando nas minisséries Rorschach, Batman/Catwoman - que concluirá a visão do autor para Batman - e Strange Adventures, outro grande candidato a clássico, King criou, em menos de uma década de carreira na indústria, uma série de leituras obrigatórias para fãs da DC e de quadrinhos em geral. Olhando com carinho para cada personagem que escreve, o quadrinista transforma histórias de super-herói em algo muito mais profundo e interessante do que mais uma narrativa de bem contra o mal.

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